As bolsas globais atravessaram mais um movimento de ajuste, com destaque para a correção no setor de tecnologia e, em particular, nas empresas expostas à temática de inteligência artificial. O movimento ganhou tração após novos sinais de estresse nos investimentos em infraestrutura de data centers — com a Oracle, mais uma vez, funcionando como um termômetro desse processo.
A promessa de sustentação contínua do mercado por parte das big techs esteve perto de se confirmar, mas, mais uma vez, ficou apenas no cheiro, reforçando a percepção de que esses nomes já não conseguem, sozinhos, carregar os índices. O resultado tem sido aumento de volatilidade e uma rotação gradual de capital em direção a setores mais defensivos.
O pano de fundo permanece desafiador e multifacetado. Os investidores acompanham com atenção as decisões de política monetária do Banco da Inglaterra e do Banco Central Europeu, além da divulgação do índice de preços ao consumidor (CPI) nos Estados Unidos, cujos números podem apresentar ruídos adicionais em função da recente paralisação do governo.
Paralelamente, o mercado de commodities reage a riscos geopolíticos envolvendo Venezuela e Rússia, enquanto os ativos de risco seguem presos a uma tensão recorrente: de um lado, o receio de excessos e frustrações no ciclo de investimentos em IA; de outro, a expectativa de algum alívio monetário ao longo de 2026. Esse equilíbrio instável mantém o ambiente sensível a novas informações e naturalmente sujeito a oscilações no curto prazo.
· 00:55 — Tão fácil quanto bater um pênalti
No Brasil, após a queda de 2,4% registrada na terça-feira, o Ibovespa voltou a recuar ontem, refletindo um ambiente de maior cautela e estresse entre os investidores diante das perspectivas eleitorais para 2026.
O movimento não está relacionado a julgamentos morais ou à credibilidade das promessas de campanha, mas a uma leitura essencialmente pragmática sobre viabilidade eleitoral. O mercado até admite que Flávio Bolsonaro possa buscar uma postura centrada na economia — algo próximo do discurso de continuidade da agenda liberal —, o que seria muito importante para viabilizar as inevitáveis reformas de 2027.
O ponto central, entretanto, é que ele apresenta um nível de rejeição elevado, o que compromete suas chances em um eventual segundo turno contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em eleições presidenciais no Brasil, não é a base mais ruidosa que decide o resultado, mas sim o eleitor de centro, a maioria silenciosa e moderada. E as pesquisas indicam que esse eleitor dificilmente seria conquistado por um candidato com rejeição próxima de 60%.
A pesquisa Latam Pulse, da AtlasIntel em parceria com a Bloomberg, divulgada nesta manhã, reforça essa leitura: Flávio pode até chegar ao segundo turno, mas chegaria ali como favorito à derrota. A escolha de um nome mais competitivo, em tese, poderia ser algo simples — como bater um pênalti.
O problema é que, no atual contexto, esse pênalti está sendo cobrado contra uma muralha formada pela polarização política, tornando até a jogada mais óbvia um desafio considerável. Pelas sondagens, Tarcísio de Freitas seria um nome mais competitivo, mas sua entrada na disputa fica praticamente inviabilizada enquanto Flávio permanecer no jogo. Ainda há muita água para passar por debaixo dessa ponte até março, mas o caminho até lá tende a ser marcado por ruídos, incerteza e volatilidade nos ativos domésticos.
No campo monetário, o Relatório de Política Monetária divulgado nesta manhã trouxe sinais relevantes. O Banco Central passou a projetar inflação de 3,2% no horizonte relevante de política — o terceiro trimestre de 2027 —, ligeiramente acima da expectativa de mercado, que era de 3,1%.
Embora a diferença seja pequena, ela reduz a probabilidade de um corte de juros já em janeiro e reforça a leitura de que o início do ciclo pode ficar para março, possivelmente com um ajuste mais intenso de 50 pontos-base, em vez de um corte inicial de 25 pontos. Ainda haverá dados importantes até lá, mas a comunicação recente do BC sugere uma preferência crescente por cautela na largada do ciclo, especialmente em um ambiente em que a desaceleração da atividade ocorre de forma gradual, a inflação segue acima da meta e o mercado de trabalho permanece relativamente apertado.
Por fim, no campo fiscal, o governo conseguiu viabilizar no Senado a aprovação do projeto que prevê um corte linear de 10% nos benefícios fiscais e eleva a tributação de instrumentos como JCP, fintechs e apostas — medida considerada essencial para fechar o Orçamento de 2026. Para isso, houve, na prática, a liberação do avanço do PL da Dosimetria, em um acordo tácito com a oposição, o que gerou forte repercussão política. O projeto que reduz penas segue agora para sanção presidencial, com promessa de veto por parte do Executivo, risco de derrubada no Congresso e judicialização no STF.
Já o texto fiscal foi aprovado com ampla maioria e deve gerar entre R$ 13 bilhões e R$ 22 bilhões em arrecadação adicional, destravando a votação do Orçamento e ajudando o governo a perseguir a meta fiscal do próximo ano. O tema fiscal segue sendo a pedra fundamental para reancorar expectativas no Brasil e, consequentemente, abrir espaço para juros estruturalmente mais baixos. Ainda que o corte de benefícios seja um passo relevante, a solução estrutural para o desequilíbrio fiscal permanece condicionada ao desfecho eleitoral e a uma eventual reorganização da política econômica a partir de 2027.
· 01:47 — Devolvendo ganhos
As bolsas americanas devolveram parte dos ganhos no meio da semana, em um movimento liderado pela correção no setor de tecnologia — especialmente nas ações mais associadas à temática de inteligência artificial. Após meses concentrado nos grandes nomes de tecnologia, o fluxo de capital começa a migrar para segmentos mais tradicionais, com destaque para o setor financeiro, que acumula valorização superior a 6% no último mês. Em paralelo, o ambiente de mercado assumiu um tom mais defensivo: o Bitcoin cedeu, o ouro renovou máximas históricas e os sinais de apetite por risco ficaram mais mistos, ainda que o mercado de capitais tenha mostrado vitalidade com o forte desempenho do IPO da Medline, cujas ações avançaram 41%.
Esse ajuste também revela um ceticismo crescente em relação à narrativa de crescimento ilimitado da IA generativa. Investidores passaram a questionar não apenas os valuations, mas também os custos elevados, a eficiência energética e a aplicabilidade prática dos modelos atuais em escala corporativa. Com isso, o foco do mercado se desloca para os próximos catalisadores macroeconômicos, incluindo a divulgação do CPI de novembro, que pode sinalizar uma leve reaceleração da inflação.
· 02:34 — Warsh ou Hassett?
O presidente Donald Trump voltou a afirmar que anunciará em breve o nome do próximo presidente do Federal Reserve, deixando claro que sua preferência recai sobre um perfil mais inclinado à redução das taxas de juros. Entre os nomes mais cotados estão Kevin Hassett, atual conselheiro econômico da Casa Branca; Kevin Warsh, ex-diretor do Fed; e Christopher Waller, que hoje integra o board da instituição. Os mercados de previsões já começam a precificar essa disputa: Hassett, que liderava com folga, perdeu tração recentemente, enquanto Warsh ganhou protagonismo — um movimento que já vínhamos apontando como plausível neste espaço. O mandato de Jerome Powell se encerra em maio de 2026, e a expectativa é que o anúncio oficial ocorra no início do próximo ano.
A diferença de leitura entre os dois principais candidatos ajuda a explicar a reação dos investidores. Hassett é visto como mais diretamente alinhado ao presidente Trump e defensor de cortes mais agressivos de juros, o que alimenta preocupações sobre a preservação da independência do Federal Reserve. Warsh, por sua vez, também defende uma postura mais favorável à flexibilização monetária, mas carrega um histórico mais extenso dentro do próprio Fed e no setor privado, o que o posiciona como uma alternativa mais institucional e previsível. Por esse conjunto de fatores, sua eventual indicação tende a ser melhor recebida pelo mercado.
· 03:27 — Pressão sobre a Venezuela
Nesta semana, o presidente Donald Trump elevou de forma significativa a pressão sobre a Venezuela ao defender um bloqueio aos petroleiros sancionados pelos Estados Unidos que transportam petróleo de ou para o país, aprofundando uma estratégia de confronto que vem sendo intensificada ao longo dos últimos meses contra o governo de Nicolás Maduro.
A medida tem potencial para atingir em cheio a já fragilizada economia venezuelana, fortemente dependente do petróleo, que responde por mais de 90% das receitas de exportação. Desde o anúncio, já se observam efeitos práticos: embarcações mudaram rotas, a entrada de dólares no país diminuiu e os Estados Unidos ampliaram a repressão às chamadas “frotas paralelas”, utilizadas para driblar o regime de sanções por meio de desligamento de rastreadores, bandeiras de conveniência e outras estratégias.
Do ponto de vista do mercado global de energia, porém, o impacto tende a ser relativamente contido, uma vez que o petróleo venezuelano representa apenas uma fração limitada da oferta mundial, ainda que o episódio acrescente um prêmio geopolítico aos preços no curto prazo.
· 04:11 — Protagonismo alemão
A Alemanha deu um passo adicional ao sinalizar, de forma mais clara, sua disposição de assumir um papel de protagonismo na arquitetura de segurança da Ucrânia em um eventual cenário de pós-guerra. O chanceler Friedrich Merz afirmou que tropas alemãs poderiam integrar uma coalizão internacional encarregada de garantir uma zona desmilitarizada após um acordo de paz com a Rússia, com mandato que incluiria a possibilidade de resposta a incursões ou ataques russos.
Embora tenha ponderado que esse estágio ainda não foi alcançado, a fala representa uma inflexão relevante na postura tradicionalmente mais cautelosa de Berlim e reforça o crescente envolvimento europeu na discussão sobre garantias de segurança a Kiev — tema que deve ganhar tração na próxima cúpula da União Europeia, que contará com a participação do presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskiy.
· 05:03 — Os dividendos de final de ano
Ações pagadoras de dividendos costumam apresentar desempenho consistente ao longo de diferentes fases do ciclo monetário justamente porque reúnem atributos raros: elevada geração de caixa, menor dependência de financiamento externo e maior resiliência operacional. Em ambientes de juros elevados, essas companhias tendem a se beneficiar de um prêmio defensivo relativo, uma vez que oferecem previsibilidade de retornos em um contexto de crédito mais caro e escasso.
Já quando o ciclo se inverte e os juros passam a cair, esse grupo costuma exibir não apenas vantagem relativa, mas também absoluta, impulsionado por fatores como a desinflação, a recuperação do poder de compra, a redução do custo da dívida e o aumento do apetite por risco por parte de investidores institucionais e estrangeiros.
A evidência empírica reforça essa leitura: estudo recente do Itaú BBA mostra que, nos três últimos ciclos de flexibilização monetária no Brasil — 2011, 2016 e 2023 —, o Índice de Dividendos da B3 (IDIV) apresentou retorno mediano de 22,1%, mais de quatro vezes o desempenho do Ibovespa no mesmo período, de 5,4%. Esse ambiente cria uma combinação favorável, na qual ocorre simultaneamente uma alavancagem operacional e uma desalavancagem financeira, beneficiando também, ainda que com alguma defasagem temporal, os fundos imobiliários — um cenário que historicamente recompensa investidores pacientes e com capacidade de carregar posições ao longo do tempo.
Nesse contexto, a mudança nas regras do imposto de renda adiciona um componente tático relevante ao mercado. A reforma tributária encerra a isenção de dividendos vigente desde 1995 e estabelece, a partir de 2026, uma alíquota de 10% sobre dividendos mensais que excedam R$ 50 mil por empresa e por pessoa física. Até lá, contudo, permanece válida a regra atual: os dividendos referentes ao exercício de 2025 continuam isentos, desde que sejam anunciados ainda neste ano.
Esse detalhe regulatório abriu uma janela pontual que vem estimulando uma forte antecipação de anúncios de proventos. Entre os exemplos mais emblemáticos estão…