
Edição de Imagens: iStock/ Edson Souza e @sarra22
Entramos na reta final do primeiro semestre de 2025, ainda embalados por um alívio técnico relevante nos mercados globais. Para ilustrar, em maio, os índices americanos registraram sua melhor performance mensal desde novembro de 2023 — uma recuperação puxada pela temporada de resultados corporativos, como antídoto à correção vivida em abril, catalisada pela rodada de delírios tarifários da Casa Branca.
Com o calendário virando, os olhos se voltam agora para junho, que começa com a divulgação dos dados de emprego nos EUA, nos próximos dias, e falas importantes de autoridades monetárias — incluindo Jerome Powell, que fala hoje (2). O pano de fundo, no entanto, voltou a escurecer: um novo capítulo da guerra comercial foi reaberto.
A China respondeu com firmeza às recentes acusações americanas de que estaria violando o Acordo de Genebra, e prometeu retaliações à altura. A reação vem na esteira das declarações de Donald Trump na última sexta-feira (30 de maio), quando o presidente americano ameaçou impor novas sanções ao gigante asiático, não apenas por tarifas, e dobrar de 25% para 50% as tarifas sobre importações de aço a partir de 4 de junho.
O efeito imediato nos mercados foi claro: quedas nas bolsas da Ásia, Europa e Estados Unidos. Resta agora saber se o já novo acrônimo “TACO” — Trump Always Chickens Out, ou “Trump sempre se acovarda” — cunhado pelo Financial Times, continuará fazendo jus ao seu criador ou se, desta vez, as ameaças se converterão em ação concreta e duradoura. Se assim for, junho promete mais volatilidade do que alívio.
· 00:56 — Impasse político
No Brasil, o encerramento de maio trouxe uma pausa na trajetória de valorização dos ativos locais, após quase dois meses de alta consistente. A acomodação recente pode ser interpretada como uma realização técnica, impulsionada por três fatores principais: os ruídos causados pela proposta de aumento do IOF, a crescente pressão política sobre o Ministério da Fazenda e, claro, o forte rali acumulado até aqui, sem falar na melhora relativa dos ativos americanos, que voltaram a atrair capital depois de meses.
No campo da atividade econômica, os sinais continuam positivos. O mercado de trabalho permanece apertado e o PIB do primeiro trimestre surpreendeu para cima. Em teoria, esse pano de fundo limita o espaço para novos cortes de juros até o fim do ano. Ainda assim, sigo acreditando que o Banco Central optará por mais uma ou duas reduções — embora o ideal fosse um tom mais duro no curto prazo, justamente para compensar a ausência de uma âncora fiscal crível. Afinal, a política monetária vem sendo obrigada a atuar sozinha em um cenário de desorganização das contas públicas.
Enquanto isso, Brasília afunda ainda mais no impasse político-fiscal. A reclassificação da perspectiva do Brasil de “estável” para “negativa” pela Moody’s apenas formaliza aquilo que o mercado já vem sinalizando há tempos: o governo precisa cortar gastos — e rápido. É verdade que agências de rating são notoriamente defasadas em suas avaliações, mas, ainda assim, funcionam como lembretes incômodos de que a direção adotada é temerária. A pressão agora está nas mãos de Fernando Haddad, que recebeu um ultimato de dez dias de Motta e Alcolumbre para apresentar um plano B ao decreto do IOF. A estratégia de Haddad, de contar com o receio dos parlamentares de verem suas emendas reduzidas, não funcionou — e tudo indica que o governo será forçado a recuar novamente (na questão do risco sacado, provavelmente).
A verdade incômoda é que o governo parece cada vez menos apto — e menos disposto — a promover o ajuste necessário. Os números recentes de popularidade apenas aumentam o senso de desespero do governo: a desaprovação de Lula subiu de 50,1% para 53,7% em maio. E isso sem que o escândalo do INSS tenha atingido seu ápice e com a crise do IOF ainda em ebulição. Se essa tendência continuar, não seria surpreendente ver a desaprovação bater os 60%. A eleição ainda está distante, mas a ansiedade já chegou. O debate fiscal, portanto, foi antecipado. Só que o timing político para enfrentá-lo é o pior possível. O mais provável é que o governo continue apostando em remendos e paliativos — “puxadinhos”, como já se tornou habitual — empurrando o verdadeiro ajuste para 2027. E quanto mais tempo se perder, maior será a conta. O Brasil, como sempre, posterga o inevitável — até que ele se torne insuportável.
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· 01:48 — Reformar é preciso
A revisão da perspectiva de crédito do Brasil pela Moody’s, de estável para negativa, não veio por acaso — e tampouco foi motivada por um evento isolado. Segundo a agência, a decisão reflete o avanço aquém do necessário no enfrentamento da rigidez dos gastos obrigatórios e na construção de credibilidade fiscal. Em outras palavras, o país até tem perseguido as metas nominais, mas falha sistematicamente em apresentar um plano crível de equilíbrio estrutural das contas públicas. A lista de más sinalizações só cresce. A elevação do IOF, as mudanças no Imposto de Renda e as compensações fiscais mal calibradas reforçam a percepção de que o governo age sem estratégia de longo prazo. O relatório bimestral com um contingenciamento de R$ 10,6 bilhões e bloqueio adicional de R$ 20,7 bilhões é, no fundo, mais um sintoma do descompasso fiscal. E o horizonte não promete alívio: caso Lula seja reeleito, herdará de si mesmo um quadro ainda mais pressionado. O ano que vem, por si só, já deve ser desafiador, como são todos os anos pré-eleitorais, marcados por pressões adicionais de gasto. Já 2027, com a conta vencendo, tende a ser francamente indigesto.
A insistência em cobrir rombos via aumento de arrecadação — como evidenciado no episódio do IOF — não só desgasta a confiança, mas também revela um vício recorrente. E aqui, o problema não está apenas no que se faz, mas no que se evita fazer. Há uma crescente fadiga, tanto na sociedade quanto no Congresso, com a sanha arrecadatória do governo. Sem enfrentar o lado da despesa, o Brasil continuará desperdiçando a rara oportunidade de crescer de forma sustentável.
É nesse ponto que três reformas estruturais se tornam inadiáveis. A administrativa, embora de menor impacto imediato, é crucial no longo prazo: ela representa a única saída para construirmos um Estado mais eficiente e compatível com as necessidades do século XXI. A orçamentária é a mais urgente. Hoje, o orçamento federal é uma colcha de retalhos institucionalizada, com receitas carimbadas e pouca margem para decisões técnicas (em breve, tudo será engessado). Precisamos reduzir o tamanho do Estado, desindexar receitas e modernizar a lógica orçamentária. E, por fim, a reforma da Previdência precisa de uma nova rodada. Isso significa, em primeiro lugar, desvincular os reajustes dos benefícios do salário mínimo; em segundo lugar, avançar para um sistema híbrido de transição, que inclua previdência complementar e regras universais — sem privilégios para militares ou servidores públicos. E, no longo prazo, pavimentar uma transição responsável para o regime de capitalização.
Não se trata de fantasia, mas de uma resposta realista ao colapso iminente do modelo atual, agravado por nossa dinâmica demográfica. É difícil? Sim. Mas é necessário se o Brasil quiser algum dia sair da armadilha da mediocridade. Caso contrário, seguiremos imersos no ciclo vicioso de puxadinhos fiscais, maquiagens contábeis e reformas pela metade. Em paralelo, é evidente a necessidade de rever gastos tributários. Mas nenhuma dessas medidas se sustentará sem liderança política convicta e com mandato claro para transformar. Por isso, 2026 será um ponto de inflexão — e talvez a última grande janela para debatermos profundamente o futuro fiscal do país.
· 02:35 — O alívio pode continuar?
Nos EUA, os sinais de desaceleração da atividade econômica começam a ganhar corpo — ainda que de forma tímida. Os dados recentes apontam para um arrefecimento do ritmo de crescimento, algo que, se confirmado pelos números do mercado de trabalho, pode ter implicações relevantes para a política monetária.
Nesta semana, o radar se volta para três divulgações cruciais: o relatório JOLTS na terça-feira (3), que mostra a quantidade de vagas em aberto; a pesquisa ADP na quarta (4), que antecipa o comportamento da folha de pagamentos do setor privado; e, sobretudo, o payroll de sexta-feira (6), o principal dado de emprego nos EUA.
Até aqui, o mercado de trabalho segue resiliente, embora já apresente sinais de perda de fôlego. O ritmo de criação de empregos, por exemplo, caiu: em 2025, a média mensal da folha de pagamento não agrícola tem sido de 144 mil novas vagas — uma desaceleração relevante frente aos 192 mil observados em média nos anos de 2023 e 2024. Ainda é um número robusto, mas não mais exuberante. O ponto central agora é saber se essa trajetória de arrefecimento vai se consolidar. Se os dados confirmarem a tendência de desaceleração suave e controlada, o Federal Reserve terá espaço político e técnico para considerar cortes de juros no segundo semestre. Não se trata de um cenário benigno, mas sim de uma desaceleração administrável — e, para o Fed, talvez até desejável, após anos de superaquecimento e inflação pressionada.
· 03:21 — Ofensiva ucraniana
A Ucrânia voltou a levar a guerra para dentro do território russo — e, desta vez, com impacto militar considerável. Segundo relatos, os ataques com drones teriam comprometido até um terço da capacidade de lançamento de mísseis de longo alcance da Rússia, o que representaria um prejuízo estimado em US$ 7 bilhões. Não é pouca coisa. Embora o mercado tenha, nos últimos tempos, relegado a guerra a segundo plano, esse contra-ataque traz duas implicações relevantes que merecem atenção.
No curto prazo, o episódio dificulta qualquer avanço rumo a um cessar-fogo. Se confirmada a extensão dos danos à infraestrutura russa, Moscou encontrará menos incentivo ainda para negociar em desvantagem — e mais combustível para retaliar. O cenário de escalada ganha força, e a guerra, que já parecia cronicamente prolongada, dá mais um passo rumo à sua normalização trágica. No longo prazo, o que se levanta é uma discussão incômoda, porém inevitável, sobre a nova lógica dos gastos com defesa. O ataque ucraniano, apesar de barato e tecnologicamente simples — drones de baixo custo —, gerou um impacto bilionário na máquina de guerra russa.
A assimetria chama a atenção de governos e investidores: num mundo onde é possível destruir ativos militares com frações do orçamento tradicional, as fronteiras entre guerra convencional e tecnológica ficam cada vez mais borradas. A conclusão é desconcertante, mas evidente: a guerra continua distante de uma resolução, e cada novo capítulo reforça que estamos entrando numa era em que os gastos com segurança, cibernética ou bélica, não são apenas inevitáveis — são estratégicos. E o mercado, mais cedo ou mais tarde, será forçado a precificar isso.
· 04:14 — Nova frente comercial
Na manhã de sexta-feira (30 de maio), o presidente Donald Trump resolveu reacender as tensões comerciais com a China, alegando que Pequim estaria violando os termos da trégua tarifária acertada no início do mês. A denúncia joga uma pá de incerteza sobre o principal catalisador de alta do mercado em maio: a suspensão provisória da guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo. E, como já aprendemos, nesse tipo de relação, o pavio costuma ser curto — sobretudo quando se trata de tarifas sobre o setor de tecnologia, onde as fraturas são mais expostas.
A resposta chinesa veio em tom duro: Washington, segundo Pequim, também teria rompido o acordo recente ao introduzir novas medidas discriminatórias, incluindo restrições adicionais à exportação de chips de inteligência artificial, limitações na venda de softwares de design de semicondutores e até a revogação de vistos de estudantes chineses. A retaliação foi prometida. A agenda de reconciliação, por ora, foi suspensa.
O clima azedou de vez quando Trump anunciou um novo salto tarifário: o imposto sobre metais, que já era de 25%, passará para 50%. A justificativa? Proteger os trabalhadores americanos e, de quebra, abrir caminho para facilitar a operação de aquisição entre a Nippon Steel e a US Steel. O argumento pode até soar nacionalista, mas o efeito prático é previsível: mais atrito, menos previsibilidade e um mercado tentando entender qual será o próximo movimento no xadrez geoeconômico.
Resta saber se o acrônimo cunhado pelo Financial Times — “TACO”, de “Trump Always Chickens Out” (“Trump sempre se acovarda”) — continuará válido ou se, desta vez, as ameaças se materializarão em medidas concretas e duradouras. Caso a retórica se converta em ação, junho deve abandonar qualquer resquício de alívio.
· 05:07 — Atenção à tecnologia
O bilionário Dario Amodei, CEO da Anthropic, não economizou nas palavras ao declarar que a inteligência artificial pode eliminar até 50% dos empregos de entrada e funções administrativas nos próximos um a cinco anos. Em sua visão, isso poderia provocar um salto nas taxas de desemprego entre 10% e 20%. O alerta ganha ainda mais peso vindo do comandante de uma das empresas mais avançadas do setor — a mesma que acaba de lançar o poderoso Claude Opus 4. Amodei também defendeu que o governo dos EUA comece a tributar o setor, antecipando que a IA deverá aprofundar a desigualdade de renda: as grandes empresas de tecnologia ganham rios de dinheiro, enquanto parte da força de trabalho assiste à erosão de suas funções.
Naturalmente, as reações vieram rápido …