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O preço do ouro ultrapassou a marca de US$ 4.000 por onça pela primeira vez na história, em meio a um ambiente global marcado por elevada incerteza econômica e política. A paralisação do governo americano, que já dura mais de uma semana, somada a preocupações com a sustentabilidade fiscal dos EUA, a independência do Federal Reserve, o comércio internacional e as crescentes tensões geopolíticas, levou investidores a intensificar a busca por ativos considerados portos seguros.
Assim, o metal caminha para registrar seu melhor desempenho anual desde a década de 1970, período em que a inflação acelerada e o fim do padrão-ouro provocaram uma valorização histórica. Acontece que o ouro vem sendo visto como um porto mais confiável que o dólar, refletindo as dúvidas crescentes sobre a moeda americana e sua capacidade de preservar valor num cenário de pressões fiscais e instabilidade política.
Nos demais mercados, o clima é de maior cautela. Em Wall Street, os principais índices encerraram ontem uma sequência de oito pregões consecutivos de alta, pressionados pelo impasse político nos EUA e pela expectativa em torno da ata do Federal Reserve, marcada para hoje.
Na Ásia, as bolsas acompanharam o tom negativo de Nova York, com quedas moderadas no Japão, Hong Kong e Taiwan, em mais um dia sem negociações na China e na Coreia do Sul devido ao feriado da Golden Week.
Na Europa, em contrapartida, os mercados abriram em alta nesta manhã, refletindo um otimismo cauteloso diante das negociações para a formação de um novo governo na França, após a recente crise política.
Entre as commodities, o petróleo voltou a operar em alta, enquanto investidores aguardam os dados semanais de estoques nos EUA e avaliam o impacto do aumento de produção anunciado pela Opep+. No Brasil, o risco fiscal entrou novamente no radar e tem pressionado os ativos neste início de outubro.
· 00:57 — Mau humor no Ibovespa
Por aqui, o Ibovespa registrou ontem sua maior queda em quase dois meses, refletindo a crescente preocupação dos investidores com o cenário fiscal brasileiro (havia espaço para alguma realização de lucro).
O movimento ocorreu em meio à tramitação da Medida Provisória que busca alternativas ao aumento do IOF, peça considerada estratégica pela Fazenda para reforçar a arrecadação e sustentar o equilíbrio das contas públicas. A MP, no entanto, corre risco de perder a validade à meia-noite de hoje, após ter sido aprovada por uma margem apertada na Comissão Mista (13 votos a 12), mesmo após passar por alterações relevantes no texto.
Essas concessões reduziram a projeção de receitas para 2026 de R$ 20,9 bilhões para cerca de R$ 17 bilhões. Entre as mudanças, destacam-se a manutenção das isenções para LCAs e LCIs — cuja tributação de 5% poderia render R$ 2,6 bilhões ao governo —, a retirada do aumento da alíquota sobre apostas esportivas de 12% para 18%, que representaria cerca de R$ 1,7 bilhão, e a fixação do IR sobre JCP em 18%, abaixo dos 20% inicialmente previstos.
Embora relevante, esse ruído fiscal é modesto se comparado à preocupação maior dos mercados: o risco de que o governo Lula avance em medidas de caráter populista que pressionem ainda mais as contas públicas. Um exemplo emblemático é a proposta de gratuidade nas passagens de ônibus, que, embora tenha sido descartada no curto prazo por técnicos da Fazenda, está sendo mapeada a pedido direto do presidente — informação confirmada por Fernando Haddad ontem.
Esse debate fiscal ocorre em um momento em que a popularidade do governo Lula voltou a subir, reduzindo a distância entre aprovação e desaprovação para apenas um ponto percentual — o melhor resultado desde janeiro. De acordo com a pesquisa mais recente, 48% da população aprovam o governo e 49% desaprovam.
Esse movimento positivo também tem contado, ironicamente, com a ajuda da oposição: a atuação da ala mais radical da direita, liderada por Eduardo Bolsonaro, tem contribuído para a recuperação da imagem do governo — no episódio recente envolvendo Trump, com quem Lula manteve, até agora, uma relação amistosa. Entramos agora na janela de 12 meses que antecede as eleições municipais, período no qual notícias relacionadas a pesquisas e percepções sobre uma possível alternância de poder costumam aumentar a volatilidade dos mercados.
A probabilidade de que uma agenda econômica menos comprometida com o ajuste fiscal ganhe espaço no debate político vem aumentando — um movimento que tende a pesar sobre os ativos domésticos, sobretudo porque uma nova rodada de reformas fiscais será inevitável em 2027. Em 2025, é improvável que surjam avanços estruturais significativos nessa frente — o foco tende a se deslocar apenas em 2026, a menos que a oposição consiga se reorganizar antes do previsto, o que, até aqui, tem se mostrado um desafio. Diante desse cenário, a recomendação é clara: o investidor deve preparar-se para um ambiente de maior oscilação política e fiscal, com impactos potenciais relevantes sobre os preços dos ativos domésticos.
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· 01:45 — Na expectativa pela ata do Fomc
Nos Estados Unidos, os mercados acionários enfrentaram um pregão desafiador, em contraste com a contínua escalada do ouro, impulsionada por um ambiente de incertezas políticas e econômicas.
Um dos principais destaques foi a disparada de mais de 200% nas ações da Trilogy Metals, após o governo Trump anunciar um investimento de US$ 35,6 milhões para adquirir 10% da companhia.
O movimento faz parte de uma estratégia para fortalecer o fornecimento doméstico de minerais essenciais do Alasca, revertendo decisões ambientais do governo Biden. A medida também reflete a crescente preocupação dos EUA em reduzir a dependência externa, especialmente da China, que ainda responde por cerca de 70% da produção global de terras raras.
No mercado acionário americano, os índices encerraram em baixa: o Nasdaq recuou 0,7%, o S&P 500 caiu 0,4% — interrompendo uma sequência de sete altas consecutivas — e o Dow Jones perdeu 0,2%.
No setor de tecnologia, a Oracle foi duramente penalizada após uma reportagem revelar margens de lucro bem menores que o esperado em seu negócio de computação em nuvem com chips Nvidia, com perdas estimadas em cerca de US$ 100 milhões em três meses.
A ação chegou a cair 7,1% ao longo do dia e fechou em queda de 2,4%, arrastando consigo o setor de tecnologia e contribuindo para a fraqueza do S&P 500, num sinal claro de que a rentabilidade dos investimentos em inteligência artificial ainda se encontra em estágios iniciais.
No cenário macroeconômico, a atenção dos investidores se volta para a divulgação da ata da última reunião do Federal Reserve, prevista para hoje. Em setembro, o banco central americano realizou seu primeiro corte de juros do ano, reduzindo a taxa básica em 25 pontos-base, para a faixa de 4,00% a 4,25%.
As expectativas de mercado apontam para uma probabilidade de 96% de um novo corte de mesma magnitude no final de outubro e 85% de chance de mais uma redução em dezembro. Apesar disso, dirigentes do Fed têm sinalizado uma postura mais prudente: a inflação permanece acima da meta de 2% e há dúvidas sobre a real necessidade de estímulos adicionais diante de uma economia ainda resiliente.
A paralisação do governo americano, que interrompeu a divulgação de dados oficiais de emprego, aumentou a incerteza, obrigando a autoridade monetária a calibrar suas decisões com informações mais limitadas. Nesse contexto, a ata ganha importância adicional, podendo oferecer sinais sobre como o Fed está avaliando o comportamento da inflação e do mercado de trabalho, em um momento em que restam apenas duas reuniões até o fim do ano.
· 02:34 — Surpresa?
A Tesla surpreendeu o mercado ao anunciar versões mais acessíveis de seus dois principais modelos, em uma estratégia clara para sustentar o ritmo de vendas diante do fim dos incentivos fiscais federais de US$ 7.500 para veículos elétricos nos Estados Unidos.
O novo Model Y terá preço inicial de US$ 39.900, cerca de 11% mais barato que a versão básica anterior, enquanto o Model 3 começará em US$ 36.900. Ambos ficam abaixo da marca simbólica de US$ 40.000, um patamar que Elon Musk vem citando desde 2013 como meta estratégica para ampliar o acesso à marca e conquistar novos segmentos de consumidores.
A decisão ocorre após um terceiro trimestre excepcional, impulsionado pela corrida de clientes para aproveitar os créditos fiscais antes de sua expiração. No entanto, vale a atenção para um ponto importante: esses novos veículos não são modelos inéditos, mas versões simplificadas dos já existentes, com menor autonomia, acabamento mais básico e menos opções de personalização.
Ou seja, trata-se mais de um ajuste de portfólio do que de uma inovação capaz de expandir significativamente o público da marca, o que reduziu o impacto da surpresa.
A reação do mercado financeiro foi dividida. Por um lado, a iniciativa foi vista como um movimento positivo para preservar as entregas trimestrais e reforçar a competitividade da Tesla frente aos fabricantes chineses de veículos elétricos de baixo custo, cuja presença global vem crescendo rapidamente.
Por outro, os descontos são relativamente modestos — em torno de US$ 5.000 — e podem pressionar as margens de lucro, ao mesmo tempo em que incentivam consumidores a migrar para versões mais baratas, sem gerar um aumento proporcional na base de novos compradores.
A ausência de um modelo totalmente novo, que muitos investidores esperavam como catalisador de um novo ciclo de crescimento, frustrou parte do mercado. O reflexo foi imediato: as ações da Tesla encerraram o pregão de terça-feira em queda de 4,5%, sinalizando a postura mais cautelosa dos investidores em relação à estratégia comercial da companhia neste novo contexto mais competitivo e desafiador.
· 03:28 — Mudança de planos
A Agência Internacional de Energia (AIE) promoveu uma revisão significativa em suas projeções para a expansão das energias renováveis nos EUA até 2030, reduzindo-as pela metade — de 500 para 250 gigawatts — em resposta às mudanças de política implementadas pelo governo Trump.
De acordo com o relatório Renewables 2025, a nova legislação intitulada “One Big Beautiful Bill” altera profundamente os principais pilares de incentivo ao setor. Entre as medidas adotadas estão a eliminação antecipada dos créditos fiscais federais, em vigor desde 1992 e peça central para viabilizar economicamente projetos renováveis; a imposição de novas restrições à importação de equipamentos; a suspensão de novos arrendamentos para energia eólica offshore; e a limitação de autorizações para projetos solares e eólicos em terras federais. Em conjunto, essas iniciativas tornam o ambiente menos previsível e menos estimulante para novos investimentos, reduzindo a velocidade de expansão da capacidade renovável americana num momento em que o setor vinha ganhando tração global.
No plano internacional, o quadro geral permanece positivo, ainda que um pouco menos robusto. A AIE projeta que a capacidade global de geração renovável deverá dobrar até 2030, com um acréscimo de 4.600 gigawatts — sendo cerca de 80% provenientes da energia solar e a maior parte do restante de fontes eólicas. Apesar do crescimento expressivo, a previsão foi ajustada para baixo em aproximadamente 5%, reflexo sobretudo de mudanças políticas nos dois principais motores da transição energética: Estados Unidos e China. No caso chinês, a substituição das tarifas fixas de longo prazo por um modelo de leilões com contratos por diferença tende a provocar uma desaceleração temporária no ritmo de novas instalações no segundo semestre de 2025. Ainda assim, a China continuará ocupando posição central nesse movimento, respondendo por cerca de 60% de toda a expansão global prevista, e devendo alcançar suas metas de energia solar e eólica para 2035 com cinco anos de antecedência, consolidando-se como o centro da nova onda de crescimento renovável.
· 04:19 — A corrida do ouro não para
Geralmente mencionado como uma das principais recomendações desta newsletter, o ouro foi o grande protagonista dos mercados ontem, ao atingir novos recordes históricos e desviar os holofotes das bolsas de valores.
Os contratos futuros ultrapassaram a marca simbólica de US$ 4.000 por onça-troy pela primeira vez, coroando a melhor trajetória do metal desde 1979, com valorização superior a 50% apenas em 2025. Essa escalada impressionante reflete a intensificação da busca global por ativos de refúgio diante de um ambiente político e econômico excepcionalmente conturbado.
Três acontecimentos, em particular, ajudaram a impulsionar os preços:
- a paralisação do governo americano, já no oitavo dia e comprometendo a divulgação de indicadores econômicos importantes;
- a renúncia do primeiro-ministro francês, que aprofundou a crise política e fiscal na França; e
- a ascensão de Sanae Takaichi no Japão, cuja postura favorável a políticas fiscais expansionistas pressionou o iene e os títulos soberanos japoneses.
Somam-se a isso os cortes de juros promovidos pelo Federal Reserve, que reduzem a atratividade de ativos tradicionais com rendimento e tornam o ouro relativamente mais competitivo.
A alta do metal é alimentada tanto por investidores individuais quanto por grandes instituições. Bancos centrais vêm ampliando suas reservas há meses, em um movimento coordenado de diversificação e proteção diante de tensões comerciais e riscos geopolíticos crescentes. Investidores institucionais e de varejo também têm direcionado recursos para ETFs lastreados em ouro, buscando blindar portfólios contra um cenário de dólar mais fraco e possível correção nos mercados acionários globais.
Figuras de peso, como Ken Griffin e Ray Dalio, reforçam essa visão: Dalio, por exemplo, sugere alocações relevantes da carteira em ouro como estratégia de proteção. Paralelamente, o bitcoin também renovou máximas acima de US$ 125 mil, indicando que a busca por alternativas está se espalhando por diferentes classes de ativos, mesmo as mais diferentes.
Em um contexto de instabilidade política internacional, juros em queda e dúvidas crescentes sobre a capacidade dos governos de manter a disciplina fiscal, o ouro reafirma seu papel histórico como porto seguro — e, neste momento, como um dos ativos mais observados pelos investidores globais.
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· 05:03 — Um renascimento digno de nota
A energia nuclear, que por décadas permaneceu à margem do debate energético global devido a preocupações com segurança, vive hoje um renascimento inequívoco. Sua participação na matriz elétrica mundial recuou de 17% em 1996 para 9% em 2024, refletindo anos de estagnação e desconfiança. No entanto, avanços tecnológicos e regulatórios — especialmente no campo da segurança — combinados à crescente urgência por fontes de energia de baixo carbono, reacenderam o interesse de governos e empresas. Um catalisador adicional vem das…