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Com a paralisação do governo americano ainda sem uma solução à vista e sem novos dados econômicos na agenda, os investidores voltam suas atenções para os discursos de dirigentes do Federal Reserve previstos para esta manhã, além de mais uma fala da presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde. No entanto, a frequência cada vez maior de suas aparições públicas tem diluído o impacto de suas declarações sobre os mercados.
Na Europa, os holofotes permanecem voltados para a crise política francesa: o presidente Emmanuel Macron concedeu 48 horas ao primeiro-ministro demissionário, Sébastien Lecornu, para tentar negociar com os partidos da oposição uma solução fiscal que evite um agravamento do impasse institucional. O cenário de incerteza se refletiu sobre os ativos, já que os futuros dos títulos franceses estão com um desempenho inferior aos dos papéis alemães, ampliando os prêmios de risco da dívida. Paralelamente, o ouro avançou em direção aos US$ 4.000 por onça, em meio à busca por proteção. Embora a situação lembre, em certa medida, o episódio britânico envolvendo Liz Truss, os mercados franceses mantêm relativa estabilidade enquanto aguardam sinais mais claros sobre a formação de um novo governo ou a possível convocação de eleições parlamentares antecipadas.
No ambiente asiático, apenas os mercados de Tóquio e Taiwan operaram nesta terça-feira — ambos encerrando o pregão em alta. No Japão, investidores acompanharam com atenção o comportamento dos títulos públicos após a eleição de Sanae Takaichi, política conhecida por defender uma postura fiscal mais expansionista, o que gera expectativas sobre eventuais mudanças na condução econômica, talvez mais parecida com o governo do já falecido ex-primeiro-ministro Shinzo Abe (“Abenomics”).
Já em Taiwan, o otimismo foi impulsionado pela valorização das ações da TSMC, que se beneficiou diretamente do acordo anunciado entre a OpenAI e a AMD. As demais bolsas asiáticas permaneceram fechadas em razão de feriados locais. Entre as commodities, o petróleo volta a subir mais timidamente nesta manhã após a alta ontem — a decisão da Opep+ de aumentar a produção em 137 mil barris diários foi interpretada como insuficiente frente às expectativas dos investidores, atenuando temores de um grande superávit de oferta nos próximos meses.
· 00:56 — Entre amigos?
No Brasil, o Ibovespa iniciou a semana em terreno negativo, refletindo a crescente apreensão dos investidores diante das discussões fiscais em Brasília. No centro das atenções está a Medida Provisória que substitui o aumento do IOF, peça crucial para assegurar cerca de R$ 20 bilhões em receitas já incorporadas ao Orçamento. A MP expira amanhã, e seu destino ainda é incerto: embora exista um risco elevado de caducar, há espaço para uma aprovação relâmpago entre hoje e amanhã, tanto na comissão mista quanto nos plenários da Câmara e do Senado. Como já destaquei anteriormente, se o aumento do IOF já era visto como uma solução improvisada, as alternativas propostas soam como ainda mais frágeis. O governo, ao recorrer a “gambiarras” fiscais, adia para 2027 — após as eleições — a necessidade de enfrentar de forma estrutural um desequilíbrio orçamentário que continua a se agravar.
Paralelamente, avança no Senado o projeto que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil mensais, aprovado por unanimidade na Câmara, o que reforça a pressão sobre as contas públicas. Ainda assim, o assunto que dominou as manchetes foi o telefonema inesperado entre Lula e Donald Trump, que reacendeu as expectativas de um acordo comercial e de revisão das tarifas impostas aos produtos brasileiros. Os dois líderes concordaram em se encontrar pessoalmente em breve. Trump classificou a conversa como “muito boa”, elogiou Lula e declarou que ambos vão começar a fazer negócios, sinalizando uma reaproximação diplomática após um período de tensões. A indicação do secretário de Estado Marco Rubio — conhecido por sua postura dura em relação a governos latino-americanos não alinhados — adiciona nuances ao processo, mas, no geral, o movimento é visto como positivo: ajuda a reduzir o risco de escalada nas fricções comerciais. Ao mesmo tempo, a situação enfraquece a ala mais radical da oposição, que até aqui não conseguiu se articular de forma consistente em torno de um nome viável para as eleições de 2026.
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· 01:44 — Sem resolução
A paralisação do governo americano se estende sem sinais concretos de solução no curto prazo, com democratas e republicanos engajados em uma intensa troca de acusações. Apesar do impasse político, o apetite dos investidores por risco permanece firme. Na segunda-feira, o S&P 500 avançou 0,4% e o Nasdaq Composite subiu 0,7%, alcançando seus 32º e 31º recordes de fechamento em 2025, respectivamente. Ouro e prata também renovaram máximas históricas, enquanto o Dow Jones teve leve recuo de 0,1%, mas ainda registrou o segundo maior fechamento de sua história.
Esse comportamento reflete um padrão: quando os fundamentos econômicos e corporativos são favoráveis, os mercados tendem a ignorar ruídos políticos de curto prazo. Lucros corporativos robustos, confiança resiliente dos investidores e a ausência temporária de dados oficiais criaram um ambiente positivo. Além disso, historicamente, paralisações prolongadas do governo costumam ser seguidas por recuperações ainda mais vigorosas, e a aproximação do quarto trimestre — responsável por parcela relevante dos ganhos anuais — reforça essa percepção otimista.
No front macroeconômico, o Federal Reserve de Nova York divulgará a Pesquisa de Expectativas do Consumidor de setembro, enquanto os dados de crédito ao consumidor também devem ser publicados, ainda que sem contextualização robusta. Além disso, o governo Trump postergou para 1º de novembro a implementação de uma tarifa de 25% sobre caminhões — originalmente prevista para outubro —, adicionando um novo elemento à paisagem econômica em transformação.
· 02:39 — Crise sem fim
A crise política francesa escalou de forma significativa com a renúncia inesperada de Sébastien Lecornu, que deixou o cargo de primeiro-ministro apenas 26 dias após sua nomeação — e um dia depois de anunciar a formação de seu gabinete. Lecornu se tornou o quarto chefe de governo a cair em apenas 13 meses, reforçando a percepção de que o cargo se transformou em sinônimo de instabilidade crônica. Sua saída foi precipitada pela forte resistência do Parlamento à presença de figuras associadas ao governo anterior, derrubado semanas antes, e expôs a dificuldade do Executivo em construir coalizões duradouras. Em uma tentativa de última hora para evitar um agravamento da crise institucional, o presidente Emmanuel Macron concedeu a Lecornu um prazo de 48 horas para negociar com a oposição e tentar garantir apoio à aprovação de um orçamento fiscalmente restritivo — um desafio considerável diante de um déficit público que chegou a 5,8% do PIB em 2024, o maior desde a Segunda Guerra Mundial. A turbulência política gerou reação imediata nos mercados: o índice CAC 40 recuou, os spreads entre os títulos franceses e alemães atingiram os níveis mais altos em vários anos, o euro perdeu força e o ouro se aproximou da marca de US$ 4.000 por onça, sinalizando uma busca mais intensa por ativos de proteção.
A renúncia de Lecornu aprofunda a incerteza política na segunda maior economia da Zona do Euro, colocando Macron diante de três opções complexas e nenhuma solução simples. O presidente pode tentar nomear mais um novo primeiro-ministro, correndo o risco de enfrentar mais um colapso político; convocar eleições parlamentares antecipadas, como fez no ano passado e que poderia fortalecer ainda mais o partido de Marine Le Pen; ou renunciar, alternativa que já descartou. O episódio contaminou o sentimento dos mercados europeus. Lecornu, visto até então como o “último recurso” de Macron para sustentar sua governabilidade, tornou-se símbolo do fracasso da atual estratégia política do presidente. A saída repentina deixou Macron sob pressão crescente para apresentar uma resposta clara e eficaz à crise institucional.
· 03:28 — Mais negociação…
As negociações para pôr fim à guerra em Gaza tiveram início ontem no Egito, na véspera do segundo aniversário do ataque terrorista de 7 de outubro de 2023, que desencadeou o atual conflito. Israel e Hamas participam de conversas indiretas em uma cidade no Mar Vermelho, discutindo o plano de paz de 20 pontos proposto pelo presidente Donald Trump. O encontro ocorre sob intensa pressão internacional por um cessar-fogo, mas divergências profundas permanecem, principalmente quanto ao desarmamento do Hamas e à retirada das tropas israelenses do território. O grupo sinalizou disposição para libertar os reféns restantes em troca da libertação de prisioneiros palestinos, embora os detalhes ainda estejam sendo negociados. A Casa Branca tem pressionado por avanços rápidos, e a expectativa é de que essa fase inicial das tratativas se estenda por vários dias. Como já comentei neste espaço anteriormente, o plano de Trump prevê a criação de uma autoridade palestina tecnocrática, composta por especialistas independentes para administrar Gaza, supervisionada por um “Conselho da Paz” internacional liderado pelo próprio presidente americano e figuras públicas como o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair.
A estrutura delineada remete a experiências históricas de administração estrangeira, como os protetorados britânicos estabelecidos no Golfo Pérsico no século XIX e o Mandato Britânico no período entre guerras — ambos marcados por resistências locais. Apesar das críticas, a iniciativa conta com apoio de países árabes estratégicos, como Catar, Jordânia, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Egito, além de potências europeias — entre elas Espanha, Alemanha, Reino Unido e França. O envolvimento dessas nações pode mitigar a percepção de que o plano não para de pé, mas, na ausência de um cronograma claro para a transição, há o risco de que esses governos acabem presos em uma administração prolongada e politicamente desgastante. O Hamas, por sua vez, aceitou pontos importantes do plano — como a libertação dos reféns e a transferência de poder —, mas rejeitou o desarmamento e a supervisão internacional, dois elementos que despontam como potenciais entraves centrais.
· 04:15 — Rotas alternativas
A China tem recorrido a mecanismos sofisticados de comércio para assegurar o fornecimento de petróleo e metais do Irã, driblando as sanções impostas pelo Ocidente. Embora o Ministério das Relações Exteriores chinês tenha declarado desconhecer os acordos, reafirmou sua oposição a “sanções unilaterais ilegais”, sinalizando alinhamento político com Teerã. No caso do petróleo, o arranjo envolve uma combinação de empresas estatais, estruturas financeiras paralelas e contratos de infraestrutura. Na prática, companhias chinesas constroem aeroportos, refinarias e outros empreendimentos no Irã em troca do fornecimento de petróleo. A estatal Zhuhai Zhenrong — sancionada pelos EUA — atua como principal compradora do petróleo iraniano, enquanto a plataforma financeira chinesa Chuxin recebe mensalmente centenas de milhões de dólares referentes às exportações. Esses valores são então transferidos para empreiteiras chinesas responsáveis pelos projetos no território iraniano, com a seguradora estatal Sinosure garantindo o financiamento dessas obras. Estima-se que, somente em 2024, cerca de US$ 8,4 bilhões em pagamentos relacionados ao petróleo iraniano tenham circulado por esse sistema alternativo.
Paralelamente, Pequim também tem utilizado um modelo semelhante para obter metais estratégicos, como cobre e zinco. Empresas chinesas como Chery Automobile e Tongling Nonferrous Metals participam de um esquema no qual veículos semi-montados são enviados ao Irã em troca desses metais. A Chery fornece peças automotivas para uma montadora parceira, que produz carros semi-desmontados e os exporta ao Irã. No país, os veículos são finalizados e vendidos sob a marca local MVM. Em contrapartida, o cobre e o zinco iranianos são embarcados para a China, com a Tongling coordenando a intermediação e a distribuição dos metais para outras empresas chinesas. Esses mecanismos de troca revelam como a China tem desenvolvido redes comerciais e financeiras paralelas, evitando transações diretas em dólar e reduzindo sua exposição ao sistema financeiro ocidental — ao mesmo tempo em que garante acesso contínuo a recursos energéticos e minerais estratégicos.
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· 05:03 — Uptober?
O Bitcoin atingiu uma nova máxima histórica ontem ao superar os US$ 126 mil, impulsionado pelo apetite global por risco mesmo em meio ao prolongamento do shutdown do governo americano. Embora tenha devolvido parte dos ganhos desde então, a principal criptomoeda ainda acumula alta de cerca de 13% desde o final de setembro e 33% desde o início de 2025. O movimento foi acompanhado por outras moedas digitais, como Ethereum e Solana, que também registraram ganhos significativos ao longo da semana passada, embora tenham iniciado esta em leve queda — uma correção interpretada como realização de lucros após a valorização.
Esse desempenho reflete a correlação cada vez mais estreita entre o mercado de criptoativos e os…