Imagem: iStock/ MicroStockHub
Final de ano sempre foi uma oportunidade para rever o que aconteceu no ano e prever o que pode acontecer no ano seguinte. Há um certo artificialismo nesse exercício – afinal, rever o passado recente para formular cenários é um exercício contínuo de qualquer estratégia de investimentos – mas fazer isso é uma tradição, e o fato que muitas casas apresentam seus “outlooks” nos permite julgar qual o conjunto de expectativas que o mercado está expressando e precificando sobre o ano novo.
O ano de 2025 passou por vários momentos. Começou com grandes expectativas sobre o novo governo Trump nos EUA, seguido do choque do “Liberation Day” em abril que, para alguns, apontava para a desgraça da estagflação. Mas, dado o pragmatismo de Trump e os conselhos sábios de Scott Bessent, fomos todos salvos pelo “TACO Trade”. Aí passamos o resto do ano discutindo e se preocupando com uma suposta bolha especulativa no mercado acionário devido a temática da inteligência artificial (IA), um debate que ainda persiste. Enquanto isso, o Fed voltou a cortar os juros devido a um preocupante enfraquecimento no mercado de trabalho; a China chegou à marca histórica de US$1 trilhão no seu superávit comercial apesar da guerra comercial com os EUA; e depois de anos de desempenho inferior ao das bolsas de países emergentes – inclusive do Brasil – performaram melhor que as bolsas americanas (levando em conta o efeito cambial com o dólar caindo globalmente).
A visão do mercado para 2026 é, no todo, bastante otimista. Analistas estão vendo vários fatores puxando o crescimento. Primeiro, expansão fiscal – nos EUA os efeitos pró-investimentos do orçamento aprovado por Trump; na Europa um aumento de gastos para rearmamento; e no Japão um novo governo mais populista. Vários bancos centrais têm cortado os juros em 2025, e os efeitos disso devem apoiar o crescimento em 2026. E, apesar das discussões sobre uma bolha, os investimentos em IA devem continuar fortes no ano que vem. O UBS, por exemplo, está projetando um crescimento global de 3,3% em 2026 versus 2,9% em 2025.
Um efeito negativo de toda essa gastança é a perspectiva de que, apesar do corte nas taxas da política monetária, os juros de longo prazo devem permanecer relativamente elevados. Um dos fatores que contribuem para essa dinâmica nos EUA é a queda da demanda por Treasuries por parte dos bancos centrais. O JP Morgan estima que, pela primeira vez desde 1997, investidores “sensíveis ao preço” – já que bancos centrais não têm a restrição de mostrar lucro – respondem por mais de metade do mercado de Treasuries. Contrabalanceando esse movimento está a volta do Fed ao mercado, anunciada em sua última reunião, com compras de US$ 40 bilhões de títulos de curto prazo por mês. Não por acaso, o Tesouro americano já anunciou que vai aumentar a participação das emissões de papéis curtos. Essa volta de injeção de liquidez pelo Fed vai ser outro vetor de apoio aos mercados no ano novo.
Na questão da inflação, a visão consensual é que o choque tarifário não deve ter um efeito permanente na dinâmica inflacionária em um ambiente de demanda e mercado de trabalho fraco. Assim, muitas das projeções são de um primeiro trimestre ainda pressionado, mas com a inflação cedendo a partir de então, permitindo alguns cortes adicionais por parte do Fed.
Sobre a tendência do dólar americano nos mercados internacionais, parece que há menos consenso. Para alguns, a relativa atratividade dos EUA devido a sua liderança na IA deve manter o interesse de investidores globais nos seus mercados. Para outros, o dólar continua relativamente caro apesar da correção que ocorreu neste ano, e que as preocupações com uma possível bolha na bolsa americana e a política errática do governo Trump devem continuar a tendência de diversificação fora dos EUA no novo ano.
Uma temática importante é a forte divergência entre alguns setores da economia e dos mercados. Enquanto investimentos ligados à IA crescem rapidamente, o efeito riqueza nas bolsas suportam os gastos das famílias de alta renda. Com o mercado de trabalho enfraquecendo, o consumo das famílias menos abastadas cai, com esse segmento também sentindo a alta da inflação devido às tarifas de Trump (algo que está cobrando um preço pesado na sua popularidade). Essa seria a “economia K”, apontando tanto para baixo quanto para acima.
Essa economia de opostos implica uma instabilidade potencial e falta de robustez do ciclo econômico. De um lado, se a parte forte puxar a fraca, podemos ver um resultado inflacionário pior do que o esperado. Do outro, se o lado forte desapontar, podemos cair rapidamente em uma recessão. A saúde da economia americana está hoje fortemente ligada ao nível da bolsa, que por sua vez está dependente no valor de sete empresas, todas apostando na mesma coisa: a IA.
Assim acabamos voltando à IA. Para os otimistas, já veremos os primeiros sinais de difusão da tecnologia para o resto da economia em 2026, elevando a produtividade e justificando os vultosos investimentos dos últimos anos. Para os pessimistas, essa difusão deve ser bem mais demorada, o que vai levar a uma queda nos investimentos e à implosão nas ricas precificações das empresas do setor. Neste momento, os mercados e as expectativas estão apostando no cenário otimistas. Assim, em 2026, o grande risco será a possibilidade de o cenário pessimista se realizar.
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