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O Simpósio de Jackson Hole começa hoje (21), mas a verdadeira atenção dos mercados recai sobre o aguardado discurso de Jerome Powell amanhã. O pano de fundo é um ambiente carregado de expectativas em torno do ciclo de cortes de juros, após a ata mais recente do Federal Reserve ter exposto divisões internas no comitê: de um lado, dirigentes preocupados com a resiliência da inflação; de outro, vozes que destacam os riscos de enfraquecimento da atividade. Nesse contexto, os investidores mantêm apostas elevadas em um corte já em setembro, com probabilidade superior a 80%. A equação, no entanto, ganhou novas variáveis: a pressão explícita do presidente Trump sobre a instituição e as recentes mudanças na composição do comitê aumentam as dúvidas sobre a independência do Fed — elemento fundamental para a credibilidade do dólar como moeda de reserva global. Diante disso, as bolsas americanas passam por um movimento de rotação setorial, com saída de tecnologia em direção a setores mais defensivos, num ajuste cauteloso típico de momentos de transição monetária.
No exterior, o cenário também se mostra fragmentado. As bolsas asiáticas exibiram desempenho misto, mas Xangai ganhou destaque ao atingir o maior nível em uma década, impulsionada pelo avanço das fintechs e por uma trégua momentânea na guerra comercial. Na Europa, ao contrário, os índices recuam em compasso de espera pelo simpósio, apesar da surpresa positiva com o PMI industrial da Zona do Euro, que voltou à expansão após mais de três anos de contração.
O discurso de Powell ganha ainda mais peso por ser o último de sua gestão à frente do Fed em Jackson Hole, transformando-se, assim, em uma espécie de testamento de política monetária. Enquanto isso, investidores aguardam também a divulgação dos pedidos de auxílio-desemprego nos EUA, que podem reforçar ou enfraquecer a tese de flexibilização já no curto prazo. Nos mercados de commodities, o petróleo avança sustentado pela combinação de sinais de demanda robusta nos EUA e incertezas geopolíticas persistentes, complementando o quadro de volatilidade dos ativos globais.
· 00:53 — Em meio às turbulências políticas, o problema fiscal permanece
No Brasil, o Ibovespa encontrou ontem algum espaço para recuperação após a queda do pregão anterior, encerrando o dia em alta, enquanto o dólar recuou 0,48%, retornando ao patamar de R$ 5,47 após ter testado R$ 5,50. A tensão diplomática com os EUA segue no radar, mas, no curto prazo, abriu margem para uma trégua no mercado. No campo político, as atenções se voltaram para a pesquisa Genial/Quaest divulgada nesta manhã, que apontou Lula à frente em todos os cenários para 2026, confirmando a melhora já captada no levantamento anterior sobre a avaliação do governo. Embora ainda faltem mais de 12 meses para o pleito, a estratégia de reforçar o discurso de soberania nacional, somada ao tradicional enquadramento de “nós contra eles”, mostrou-se eficaz na mobilização da base, rendendo dividendos políticos imediatos. No entanto, tais ganhos tendem a ser limitados: a vitória em 2026 dependerá essencialmente da conquista do eleitorado de centro — o verdadeiro fiel da balança em disputas presidenciais —, algo difícil de alcançar apenas com retórica polarizadora ou sem uma solução para o impasse diplomático com Washington, especialmente quando outros players globais avançam em negociações paralelas.
No ambiente doméstico, o Planalto enfrentou novos obstáculos. A instalação da CPMI do INSS foi dominada pela oposição — um revés que promete desgastar o governo nos próximos meses. No campo fiscal, as dificuldades também se acumulam: a PEC dos Precatórios foi retirada de pauta diante do risco de derrota em destaques que poderiam reduzir em R$ 12 bilhões o espaço fiscal, e as negociações para excluir R$ 9,5 bilhões do pacote de socorro ao tarifaço seguem travadas. A arrecadação federal de julho, estimada em R$ 252,5 bilhões (alta de 3,8% em relação ao mesmo mês de 2024), traz algum alívio conjuntural, mas não altera a fragilidade estrutural das contas públicas, ainda pressionadas pelo déficit externo e pela saída sazonal de capitais típica do fim do ano. Em audiência no Senado, a ministra Simone Tebet reconheceu que um corte linear de R$ 20 bilhões não seria suficiente, já que o ajuste necessário chega a R$ 31,9 bilhões para enquadrar os gastos tributários no teto de 2% do PIB até 2029.
Apesar disso, o governo insiste em celebrar uma trajetória de superávit primário que soa mais cosmética do que sustentável, enquanto a fatura de 2027 — quando será necessário um ajuste fiscal mais robusto — continua crescendo. A proposta de isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, ainda que haja mérito no debate do ponto de vista técnico, acrescenta mais incertezas às negociações do Orçamento de 2026, cuja meta de superávit de 0,25% do PIB, por ora, segue mantida. Nesse intervalo, o déficit nominal permanece orbitando em torno de 8% do PIB, reforçando a urgência de um debate sério sobre reformas e disciplina fiscal no processo eleitoral. Dentro desse tabuleiro político, a recém-criada federação UP, com 109 deputados e 14 senadores, tende a embaralhar a articulação do PT com o centro, elevando a complexidade do cenário para 2026. Já no campo da oposição, embora ainda não haja um nome consolidado, os novos vazamentos envolvendo Jair e Eduardo Bolsonaro aceleram a transição interna e podem abrir espaço para uma candidatura mais competitiva, menos rejeitada e com discurso reformista mais consistente — possivelmente oriunda de governadores que se consolidam como alternativas viáveis ao atual governo.
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· 01:42 — Na expectativa
Os mercados americanos seguem em compasso de cautela diante da expectativa pelo simpósio de Jackson Hole. Ontem, o Nasdaq e o S&P 500 recuaram, enquanto o Dow Jones encerrou praticamente estável. A pressão veio, sobretudo, das chamadas “Sete Magníficas”, que registraram queda pelo segundo pregão consecutivo. O movimento refletiu a mudança na política industrial dos Estados Unidos, após o governo Trump anunciar planos de adquirir participação em companhias estratégicas, como a Intel. A medida reacendeu debates sobre intervenção estatal em um setor já sensível às oscilações de expectativas ligadas à inteligência artificial. Não é um bom sinal…
Apesar desse ambiente de maior prudência, o tom de aversão ao risco segue contido. O S&P 500 permanece apenas 1% abaixo das máximas históricas, e a volatilidade segue em níveis reduzidos, mesmo após uma valorização expressiva de cerca de 30% desde abril. O movimento de rotação em direção a small caps e ações de valor indica alguma perda de fôlego das grandes empresas de tecnologia, mas ainda não configura uma reversão estrutural da tendência. No curto prazo, além das atenções voltadas a Jackson Hole, investidores acompanham indicadores importantes: os pedidos semanais de auxílio-desemprego — com destaque para os números contínuos, considerados um termômetro mais fiel do mercado de trabalho —, os PMIs de agosto e as vendas de imóveis usados, que se aproximam dos níveis mais baixos desde 2008.
No front corporativo, a temporada de balanços ainda promete trazer volatilidade adicional. Companhias como Ross Stores, Walmart e Zoom divulgam resultados, fornecendo pistas relevantes sobre o comportamento do consumo e sobre a resiliência dos diferentes segmentos da economia americana em meio ao cenário atual.
· 02:33 — Nova pressão no Fed
Nesse ambiente, o discurso de Jerome Powell em Jackson Hole ganha peso adicional. Não seria a primeira vez que as declarações do presidente do Federal Reserve nesse palco serviriam como gatilho para movimentos significativos nos mercados. A ata da reunião de julho mostrou que quase todos os dirigentes apoiaram a manutenção dos juros, com apenas dois votos dissidentes a favor de cortes — o maior número de divergências registrado desde 1993. O documento evidenciou que, naquele momento, a maioria do comitê ainda via a inflação como risco mais premente do que um enfraquecimento do mercado de trabalho (o documento é sobre uma reunião em julho). Essa percepção, no entanto, pode ter se alterado diante da sequência de dados mais fracos de emprego divulgados logo após a reunião, adicionando incerteza ao cenário.
Esse pano de fundo é politicamente delicado. O presidente Trump tem intensificado a pressão pública por cortes de juros, levantando questionamentos sobre a independência do banco central. A tensão ficou ainda mais evidente às vésperas do simpósio, quando Trump pediu a renúncia da governadora Lisa Cook — nomeada por Biden e acusada de fraude hipotecária. Cook negou as acusações, reafirmou que não pretende deixar o cargo e destacou que seu mandato vai até 2038. O episódio soma-se à ofensiva de Trump para remodelar o Fed com nomes mais alinhados à sua agenda de crescimento acelerado e juros mais baixos, estratégia que já havia levado à saída de Adriana Kugler. Essa disputa explicita não apenas o choque entre a Casa Branca e a autoridade monetária, mas também os riscos à credibilidade e à independência do Fed — fatores centrais para a confiança global no dólar como moeda de reserva.
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· 03:24 — O Simpósio de Jackson Hole
Além do Federal Reserve, autoridades monetárias da Europa e do Reino Unido também marcam presença no simpósio de Jackson Hole desta semana, em meio à escalada das tensões entre Donald Trump e Jerome Powell. O presidente americano tem intensificado sua pressão sobre o Fed, exigindo cortes de juros, atacando Powell de forma recorrente e prometendo substituí-lo no próximo ano por alguém mais alinhado à sua agenda política e econômica. Esse embate coloca em evidência um tema crucial para os mercados: o risco de ingerência política sobre instituições que, por definição, deveriam preservar sua independência. Não por acaso, nomes como Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE), e Andrew Bailey, do Banco da Inglaterra, devem aproveitar o encontro para reforçar publicamente a importância da autonomia dos bancos centrais, lembrando que qualquer erosão dessa independência compromete a credibilidade das políticas monetárias e, em última instância, a estabilidade econômica global. O presidente do Bundesbank, Joachim Nagel, foi direto ao ponto ao afirmar que a independência faz parte do “DNA dos bancos centrais” — e precisa ser preservada sem concessões. É fundamental.
Aliás, na Europa, Christine Lagarde acrescentou que a economia da zona do euro deve registrar um crescimento mais fraco neste trimestre, em meio a um cenário de incertezas comerciais. Ainda assim, avaliou que as tarifas de 15% impostas pelos Estados Unidos ficaram aquém do pior cenário inicialmente projetado pelo BCE, o que oferece algum alívio. Foi também sua primeira manifestação pública após o anúncio do novo acordo comercial firmado entre União Europeia e EUA, um marco que, por si só, já reposiciona parte da dinâmica global. Assim, o pano de fundo em Jackson Hole tende a ser moldado não apenas pelo debate em torno da política monetária, mas também pela intersecção entre geopolítica, protecionismo e credibilidade institucional — ingredientes que ampliam a complexidade do ambiente econômico internacional.
· 04:16 — Atenção na Índia
O bilionário Mukesh Ambani, homem mais rico da Índia e controlador da gigante Reliance, passou a ser alvo indireto dentro da crescente tensão comercial entre Índia e Estados Unidos. Embora as críticas de Donald Trump tenham se concentrado nas importações indianas de petróleo russo, assessores do governo americano foram além e acusaram magnatas locais de lucrar com a guerra — e Ambani, cuja companhia é hoje a maior compradora individual de petróleo russo no país, acabou colocado no epicentro da controvérsia. O impacto, contudo, vai além de sua imagem pessoal: figuras como Ambani são pilares fundamentais do projeto econômico do primeiro-ministro Narendra Modi, com quem mantêm uma relação quase simbiótica. Amparados por políticas que protegeram setores estratégicos como telecomunicações e varejo, esses conglomerados prosperaram, mas agora se veem expostos à ofensiva americana, que mira diretamente os alicerces desse modelo de crescimento.
Em paralelo, a Índia busca alternativas estratégicas para lidar com a deterioração nas relações com Washington. No campo diplomático, um gesto simbólico e relevante veio à tona: após anos de atritos, Índia e China anunciaram a intenção de avançar na demarcação de sua disputada fronteira, numa tentativa de reduzir tensões históricas e abrir espaço para maior cooperação em comércio e turismo. O anúncio ocorreu durante a visita do chanceler chinês Wang Yi a Nova Déli — a primeira em três anos — e antecede a esperada participação de Narendra Modi em uma cúpula regional na China. Pequim, por sua vez, mostrou habilidade em equilibrar suas alianças: além de estreitar laços com a Índia, incluiu no itinerário uma visita ao Paquistão, parceiro histórico e peça central de sua estratégia regional, sinalizando que pretende ampliar influência sem abrir mão de antigos compromissos.
· 05:05 — Alguns outros destaques
Com o encerramento da temporada de resultados do 2T25 no Brasil, o balanço trouxe surpresas positivas, mesmo em meio a um ambiente desafiador de juros elevados, que naturalmente limita o espaço para grandes destaques. Como já destaquei neste espaço, muitas empresas conseguiram entregar números consistentes e até superar projeções, evidenciando eficiência operacional acima da média.
Excluindo Petrobras e Vale, os resultados consolidados reforçam esse cenário: receitas cresceram 8% em 12 meses, o EBITDA avançou 5,4% e o lucro líquido saltou 17%. O ponto de destaque veio das companhias mais expostas à demanda interna, que mostraram resiliência frente à Selic ainda elevada, reiterando que as empresas brasileiras seguem encontrando caminhos para crescer mesmo diante de obstáculos relevantes.
A SLC Agrícola (SLCE3) apresentou…