2024, o ano da geopolítica. Imagem: Freepik
Os mercados globais atravessam a quarta-feira (15) sob a influência simultânea de fatores geopolíticos, expectativas de política monetária e indicadores econômicos ambíguos, resultando em um ambiente de alta volatilidade.
O ouro foi o protagonista de ontem: impulsionado pela busca dos investidores por ativos de proteção em meio à escalada das tensões comerciais entre EUA e China e pelo discurso cauteloso de Jerome Powell, o metal atingiu um novo recorde histórico de fechamento, cotado a mais de US$ 4.160 por onça.
O presidente do Federal Reserve sinalizou que um novo corte de 25 pontos-base na taxa de juros deve ocorrer na próxima reunião, destacando a desaceleração no ritmo de contratações e priorizando o mercado de trabalho em detrimento de preocupações inflacionárias — atualmente com núcleo em 2,9%, nível considerado apenas “ligeiramente elevado”.
Powell também indicou que o programa de aperto quantitativo deverá ser encerrado em breve. Essas declarações reforçaram o otimismo dos mercados futuros, mas foram parcialmente contrabalançadas pelo aumento das tensões geopolíticas: Trump ameaçou suspender o comércio de óleo de cozinha com Pequim, classificando a recusa chinesa em comprar soja americana como um “ato economicamente hostil”, depois do governo chinês ter intensificado os controles sobre exportações de terras raras, replicando a estratégia dos EUA sobre semicondutores e elevando o tom do embate estratégico entre as duas potências.
Na Ásia e na Europa, os mercados reagiram de forma construtiva, aproveitando o impulso vindo dos sinais de flexibilização monetária americana. As bolsas asiáticas encerraram a sessão em alta, revertendo as perdas da véspera, com destaque para o desempenho das ações de tecnologia.
Na Europa, o movimento também é positivo nesta manhã, especialmente em Paris: a bolsa francesa superou os pares após o primeiro-ministro Sébastien Lecornu anunciar o adiamento da reforma previdenciária para depois das eleições de 2027 — uma medida que assegura apoio político no curto prazo, embora aumente o risco fiscal.
Já na China, os dados de inflação reforçaram o quadro de demanda interna fraca: os preços ao consumidor caíram 0,3% e ao produtor recuaram 2,3%, marcando o 36º mês consecutivo de deflação na porta de fábrica — a sequência mais longa desde as reformas de mercado dos anos 1970. O governo chinês tem recorrido a estímulos direcionados, mas a recuperação tende a ser lenta, limitada pela crise imobiliária, pelo consumo anêmico e pela deterioração das relações comerciais.
Nos EUA, os mercados futuros operam em alta, sustentados por expectativas praticamente de novos cortes de juros em outubro e dezembro e por uma safra de resultados trimestrais, com destaque para Bank of America e Morgan Stanley.
· 00:54 — A persistente dança das inconsistências fiscais
No Brasil, a agenda traz hoje as vendas no varejo referentes a agosto, que devem indicar uma moderação no ritmo de crescimento. No conceito ampliado, a expectativa é de alta de 0,7%, após avanço de 1,3% em julho; já o varejo restrito deve subir 0,2%, revertendo a queda de 0,3% registrada no mês anterior. O resultado vem na esteira do setor de serviços, que apresentou crescimento de 0,1% em agosto, levemente acima das projeções de estabilidade — sinalizando continuidade da expansão econômica, embora em um compasso mais moderado.
De todo modo, a atividade doméstica segue em território positivo, o que dificulta a trajetória de cortes de juros por parte do Banco Central, que precisa calibrar o afrouxamento monetário em uma economia resiliente.
Ao mesmo tempo, os ativos locais continuam a enfrentar ventos fiscais contrários. Apesar de um ambiente global mais favorável — com perspectiva de cortes de juros e dólar mais fraco, beneficiando mercados emergentes —, as incertezas fiscais internas seguem pesando sobre o sentimento dos investidores. Sobre o tema, o governo adiou a votação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enquanto busca alternativas para compensar a queda de receita provocada pela derrubada da MP alternativa ao IOF.
Paralelamente, apresentou ao Tribunal de Contas da União (TCU) sua defesa em relação à prática de perseguir o piso da meta fiscal, amplamente criticada pela Corte. O argumento central do TCU permanece robusto e justificado: criar cerca de R$ 90 bilhões em exceções orçamentárias à meta e, ainda assim, mirar o piso do arcabouço representa uma estratégia questionável, que demanda correção.
Para completar, surgiu mais um fator de ruído: o governo estuda uma operação de crédito de R$ 20 bilhões com Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e instituições privadas para socorrer os Correios. A operação, que teria garantias da União, seria condicionada a medidas de ajuste na gestão da estatal. A empresa enfrenta uma deterioração acelerada de resultados: desde 2022 acumula prejuízos crescentes.
A necessidade projetada é de R$ 10 bilhões já em 2025 e mais R$ 10 bilhões em 2026, destinados a capital de giro e medidas de reestruturação. A operação de salvamento, além de sinalizar a fragilidade da estatal, gerou ruído adicional no mercado, reforçando preocupações com a sustentabilidade fiscal do governo (se for salvar outras estatais).
- LEIA TAMBÉM: Veja as 10 ações que podem impulsionar seu patrimônio em outubro. Confira o relatório gratuito disponibilizado pela equipe da Empiricus Research aqui.
· 01:43 — Ambiente volátil
O mercado americano viveu uma sessão volátil ontem, marcada por nova queda após comentários de Donald Trump sobre o comércio com a China. O S&P 500 chegou a caminhar para sua maior recuperação desde abril, mas encerrou o pregão em leve queda de 0,1%, enquanto o Nasdaq recuou 0,8%. O Dow Jones, por sua vez, subiu 203 pontos (+0,4%), registrando sua maior reversão intradiária desde 30 de abril. O movimento de alta perdeu força quando Trump indicou que a recusa da China em comprar soja americana era um “ato economicamente hostil” e que os EUA consideravam suspender o comércio de óleo de cozinha como retaliação. As declarações renovaram os temores de escalada da guerra comercial.
Autoridades americanas tentaram conter os ânimos: o Representante Comercial dos EUA, Jamieson Greer, afirmou que o país não aceitará que a China mantenha um regime que lhe permita vetar cadeias de suprimentos estratégicas, e classificou a postura chinesa como uma “grande escalada”. Agora, mesmo que a ameaça de Trump acabe sendo apenas ruído de curto prazo, o episódio reforça que o risco geopolítico seguirá embutido nos preços dos ativos enquanto não houver sinais concretos de avanço nas negociações.
A turbulência ofuscou o início positivo da temporada de balanços dos grandes bancos e antecede uma agenda relevante: hoje serão divulgados resultados de companhias como ASML, Bank of America e United Airlines, além do Livro Bege, que trará relatos regionais sobre a economia americana.
· 02:37 — O começo de temporada
A nova temporada de resultados corporativos nos EUA teve início em ritmo acelerado, marcada pela divulgação de números sólidos dos principais bancos de Wall Street. JPMorgan Chase, Citigroup, Wells Fargo, BlackRock e Goldman Sachs apresentaram resultados trimestrais acima das expectativas, reforçando a percepção de resiliência financeira mesmo em um ambiente de incertezas macroeconômicas.
O mercado estava particularmente atento aos sinais sobre a saúde do consumidor, e os dados vieram positivos: carteiras de crédito robustas e declarações otimistas das lideranças indicam que fatores de pressão, como tarifas comerciais e políticas migratórias, ainda não tiveram impacto relevante sobre os níveis de inadimplência.
O JPMorgan, por exemplo, revisou para baixo sua projeção de inadimplência líquida em cartões, de 3,6% para 3,3%, destacando a “resiliência contínua do consumidor” como principal razão para o ajuste. A instituição ponderou, no entanto, que seu público tende a ter pontuações de crédito mais altas do que a média, o que pode atenuar eventuais sinais de fragilidade.
No mercado acionário, a reação foi heterogênea: Wells Fargo disparou 7,2% e liderou os ganhos do S&P 500, seguida por Citigroup (+3,9%) e BlackRock (+3,4%), enquanto JPMorgan e Goldman Sachs registraram quedas de 1,9% e 2%, respectivamente. No agregado, o ETF SPDR S&P Bank avançou 3%, refletindo um otimismo comedido.
Ao mesmo tempo, as expectativas para os resultados do terceiro trimestre seguem elevadas, com aproximadamente 12% das empresas do S&P 500 divulgando seus balanços só nesta semana.
Diferentemente do padrão histórico, o mercado não revisou para baixo suas projeções de lucro por ação nos meses que antecederam a temporada — um movimento incomum que contribuiu para a recuperação dos mercados em setembro.
Este foi o primeiro ano desde 2023 em que não houve cortes nas estimativas, que normalmente variariam entre -3% e -4%. Ainda assim, tarifas mais elevadas podem começar a pressionar os resultados corporativos e o consumo, enquanto os investimentos maciços em inteligência artificial, embora tenham impulsionado o mercado, levantam preocupações sobre o aumento do endividamento empresarial para financiar projetos de capital. Apesar desses desafios, as estimativas iniciais de lucro por ação para o S&P 500 em 2026 estão em trajetória ascendente.
· 03:22 — Tensões comerciais persistem
As tensões comerciais entre Estados Unidos e China voltaram a ganhar intensidade após declarações de Donald Trump, que classificou a recusa de Pequim em comprar soja americana como um “ato economicamente hostil” e sinalizou que considera suspender o comércio de óleo de cozinha com o país como forma de retaliação.
O episódio ocorre em um momento em que as relações entre China e União Europeia também se deterioram: Bruxelas discute a possibilidade de exigir que empresas chinesas compartilhem tecnologia com companhias europeias como condição para manterem operações no bloco. A escalada geopolítica repercutiu nos mercados. Paralelamente, o Fundo Monetário Internacional adotou um tom mais prudente ao comentar o cenário global, destacando os riscos decorrentes de níveis elevados de endividamento, inflação persistente e crescimento mais fraco. Ainda assim, revisou para cima sua projeção de expansão global para 2025, de 3% para 3,2%.
Em resposta às crescentes restrições comerciais, Pequim deu início a medidas retaliatórias, impondo uma “taxa portuária” de US$ 1,7 milhão ao porta-contêineres americano Matson Waikiki, que atracou recentemente no Porto de Xangai. Essa ação é um indicativo de que a China pode ampliar seu escopo de retaliações para além de tarifas e controles de investimento, passando a atingir cadeias logísticas — o que teria potencial para elevar custos de transporte e pressionar cadeias globais de suprimentos.
· 04:15 — Uma grande derrota para Macron
O primeiro-ministro francês, Sébastien Lecornu, recém-reconduzido ao cargo, demonstrou abertura para suspender a reforma previdenciária que eleva a idade mínima de aposentadoria — uma das medidas econômicas centrais de Macron — como gesto de pacificação política. Em um discurso de 30 minutos em Paris, Lecornu fez um apelo direto aos parlamentares para que evitem uma crise fiscal e se comprometeu a construir, em conjunto com o Legislativo, um acordo orçamentário que devolva estabilidade ao país. Trata-se de uma inflexão relevante na estratégia do governo frente ao impasse parlamentar, ainda que simbolize uma derrota para Macron.
Nesse contexto, o posicionamento do Partido Socialista tornou-se determinante. Ocupando um papel estratégico na Assembleia Nacional, seus líderes condicionaram o apoio ao governo à suspensão da reforma previdenciária. Paralelamente, tanto a direita, liderada por Marine Le Pen, quanto a esquerda anunciaram a intenção de apresentar moções de desconfiança contra Lecornu hoje, aumentando a pressão. A percepção de que o risco de eleições antecipadas diminuiu trouxe alívio aos mercados, mas essa possibilidade ainda não saiu completamente do radar dos investidores.
- Onde investir neste mês? Veja 10 ações em diferentes setores da economia para buscar lucros. Baixe o relatório gratuito aqui.
· 05:01 — Movimento Estratégico em Infraestrutura Paulista: A Aquisição da EMAE pela Sabesp
No início do mês, a Sabesp anunciou a aquisição da EMAE (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), em um movimento de grande relevância estratégica para o setor de infraestrutura paulista. Criada nos anos 1990, a EMAE consolidou-se como um ativo híbrido, atuando simultaneamente na geração hidrelétrica — com 961 MW de capacidade instalada — e na gestão hídrica em áreas críticas da Região Metropolitana de São Paulo. A empresa é responsável por sistemas fundamentais, como os reservatórios Billings e Guarapiranga e o sistema Alto Tietê, pilares da segurança hídrica estadual. Com concessões de longo prazo, de até 18 anos, e receitas anuais em torno de R$ 2 bilhões indexadas à inflação, a companhia combina previsibilidade financeira e atratividade para investidores de perfil de infraestrutura. A operação tem impacto direto sobre duas empresas listadas relevantes já mencionadas aqui: de um lado, marca a saída da Eletrobras, simplificando seu portfólio; de outro, reforça a estratégia da Sabesp — cujo principal acionista privado é a Equatorial — de expandir sua presença em ativos para o abastecimento e a transição hídrica do estado.
Para a Sabesp, a aquisição de 70% da EMAE por R$ 1,1 bilhão representa um…