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O dia amanhece em clima de alívio nos mercados globais. Futuros americanos e bolsas europeias avançam, na esteira de uma sessão asiática já positiva. O gatilho do bom humor? Uma reviravolta judicial nos Estados Unidos: o tribunal de comércio internacional decidiu que cerca de metade das tarifas impostas por Donald Trump é ilegal. Em outras palavras, parte significativa do tarifaço caiu por terra — por ora.
A decisão, naturalmente, provocou reação imediata: investidores celebram a perspectiva de alívio tributário para empresas e consumidores americanos, o que reacende o apetite por risco. Mas é bom conter o entusiasmo, já que o governo deve recorrer, e não seria a primeira vez que a Suprema Corte opta por ignorar precedentes por conveniências políticas. Mais ainda, Trump segue com outras armas à disposição para reinstaurar as tarifas. Ou seja, a euforia ainda repousa sobre terreno instável.
Enquanto isso, outro nome estrela o dia: Nvidia (NVDC34). A gigante da inteligência artificial entregou mais um resultado impressionante, impulsionando suas ações no after hours e contaminando positivamente o pré-mercado, a ponto de eclipsar até mesmo o tombo da HP após um guidance decepcionante. Na agenda do dia, o mercado também digere dados de atividade econômica nos EUA e números de emprego no Brasil. Entre as commodities, o petróleo avança, embalado tanto pelo pela questão comercial quanto pelos desdobramentos da última reunião da Opep+, que seguem reverberando.
· 00:53 — O governo está flertando com uma grande derrota política
No Brasil, o investidor encontra-se suspenso entre o alívio com a decisão judicial nos EUA que desmonta parte do tarifaço trumpista e a apreensão crescente com o tamanho que a crise do IOF assumiu por aqui. A percepção — cada vez mais cristalina — de que o governo Lula prefere arrecadar do que cortar gastos contaminou o humor dos mercados ontem. O Ibovespa devolveu parte dos ganhos recentes, encerrando em queda, enquanto o dólar voltou a flertar com a incômoda marca dos R$ 5,70.
A agenda local traz hoje (29) a digestão do IGP-M de maio, que apontou deflação e reforça a tese de encerramento do ciclo de aperto monetário. Além disso, o dia reserva a divulgação da taxa de desemprego da PNAD Contínua, em sequência aos dados surpreendentemente fortes do Caged revelados ontem (28). Como já pontuamos anteriormente, o governo tem sido bem-sucedido em gerar uma fotografia positiva de curto prazo (acelerar com o freio de mão puxado) — ainda que à custa de empurrar a conta para o futuro. Há também expectativa pelos números fiscais do mês, mas o mercado está mesmo de olho em outra coisa: o que sobrará da lambança do IOF.
Todas as atenções se voltam agora ao Congresso, onde os líderes partidários discutem um Projeto de Decreto Legislativo para derrubar as medidas do governo. Haddad passou a noite em modo bombeiro, reunindo-se com Hugo Motta e Davi Alcolumbre na tentativa de conter a insatisfação. Mas o estrago já está feito: há mais de 20 projetos legislativos em tramitação para revogar o decreto do IOF — e não apenas da oposição. A base governista também engrossa o coro do descontentamento. Se o governo for derrotado nessa frente, será um baque político gigantesco, reafirmando o diagnóstico que fazemos há meses: o Planalto perdeu o controle da articulação política.
Haddad tenta se defender, argumentando que a revogação das medidas exigiria cortes de despesas que ameaçariam o funcionamento da máquina pública. O discurso não soa bem. A verdade é que essa crise é fruto de uma escolha: ao aprovar a PEC da Transição, o governo deliberadamente abriu os cofres e agora se assusta com a profundidade do buraco cavado. A sensação de déjà-vu fiscal remete diretamente aos erros da era Dilma, com uma diferença: à época, ao menos existia a ilusão de que o descontrole era passageiro. Agora, o esgotamento é visível — inclusive dentro do Congresso, que dá sinais de intolerância crescente com a política tributária do governo.
O país precisa urgentemente retomar o debate sobre as despesas obrigatórias — e isso passa inevitavelmente por uma Nova Reforma da Previdência, uma Reforma Orçamentária e uma Reforma Administrativa (tabu). Mas Lula segue obstinado em sua agenda populista, sempre associada a mais gastos e mais pressão fiscal. Assim, o “ajuste” que deveria começar agora é adiado para 2027, com sorte — e apenas se o resultado eleitoral permitir. Um detalhe cruel: a cada dia que esse caminho for adiado, maior será o tamanho da dor lá na frente. O ajuste necessário em 2027 será brutal.
Apesar das especulações de ontem, uma eventual queda de Haddad agora parece improvável. Sua saída só deve ocorrer em 2026, caso resolva disputar algum cargo eletivo. Por ora, o que resta é acompanhar os próximos capítulos: o governo sinaliza disposição para recuar na questão do risco sacado, mas o embate continua. E, como já sabemos, Brasília nunca desperdiça uma boa crise sem torná-la ainda maior.
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· 01:49 — Boa repercussão
Nos EUA, o mercado inteiro tinha um único foco nesta quarta-feira: Nvidia. Nem mesmo a ata do FOMC – que reafirmou a abordagem cautelosa do Fed, de esperar para ver – conseguiu desviar a atenção dos investidores. A expectativa era tamanha que, mesmo com os resultados só sendo divulgados após o fechamento, a movimentação ao longo do pregão foi toda guiada pela ansiedade com o balanço da gigante dos chips. No fim, a Nvidia não decepcionou. Pelo contrário: entregou números que podem muito bem servir como novo combustível para um rali nesta quinta-feira.
O otimismo segue ancorado também nas palavras de Jensen Huang, CEO da companhia, que manteve seu entusiasmo com o futuro da inteligência artificial. Seu discurso segue sendo música para os ouvidos de investidores que veem na Nvidia o grande símbolo da nova revolução tecnológica. A depender da reação do mercado, os bons ventos da Nvidia podem ofuscar até a leitura revisada do PIB americano do primeiro trimestre, divulgada nesta manhã. Na sequência, a temporada de balanços continua com empresas relevantes como Best Buy, Costco, Dell, Gap e Marvell.
· 02:34 — Bloqueado
O Tribunal de Comércio Internacional dos EUA decidiu barrar uma das bandeiras mais barulhentas da era Trump: as tarifas generalizadas impostas com base na Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA), de 1977. Na prática, o tribunal considerou que o presidente excedeu sua autoridade ao usar uma legislação emergencial para taxar amplamente importações de países com superávit comercial frente aos EUA — o que ficou conhecido como o “Dia da Libertação Tarifária”. O julgamento, portanto, desmonta uma parte central da estratégia protecionista de Trump, ao impedir a aplicação de tarifas amplas sob essa justificativa emergencial.
Apesar disso, a decisão deixa intactas as tarifas setoriais — como as que atingem alumínio, aço e automóveis — amparadas em uma outra legislação, a de segurança nacional. Ou seja, o impacto jurídico é significativo, mas está longe de ser um xeque-mate na guerra comercial. O governo ainda possui outras cartas na manga: pode, por exemplo, impor tarifas específicas por país ou produto. Além disso, o presidente Trump, fiel ao seu estilo combativo, já notificou que pretende recorrer da decisão, o que deve empurrar o assunto para o colo da Suprema Corte.
Do ponto de vista de mercado, a decisão funciona como um alívio — ainda que temporário — e já começa a mudar o humor dos investidores. Depois de um período de aversão a ativos americanos, causado pela incerteza tarifária e por planos fiscais pouco ortodoxos, a reversão parcial das medidas encoraja quem andava na defensiva. A mensagem que fica é clara: mesmo em tempos de populismo comercial, há limites institucionais. Por ora, os mercados comemoram. Mas como tudo na política americana recente, essa vitória judicial pode ser apenas o primeiro capítulo de uma nova batalha.
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· 03:28 — First buddy
A breve e barulhenta incursão de Elon Musk na política de Washington parece estar chegando ao fim. O bilionário anunciou que seu papel como conselheiro formal do presidente Donald Trump está se encerrando, levantando dúvidas sobre a continuidade do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), iniciativa que ele próprio liderava com a ambição de reformar a burocracia federal. O timing da saída não é coincidência. Musk resolveu lavar roupa suja em público logo após criticar duramente a principal aposta legislativa de Trump: o ambicioso pacote de corte de impostos.
Para ele, o projeto não só falha em conter os déficits fiscais, como já comentamos aqui, como também mina os esforços do próprio DOGE. Em outras palavras, Musk sentiu que estava enxugando gelo enquanto o governo seguia expandindo o rombo orçamentário com pompa populista. A decepção é evidente. O tombo de expectativa talvez diga mais sobre Musk do que sobre Trump: acreditar que seria possível implementar uma reforma estrutural e técnica em uma administração notoriamente movida por impulsos populistas sempre pareceu, no mínimo, excessivamente otimista.
A verdade é que a passagem dele por Washington terminou sendo mais simbólica e, no fim das contas, inconclusiva. A tentativa de transformar o governo americano em uma startup de alta eficiência esbarrou, como era de se esperar, na realidade da política — e na ausência de prioridades fiscais consistentes dentro do próprio governo.
· 04:12 — Alguns pontos sobre o petróleo
O petróleo amanhece em alta, impulsionado por uma conjunção de fatores que misturam alívio tarifário e tensões geopolíticas. O pano de fundo mais imediato é a decisão do Tribunal de Comércio Internacional dos EUA, que bloqueou a maior parte das tarifas impostas por Trump. Ao mesmo tempo, os investidores acompanham de perto a possibilidade de novas sanções contra a Rússia, o que pode restringir ainda mais a oferta. Não bastasse, a Opep+ anunciou uma decisão ambígua: vai ampliar a produção em julho, numa tentativa de defender sua fatia de mercado, mas manterá o nível de produção estável até 2026. O cartel tenta se equilibrar entre o instinto de proteção e a necessidade de adaptação diante das novas dinâmicas do mercado.
Enquanto isso, um movimento corporativo de peso reacende o debate sobre o futuro das grandes petrolíferas na Europa: a ExxonMobil acaba de bater o martelo em sua saída da França. Em um acordo exclusivo com a North Atlantic France SAS, a gigante americana venderá sua fatia de 82,89% na Esso SAF, um nome histórico no refino e distribuição de combustíveis no país. O valor total da transação gira em torno de € 400 milhões e inclui ativos estratégicos como a Refinaria de Gravenchon (uma das maiores da França) além de sua rede de distribuição e produtos petrolíferos.
A decisão marca mais um passo no recuo da petroleira americana do continente europeu, após o encerramento de operações petroquímicas em solo francês em 2023. A leitura mais ampla é inequívoca: a Europa está se tornando cada vez menos hospitaleira para as grandes majors do petróleo, empurrando-as para fora com uma combinação de regulação ambiental, custos elevados e um ambiente político hostil.
· 05:01 — Belos números
A performance da Nvidia segue impressionando — e muito — mesmo diante de um cenário geopolítico hostil e restrições severas às exportações para a China, um de seus mercados historicamente mais relevantes. Ontem, a gigante dos semicondutores apresentou mais um trimestre de resultados exuberantes: lucro de US$ 18,8 bilhões, alta de 26% em relação ao ano anterior, e receita de US$ 44,1 bilhões, um avanço expressivo de 69%. Desde que recomendei as ações, em fevereiro do ano passado, os papéis já acumulam uma valorização de cerca de 70% em dólares. Ainda assim, é legítimo perguntar: depois de tanta alta, ainda vale manter?