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O aguardado discurso de Jerome Powell em Jackson Hole ocorre hoje e monopoliza a atenção dos mercados globais, que seguem em compasso de espera, mas com potencial elevado de volatilidade. As apostas de corte de juros em setembro, que há poucos dias ultrapassavam 90%, recuaram para a faixa de 70% após falas mais cautelosas de dirigentes do Federal Reserve. Powell terá diante de si a difícil missão de equilibrar pressões políticas externas, vindas de Donald Trump — que insiste em reduções mais rápidas nas taxas —, com as divisões internas do FOMC, cada vez mais polarizado entre alas dovish e hawkish.
Os dados recentes, que apontam para uma economia ainda resiliente, com crescimento firme e inflação persistente, devem levar o presidente do Fed a sustentar não apenas sua visão de cenário, mas também uma defesa enfática da independência da instituição. Essa questão tornou-se especialmente sensível à medida que os ataques políticos se intensificam e, mesmo na aparência, já elevam o risco institucional nos Estados Unidos, um elemento que repercute diretamente sobre a credibilidade do dólar como moeda de reserva global.
No front de mercado, a correção recente das ações de tecnologia, somada ao alerta do Walmart sobre o avanço dos custos tarifários, reforça a percepção de que o ambiente segue frágil. A gigante do varejo, pela escala, ainda consegue amortecer parte das pressões e manter preços acessíveis, mas empresas menores não dispõem do mesmo fôlego, o que pode resultar em repasses ao consumidor e reacender tensões inflacionárias, tornando a tarefa do Fed ainda mais complexa. Para além do impacto doméstico, vale lembrar que o ritmo de cortes de juros nos EUA será determinante para a trajetória da política monetária no Brasil, influenciando diretamente a margem de manobra do Banco Central (e a possibilidade de corte de juros em dezembro). Nesse contexto, cresce a expectativa quanto ao tom de Powell: um discurso mais duro pode adiar apostas de afrouxamento e reacender atritos políticos com Trump. Enquanto isso, os mercados internacionais operam na expectativa, com bolsas na Ásia e na Europa em alta, mesmo diante das revisões negativas para a economia alemã, e o petróleo acumulando ganhos na semana, sustentado pela percepção de que a guerra na Ucrânia segue longe de uma solução e continuará impondo riscos à oferta global.
· 00:58 — O risco escondido sob a calmaria aparente
No Brasil, a agenda de indicadores econômicos segue esvaziada — não há nenhum dado relevante previsto para esta sexta-feira — e isso ajudou a manter o Ibovespa próximo da estabilidade no pregão de ontem, apesar de o ambiente político continuar carregado de incertezas. As tensões diplomático-comerciais com os Estados Unidos, os ruídos jurídicos envolvendo autoridades e as pesquisas eleitorais recentes reforçam a sensação de volatilidade. Ainda assim, o comportamento morno tanto no câmbio quanto na bolsa sugere, ao mesmo tempo, sangue-frio dos investidores, que parecem aguardar definições mais concretas antes de assumir novas posições de maior risco.
Nesta semana, já destaquei as pesquisas que mostraram um governo ligeiramente melhor avaliado e mais competitivo para 2026, como antecipamos. Esse avanço político acompanha a ausência de uma agenda consistente para enfrentar o problema fiscal, cuja discussão será inevitável em 2027. O pleito presidencial ainda está distante, mas o debate foi claramente antecipado — e os prováveis candidatos de oposição, embora comecem a ganhar visibilidade no cenário nacional, ainda mantêm grande margem de aprovação em seus estados. Governadores como Ronaldo Caiado, Ratinho Jr. e Tarcísio de Freitas, como visto na Genial/Quaest de hoje, continuam bem avaliados. A fotografia de 2025 pode ser de volatilidade e pessimismo, mas é provável que o cenário só mude de fato no início de 2026. Até lá, será preciso paciência e resiliência — Brasília, afinal, segue sendo terreno fértil para incertezas.
Exemplo disso foi a aprovação, pela Câmara, do pedido de urgência para a votação do projeto que isenta do Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil. A proposta nasce de uma discussão legítima — a reforma tributária da renda —, mas a forma como está sendo conduzida pode agravar ainda mais a fragilidade das contas públicas (parece mais um improviso, como um “puxadinho”). Isso porque, apesar da arrecadação federal em julho ter surpreendido positivamente, a expansão das despesas continua ocorrendo em um ritmo mais acelerado. Esse descompasso é hoje o verdadeiro calcanhar de Aquiles do Brasil: enquanto não enfrentarmos o desequilíbrio estrutural do orçamento, dificilmente conseguiremos resolver os demais problemas econômicos do país.
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· 01:41 — Nervosismo
Nos EUA, o nervosismo dos investidores ganhou força na véspera do aguardado discurso de Jerome Powell em Jackson Hole, após declarações de Beth Hammack, presidente do Federal Reserve de Cleveland. Hammack afirmou não enxergar razões para reduzir os juros já em setembro, destacando que a inflação permanece persistente e caminha “na direção errada”. Suas falas rapidamente se refletiram nas apostas de mercado: segundo a ferramenta FedWatch da CME, a probabilidade de um corte de 25 pontos-base na próxima reunião do FOMC recuou de mais de 80% para cerca de 70%. Esse ajuste nas expectativas trouxe cautela generalizada e pressionou os mercados acionários: o S&P 500 encerrou em queda de 0,4%, enquanto Dow Jones e Nasdaq recuaram 0,3%, em um movimento que traduz tanto a divisão interna no Fed quanto a expectativa elevada em torno do tom que Powell adotará em sua fala.
Além das incertezas sobre a política monetária, fatores setoriais também contribuíram para o desempenho negativo das bolsas. As grandes empresas de tecnologia — as “Sete Magníficas” — estenderam a sequência de quedas, levantando paralelos com a bolha das pontocom, embora o cenário atual seja substancialmente melhor, com fundamentos de lucro ainda robustos para os próximos anos. No campo macroeconômico, os sinais permaneceram contraditórios: os pedidos de auxílio-desemprego sugeriram um enfraquecimento gradual do mercado de trabalho, enquanto os PMIs de agosto apontaram para uma economia aquecida e ainda pressionada pela inflação, especialmente nos setores industrial e de serviços. Entre os balanços corporativos, o destaque negativo ficou com o Walmart, que recuou 4,5% após divulgar uma rara perda de lucros, ainda que a receita tenha superado as estimativas. Diante desse conjunto de sinais mistos — inflação resiliente, emprego em moderação e resultados corporativos contrastantes —, o discurso de Powell assume papel ainda mais determinante, com potencial de redefinir o humor dos mercados e o rumo das expectativas em relação à trajetória dos juros americanos.
· 02:34 — O discurso
Jerome Powell sobe hoje ao palco em Jackson Hole para um dos discursos mais aguardados do ano, em meio a um cenário repleto de incertezas quanto ao crescimento, à inflação e à condução da política monetária nos Estados Unidos. A expectativa é de que o presidente do Federal Reserve adote um tom de cautela, procurando preservar flexibilidade em sua comunicação e evitando comprometer-se antecipadamente com cortes ou manutenção das taxas de juros. O peso da decisão deverá recair sobre os próximos dados de emprego e inflação, que ganharão relevância decisiva antes da próxima reunião do FOMC em setembro.
O mercado, atento a cada palavra e gesto, sabe que esta será a última participação de Powell no simpósio como presidente do Fed, o que aumenta ainda mais a carga simbólica do evento. Atualmente, a probabilidade de um corte em setembro está em torno de 70%, abaixo dos mais de 90% observados na semana passada, refletindo a divisão interna entre dirigentes que temem uma inflação mais persistente — impulsionada pelas tarifas impostas pelo governo Trump — e aqueles que enxergam no enfraquecimento do mercado de trabalho uma justificativa para reduzir os juros.
Esse pano de fundo torna a fala de Powell ainda mais sensível. O mercado de trabalho americano deu sinais de perda de fôlego, com revisões para baixo de mais de 250 mil vagas nas estatísticas recentes, enquanto o avanço nos preços das empresas sugere pressão adicional sobre os índices de inflação ao consumidor. Essa ambiguidade ajuda a explicar o raro episódio de dissidência dentro do próprio Fed: dois governadores votaram a favor dos cortes, defendendo que os efeitos das tarifas devem ser temporários. A pressão política, por sua vez, intensifica o quadro de instabilidade.
A Casa Branca vem escalando o tom: Donald Trump chegou a ameaçar publicamente demitir Powell caso os juros não caiam, enquanto a diretora (o termo nos EUA é “governadora”) do comitê Lisa Cook, indicada por Biden, tornou-se alvo de investigação do Departamento de Justiça e de pedidos formais de renúncia. Em um ambiente de corda bamba, o discurso de hoje não será apenas um sinal econômico: servirá também como um teste institucional crucial para a credibilidade e a independência do banco central americano — fatores indispensáveis para a confiança global no dólar.
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· 03:29 — Mais detalhes
Os EUA e a União Europeia finalmente divulgaram os detalhes de seu novo acordo comercial, concebido para reduzir tensões, mas ainda cercado de controvérsias. Entre os pontos centrais, Washington concordou em reduzir para 15% a tarifa sobre automóveis europeus — bem abaixo dos atuais 27,5% — desde que Bruxelas faça sua parte e diminua a própria alíquota de 10% sobre veículos importados. Produtos farmacêuticos europeus também passarão a enfrentar essa mesma taxa de 15%, evitando a ameaça inicial de Donald Trump de impor tarifas de 25% ou mais. Em contrapartida, a UE assumiu compromissos relevantes com a economia americana: investir US$ 600 bilhões em recursos energéticos até 2028, destinar ao menos US$ 40 bilhões para chips de inteligência artificial e ampliar a aquisição de equipamentos de defesa produzidos nos Estados Unidos. Além disso, o bloco abriu espaço adicional para produtos agrícolas americanos, incluindo frutos do mar, laticínios, frutas e nozes.
Apesar dos avanços, algumas áreas estratégicas ficaram de fora. Vinhos, destilados e dispositivos médicos europeus não terão acesso facilitado ao mercado americano, ao passo que segmentos como aeronáutica e medicamentos genéricos foram contemplados com o status de “nação mais favorecida”. O acordo foi celebrado em Berlim como uma vitória importante, especialmente para a Alemanha, grande exportadora de automóveis. No entanto, em outras capitais europeias o pacto recebeu críticas contundentes, sendo qualificado por alguns governantes como uma “quase rendição” ao governo americano. De fato, embora o alívio tarifário represente um ganho imediato, persiste o ceticismo quanto à velocidade da normalização do comércio transatlântico, com projeções de que o equilíbrio pleno entre as duas potências pode levar décadas para se consolidar (não é algo trivial de se colocar em prática).
· 04:12 — A semana dos russos
A percepção predominante no mercado segue sendo a de que as negociações de paz entre Rússia e Ucrânia continuam paralisadas. Ainda assim, após três anos e meio de conflito, Moscou conseguiu acumular, ao menos na aparência, uma sequência de vitórias. O principal movimento veio da cúpula no Alasca, onde Trump se mostrou mais próximo da posição de Vladimir Putin do que de seus aliados europeus. Os Estados Unidos, que até pouco tempo atrás pautavam sua atuação em princípios de soberania e respeito ao direito internacional, agora sinalizam uma postura mais pragmática: pressionar Kiev a ceder parte de seu território em troca de um eventual acordo de paz. Nesse contexto, a Europa revelou sua limitação de influência. Mesmo após líderes europeus acompanharem Volodymyr Zelenskiy a Washington para tentar reaproximar Trump do campo ocidental, saíram sem grandes avanços. O resultado prático tem sido a discussão de possíveis garantias de segurança para a Ucrânia, restritas a apoio aéreo e de inteligência, sem qualquer compromisso de envio de tropas em solo — o que deixa sobre os europeus a responsabilidade direta pelo suporte militar.
Enquanto isso, Putin reforçou suas exigências como pré-condição para um cessar-fogo. O líder russo demanda que a Ucrânia abra mão do Donbass (Donetsk e Luhansk), desista de ingressar na OTAN e impeça a presença de tropas ocidentais em seu território. Em troca, estaria disposto a congelar as atuais linhas de frente em Zaporizhzhia e Kherson. Embora em conversas com Trump tenha flexibilizado algumas demandas apresentadas em 2024, Kiev rejeitou a proposta, classificando-a como equivalente a uma rendição. Autoridades americanas afirmam que Putin teria aceitado discutir garantias de segurança “semelhantes ao Artigo 5” da OTAN, algo saudado no Ocidente como um avanço, mas ainda sem confirmação oficial do Kremlin. No ritmo atual de concessões, o presidente russo parece confortável em manter o silêncio estratégico, enquanto a Europa segue sem espaço efetivo na mesa de negociações e Trump pressiona por um encontro direto entre ele, Zelenskiy e Putin.
· 05:07 — Se afastando de ruídos
Nos últimos dias, vimos uma correção nas ações ligadas ao tema de inteligência artificial, mas isso não significa que o mês tenha sido fraco em novidades no setor — pelo contrário. O grande destaque foi…