Investimentos

Canadá consegue trégua das ‘tarifas recíprocas’ dos EUA; no Brasil, investidores ficam atentos a dados econômicos nesta segunda-feira (30) – veja destaques

Com o feriado norte-americano de 4 de julho, a semana será encurtada nos mercados estrangeiros.

Por Matheus Spiess

30 jun 2025, 09:47 - atualizado em 17 jul 2025, 16:03

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Imagem: iStock/ Hankimage9

A semana nos mercados estrangeiros será encurtada pelo feriado de 4 de julho, o Dia da Independência dos Estados Unidos, que paralisa as negociações por lá e reduz significativamente a liquidez global na sexta-feira — embora o pregão siga normalmente no Brasil, o ritmo tende a ser morno. Antes disso, no entanto, o cenário internacional ainda reserva pontos de atenção.

Um deles é o tradicional fórum do BCE em Sintra, que reúne banqueiros centrais do mundo todo e pode render declarações relevantes sobre o rumo das políticas monetárias. Também há expectativa em torno de possíveis atualizações na frente comercial, já que nos aproximamos do fim da trégua das chamadas “tarifas recíprocas“. Se houver bom senso na Casa Branca, esse armistício será renovado — afinal, pouco ou nada se ganhou com a ameaça tarifária de abril, e voltar àquele tipo de escalada agora seria mais insensatez do que estratégia.

Na quinta-feira (3), os olhos se voltam para a divulgação do payroll americano, antecipado em função do feriado. Os dados de emprego devem ajudar a calibrar expectativas em relação à trajetória dos juros nos EUA. Com o Oriente Médio relativamente estabilizado — mesmo que apenas temporariamente —, as teses centrais do primeiro semestre voltam a ganhar protagonismo, incluindo a tendência de enfraquecimento do dólar no cenário global. Infelizmente, o Brasil não tem conseguido capitalizar mais recentemente esse movimento externo, graças a um conjunto de fragilidades domésticas, com destaque para o impasse fiscal.

A mais recente demonstração de desorientação veio com o governo optando por judicializar a disputa em torno do IOF — uma escolha que reforça a percepção de fraqueza política. Nesta manhã, as bolsas europeias operam sem direção clara, em meio à expectativa pelo desfecho das tarifas. O mesmo valeu para os mercados asiáticos, que até chegaram a reagir positivamente a um PMI melhor vindo da China, mas sem força suficiente para mudar o humor da sessão.

· 00:52 — Indisposição política

No cenário doméstico, a agenda desta segunda-feira (30) traz novos dados fiscais e atualizações sobre o mercado de trabalho, que segue desafiando expectativas: a taxa de desemprego recuou mais do que o projetado, reforçando a resiliência do emprego formal. Ainda assim, os sinais de perda de tração na atividade econômica são crescentes — e, na quarta-feira (2 de julho), a divulgação da produção industrial de maio pode reforçar essa percepção. Caso os próximos indicadores de atividade e trabalho confirmem esse enfraquecimento, ganha força a tese de que o atual patamar extremamente restritivo de juros não precisaria ser sustentado por tanto tempo. O entrave, contudo, não é apenas técnico: uma parte relevante da insistência em manter os juros nas alturas reside na completa falta de compromisso fiscal do governo federal.

E, nesse aspecto, o quadro está longe de ser pacificado. Na última sexta-feira (27), alertei: se o governo prezasse por alguma racionalidade, evitaria um confronto desnecessário com o Congresso e recuaria da ideia de judicializar a briga em torno do decreto do IOF. Mas a sensatez não parece ser um ativo disponível no atual governo. Lula, visivelmente irritado com a atuação do Congresso, sinaliza disposição para o confronto. O problema é que o Executivo já chega a essa disputa fragilizado, politicamente combalido, e agora arrisca aprofundar ainda mais seu isolamento. O desgaste não se limita ao cenário interno: no plano internacional, o governo também coleciona críticas. Em editorial do final de semana, a revista The Economist ironiza a obsessão do presidente brasileiro com temas como a Ucrânia e o Oriente Médio, apontando que o mundo não está interessado em sua mediação — ao passo que ele se mantém ausente onde poderia exercer influência regional, como na Venezuela e na Nicarágua.

Essa tentativa de protagonismo, deslocada da realidade e ignorada pelos interlocutores internacionais, tem custado caro ao capital político de Lula — que, ao insistir em atuar onde não é chamado, termina por negligenciar sua própria governabilidade em casa. A derrota acachapante sofrida com a aprovação do decreto legislativo contra o governo — a primeira do tipo desde os tempos de Collor, em 1992 — foi um marco relevante da fragilidade do Planalto. Agora, as atenções se voltam para o próximo relatório bimestral de receitas e despesas primárias, previsto para 22 de julho. Com uma contenção de R$ 30 bilhões já anunciada e a expectativa de bloqueio e contingenciamento adicional de R$ 12 bilhões, o governo terá de tomar decisões difíceis. Os instrumentos para aumento de arrecadação são limitados e o espaço para erro fiscal, inexistente.

A situação revela uma vulnerabilidade institucional crescente: a escalada da tensão com o Congresso fragiliza a articulação da base governista em um momento politicamente decisivo. À medida que se aproxima o calendário eleitoral, cresce a percepção de que o pêndulo político pode estar prestes a migrar — e com ele, a correlação de forças no país. O problema é que, até lá, o percurso promete ser conturbado, com riscos fiscais elevados, um Executivo isolado e uma base parlamentar cada vez mais indócil. A soma desses fatores não apenas limita a eficácia da política econômica como mina a confiança em qualquer tentativa de retomada consistente.

· 01:41 — Qual o foco?

Nos Estados Unidos, os mercados encerraram a sexta-feira em alta, com uma recuperação no final do pregão que levou os principais índices a novos recordes históricos. O S&P 500 e o Nasdaq cravaram máximas, sustentados por um sentimento de otimismo renovado — ainda que com fundamentos que merecem cautela. Desde as mínimas observadas em 8 de abril, provocadas pelas tensões comerciais e o temor de novas tarifas, o S&P 500 já acumula alta de 24%. No ano, a valorização chega a 5%. O problema? A exuberância recente voltou a inflacionar os múltiplos. O índice agora é negociado a 22 vezes os lucros projetados, contra 18 vezes há menos de três meses. Um salto de quatro pontos no P/L em tão pouco tempo não é comum — e, historicamente, carrega consigo uma certa dose de euforia mal precificada.

Por outro lado, os ventos macro continuam soprando a favor dos ativos de risco. As apostas em cortes de juros ainda este ano ganham força, especialmente diante da possibilidade de desaceleração gradual do mercado de trabalho. E há, adicionalmente, um fator político com potencial de impulsionar ainda mais o apetite por risco: a expectativa de aprovação, até o feriado de 4 de julho, do megaprojeto legislativo de estímulo proposto pelo governo Trump. Os republicanos no Senado articulam uma votação ainda nesta semana, com o objetivo de entregar à Casa Branca um presente no Dia da Independência. Se aprovado, o pacote pode reforçar o ímpeto dos mercados. Antes disso, os dados de emprego que serão divulgados ao longo da semana ganham centralidade: números mais fracos reforçariam a tese de afrouxamento monetário, o que, paradoxalmente, pode ser bem recebido pelas bolsas. Afinal, em Wall Street, más notícias econômicas nem sempre são más para os preços dos ativos.

· 02:39 — As tarifas

Na última sexta-feira, o mercado foi surpreendido por mais um movimento abrupto da diplomacia comercial americana: Donald Trump anunciou, pelas redes sociais, o encerramento imediato das negociações comerciais com o Canadá. Segundo o presidente, os Estados Unidos deixariam de discutir qualquer acordo com o vizinho do norte e, em retaliação, estabeleceriam novas tarifas sobre produtos canadenses. O motivo? Um imposto sobre serviços digitais aprovado pelo governo canadense — nos moldes do que já incomoda as gigantes da tecnologia na Europa — teria desagradado os executivos do Vale do Silício, levando Trump a reagir de forma explosiva.

A resposta de Ottawa veio com rapidez: o governo canadense revogou a taxação sobre serviços digitais, que passaria a valer oficialmente hoje. A medida, originalmente adotada ainda sob a gestão de Justin Trudeau, foi suspensa na tentativa de conter a escalada e resgatar as negociações com Washington. Trata-se de um gesto diplomático significativo, considerando que o Canadá, além de ser um dos mais antigos aliados dos EUA, é também um dos seus maiores parceiros comerciais. Mesmo assim, a relação bilateral está visivelmente mais tensa, especialmente após a recente onda de tarifas americanas que reacendeu fricções no cenário norte-americano.

Apesar do tom de Trump, há espaço para uma interpretação para os demais países. A depender da condução nos próximos dias, o desfecho pode acabar sendo positivo, com a possível extensão da trégua nas tarifas recíprocas, que expira no dia 9 de julho. Ninguém tem interesse real em ressuscitar a guerra comercial de abril, que se mostrou ineficaz e desgastante. Se o bom senso — ainda que escasso — prevalecer, os EUA devem manter as portas abertas para negociações com os demais parceiros.

· 03:25 — A visão chinesa para o Irã

Com a manutenção do cessar-fogo entre Israel e Irã, o foco geopolítico começa a se deslocar para um jogo mais amplo: o impacto desse conflito sobre a China e o equilíbrio de poder entre Washington e Pequim. Nos últimos anos, o presidente Xi Jinping aprofundou os laços com Teerã, acolhendo o Irã tanto na Organização de Cooperação de Xangai, em 2023, quanto no bloco dos BRICS. O objetivo é fortalecer alianças alternativas que desafiem a arquitetura de poder global ainda americana.

Como maior importadora líquida de petróleo do mundo, e com envolvimento econômico crescente no Oriente Médio, a China tem muito em jogo na região. O conflito oferece a Xi uma oportunidade: a de se posicionar como um agente de estabilidade e moderação — uma alternativa frente ao estilo errático do governo Trump. Pequim deve explorar esse episódio como mais uma peça em sua narrativa diplomática, apresentando os Estados Unidos como um parceiro global impulsivo, unilateral e, portanto, arriscado.

Na prática, o risco imediato à segurança energética chinesa parece contido. Trump já sinalizou que não irá barrar as compras de petróleo iraniano por parte de Pequim, mesmo sob as sanções americanas. Considerando que cerca de 14% do petróleo bruto consumido pela China vem diretamente do Irã — e aproximadamente 45% de suas importações passam pelo estratégico Estreito de Ormuz —, a estabilidade da região é vital. E é essa dependência que  esvazia a eterna ameaça iraniana de fechar o estreito: fazê-lo comprometeria não só os interesses ocidentais, mas os da própria China.

No curto prazo, o cenário favorece Pequim. A continuidade do fluxo de petróleo está assegurada e a diplomacia chinesa ganha palco para se diferenciar dos EUA. No entanto, a escolha da China por manter-se à margem do conflito — limitando-se a condenar os ataques americanos e israelenses enquanto evita qualquer envolvimento construtivo — pode sair pela culatra. Ao se posicionar como espectadora passiva, Pequim corre o risco de enfraquecer seu apelo como líder alternativa e confiável no cenário global. Afinal, não basta dizer que é diferente de Washington…

· 04:14 — Quem vai comprar?

E por falar em China e EUA, Donald Trump voltou a agitar o noticiário ao afirmar, em entrevista à Fox News no domingo, que encontrou um comprador para o TikTok. Segundo ele, um grupo de pessoas muito ricas estaria disposto a adquirir as operações do popular aplicativo de vídeos nos EUA — solução que atenderia à exigência do Congresso americano, que aprovou no ano passado uma legislação obrigando a venda do TikTok por motivos de segurança nacional. A preocupação central segue sendo o controle da ByteDance, empresa-mãe do app, sediada em Pequim e suspeita de manter laços estreitos com o Partido Comunista Chinês.

O Congresso chegou a estipular um prazo para essa transação até janeiro, mas o cronograma foi sendo adiado sucessivamente. A nova data-limite é 17 de setembro, embora a previsibilidade nesse campo seja, no mínimo, volátil. A venda, no entanto, não depende apenas do apetite dos investidores ocidentais: exige também o sinal verde do governo chinês. E aí está o verdadeiro impasse. Pequim já se manifestou diversas vezes contra a transferência forçada de ativos estratégicos — e prometeu barrar qualquer acordo que interprete como extraterritorialidade disfarçada.

Trump se mostra confiante. Disse acreditar que Pequim acabará cedendo. Para a China, aceitar a venda seria admitir fragilidade diante de uma imposição ocidental — e isso, em meio à disputa por supremacia tecnológica, seria visto internamente como sinal de fraqueza. Do ponto de vista americano, porém, a mensagem é clara e correta: empresas estrangeiras que operam em setores sensíveis nos EUA devem estar sujeitas às leis, às instituições e à lógica de segurança nacional americana — não à ambiguidade jurídica de regimes autoritários. Neste embate, não se trata apenas de um aplicativo, mas de qual modelo de sociedade prevalecerá na era digital. 

· 05:08 — Corrida!

Como comentei na semana passada, depois de anos sendo coadjuvante nas grandes narrativas globais de investimento, a Europa começa a reposicionar-se como protagonista — agora impulsionada por um novo ciclo de expansão fiscal com foco estratégico na área de defesa. Na última cúpula da OTAN, os países membros firmaram o compromisso de destinar até 5% do PIB à área de segurança até 2035, sendo 3,5% alocados diretamente em gastos militares. Trata-se de uma guinada que, além de refletir a nova realidade geopolítica, transforma a região em um vetor potencial de crescimento estrutural, destravando oportunidades em setores como reindustrialização, infraestrutura estratégica, tecnologia dual-use e, claro, defesa.

A lógica que se consolida é a…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.