Você já deve ter se deparado com manchetes que trazem dados um tanto quanto confusos, ou então já ouviu que existe “X% de chance de o tipo de pessoa Y desenvolver a doença Z”, mas, na prática, quantas pessoas em número absoluto desenvolveram a enfermidade?
Se pararmos para pensar, somos expostos a informações sobre riscos o tempo todo, mas não somos “alfabetizados” o suficiente para compreendê-los totalmente. Na prática, isso torna nossa vida bem mais complicada, já que muitas situações ruins poderiam ser evitadas se aprendêssemos desde pequenos, por exemplo, como funcionam os juros do cartão de crédito, quais hábitos de vida podem levar a doenças mais complicadas ou mesmo quais as consequências de sermos controlados pelas mídias sociais.
Esta reflexão é o mote central de “Preparados para o risco: como tomar boas decisões”, de Gerd Gigerenzer. Uma leitura fundamental para entendermos melhor a estrutura por trás das escolhas que fazemos ‒ ou que somos levados a fazer.
Como não se deixar manipular pelo medo e por esperanças irreais
Ao longo do livro, nos deparamos com analogias muito interessantes que buscam explicar a relação psicológica que o ser humano estabelece com os riscos em diversos segmentos da vida. É impossível não se identificar com os exemplos da área da saúde, de finanças, de desastres naturais e até profissionais.
O autor tem propriedade nessa temática: Gigerenzer é um psicólogo alemão e professor universitário que estudou o uso da racionalidade e da intuição na tomada de decisões.
Diferente de outro famoso estudioso do comportamento, Daniel Kahneman (autor de “Rápido e Devagar”), Gigerenzer acredita no poder da intuição para se fazer escolhas. Ele afirma que o ambiente em que se está exposto tem que ser levado em consideração, já que há diferenças entre tomar uma decisão em um cenário de riscos conhecidos e em um contexto de incertezas.
O autor também busca desvendar quais aspectos do próprio meio social nos levam a identificar esses “perigos” ainda com tanta ineficiência e defende que há dois impasses principais: as certezas ilusórias que carregamos ao longo da vida e a forma nebulosa com que os riscos nos são comunicados (seja na mídia, no consultório médico ou num escritório de advocacia).
No fim das contas, essa incapacidade torna-se um ciclo vicioso, porque, se não aprendemos a lidar com riscos nem na época escolar, dificilmente seríamos adultos super capacitados para informá-los da melhor maneira aos outros.
O livro traz dicas práticas para evitarmos ser manipulados pelo medo e por esperanças irreais. Podemos nos basear em regras simples nas tomadas de decisão, como:
- Considerar números absolutos em vez de porcentagens;
- Nos apropriar melhor das fontes de informação para não delegarmos escolhas importantes 100% a terceiros;
- Apostar mais na nossa própria intuição.
E se ensinássemos sobre os riscos durante a fase da alfabetização?
Ao final da obra, o autor aponta três tipos de matérias que poderiam ser inseridas no ensino básico e resolver boa parte dos nossos problemas práticos. Ele reforça a importância de termos espaço, ainda na infância, para desenvolver habilidades como pensamento estatístico, regras simples e psicologia do risco.
O resultado dessa reestruturação? Segundo o autor, uma sociedade com cidadãos mais amadurecidos, habituados a fazer questionamentos e a assumir a responsabilidade por suas decisões.
“A fim de chegar lá, precisamos começar bem antes da universidade. Mesmo crianças pequenas podem aprender a compreender riscos e probabilidades quando ensinados de forma lúdica. A alfabetização em risco logo nos primeiros estágios da educação será de grande auxílio para a nova geração poder lidar com as incertezas da vida.” ‒ Trecho de “Preparados para o risco”
Resenha escrita por Priscila Vieira.