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Investimentos

Ibovespa apreensivo? Julgamento de Bolsonaro, temor de retaliação tarifária e Livro Bege dos EUA são destaques nesta quarta-feira (3)

Veja os destaques do mercado financeiro: Google pode manter Chrome, novo acordo entre Rússia e China, o desfile militar em Pequim e mais.

Por Matheus Spiess

03 set 2025, 09:08

Atualizado em 03 set 2025, 09:08

mercado ibovespa ações bolsa b3

Imagem: iStock.com/sankai

Os mercados globais tiveram um pregão marcado pela aversão ao risco, com tensões fiscais e disputas tarifárias nos Estados Unidos adicionando uma dose extra de volatilidade. Após um tribunal de apelações declarar ilegais a maior parte das tarifas impostas pelo governo Trump, o presidente reagiu convocando uma reunião de emergência para acionar a Suprema Corte, alegando que a perda dessa fonte de arrecadação poderia ampliar ainda mais o déficit fiscal americano, hoje estimado em US$ 1,7 trilhão.

A incerteza se somou ao estresse fiscal na Europa e desencadeou uma nova rodada de liquidação no mercado global de títulos. Os rendimentos de longo prazo dispararam para níveis não vistos em anos: no Reino Unido, Alemanha e França as taxas renovaram máximas recentes, enquanto nos EUA os Treasuries de 30 anos chegaram a flertar com o patamar de 5%. Esse salto nos juros longos aumentou significativamente os riscos de perdas para detentores de títulos e reforçou a busca por proteção, com o ouro renovando recordes e superando os US$ 3.599 por onça.

Em paralelo, a expectativa dos investidores se volta hoje para a divulgação do relatório JOLTS e do Livro Bege nos EUA, embora a baixa taxa de resposta das empresas limite a qualidade dos dados de emprego. O quadro geral ainda aponta para um mercado de trabalho que desacelera contratações, mas sem avanço relevante das demissões, preservando a sustentação do consumo das famílias.

Entre as empresas, o destaque foi a Alphabet: em decisão histórica no campo antitruste, a Justiça americana determinou que o Google poderá manter o navegador Chrome, mas terá de compartilhar parte de seus dados de busca com concorrentes, medida que impulsionou suas ações em mais de 7%.

Nos mercados asiáticos, o dia foi de quedas generalizadas em Xangai, Shenzhen e Hong Kong, em meio a incertezas políticas no Japão, enquanto Taiwan e Coreia do Sul destoaram com ganhos moderados. Já na Europa, as bolsas mostraram recuperação parcial nesta manhã, aliviando a forte venda dos títulos da véspera, ainda que o quadro fiscal siga como um dos principais fatores de atenção.

· 00:55 — Começou o desembarque

No Brasil, o Ibovespa encerrou a sessão de ontem em queda de 0,67%, aos 140.335 pontos, em um pregão marcado por dois fatores de grande relevância: a divulgação do PIB do segundo trimestre e o início do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Segundo o IBGE, a economia brasileira cresceu 0,4% no 2º trimestre de 2025, levemente acima das projeções de mercado, com destaque positivo para o setor de serviços e a indústria extrativa. Por outro lado, investimentos e consumo das famílias apresentaram perda de fôlego, reflexo do ambiente de juros elevados e das incertezas fiscais. Embora o resultado tenha surpreendido marginalmente, ele representa forte desaceleração em relação ao primeiro trimestre, reforçando os sinais de que a política monetária restritiva começa a produzir seus efeitos. Nesse contexto, o dado de produção industrial que será divulgado hoje pode confirmar a moderação da atividade, ao apontar retração em julho. Para o restante do ano, o crescimento deve seguir em ritmo moderado. O quadro abre espaço para cortes de juros em dezembro, desde que a atividade confirme fraqueza adicional, a inflação mostre trajetória qualitativamente mais benigna e o Federal Reserve também avance em seu ciclo de flexibilização.

No campo político, as atenções estão voltadas para a retomada do julgamento de Bolsonaro no STF, que gera apreensão adicional nos mercados diante do risco de retaliações por parte dos EUA — não por acaso, hoje acontece a primeira audiência pública no Escritório do Representante de Comércio norte-americano, em que o governo brasileiro deve defender uma saída negociada. A tensão política se soma a um cenário de governabilidade cada vez mais complexo para Lula em Brasília: as cúpulas do União Brasil e do PP anunciaram a saída da base, comunicando que apoiarão o projeto de anistia a Bolsonaro — movimento confirmado até pelo líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, ao reconhecer o fortalecimento da proposta. A saída dos ministros André Fufuca (Esporte) e Celso Sabino (Turismo) cristaliza a fragilidade política, ampliando o risco de maior volatilidade nos ativos domésticos, justamente em um momento em que os debates fiscais permanecem sem solução clara.

· 01:46 — Começou confirmando a tradição

Como destaquei ontem (2), setembro carrega a reputação de ser o mês mais desafiador para a bolsa americana — e o início deste ano confirmou a tradição: S&P 500, Nasdaq e Dow Jones encerraram em queda, em linha com o padrão histórico de recuo médio em torno de 1% neste período. Ainda assim, é importante não superestimar a sazonalidade. O que de fato direciona os preços são variáveis estruturais, como política monetária e cenário macroeconômico. Nesse sentido, vale notar que o mercado de juros já precifica até cinco cortes do Federal Reserve até 2026, e, em perspectiva histórica, ciclos de redução de juros costumam sustentar o desempenho das ações, oferecendo um contraponto relevante à narrativa de fragilidade sazonal.

Apesar disso, o ambiente segue permeado por incertezas. As disputas judiciais sobre as tarifas impostas por Donald Trump, a crescente pressão sobre a independência do Fed, rumores de uma possível paralisação do governo e indicadores econômicos ainda mistos compõem um pano de fundo delicado. O relatório de empregos que será divulgado na sexta-feira assume papel central, podendo redefinir as apostas sobre o ritmo da política monetária e, consequentemente, ditar se o rali de verão terá fôlego para se estender ou se cederá lugar a um outono mais turbulento. Paralelamente, fatores corporativos e regulatórios — como a decisão judicial favorável ao Google, que levou as ações da Alphabet a dispararem mais de 7% — acrescentam volatilidade adicional, reforçando o caráter pouco trivial do atual momento de mercado.

· 02:32 — Tom duro diante da judicialização

O presidente Donald Trump voltou a adotar um tom mais duro em relação ao comércio internacional, descartando qualquer possibilidade de redução das tarifas sobre importações da Índia — ainda que tenha ressaltado manter uma boa relação com o país. Segundo ele, a balança comercial com Nova Déli segue “desequilibrada” e agravada pelas compras de energia russa, que, em sua visão, minam a efetividade das sanções contra Moscou. Trump também ampliou as críticas a Brasil e China, acusando-os de “matar os EUA” com tarifas excessivas — lembrando que, no caso brasileiro, o saldo comercial vem sendo deficitário com os americanos há mais de uma década. As declarações acontecem em meio a uma disputa judicial decisiva sobre a legalidade das tarifas implementadas por seu governo, após o tribunal de apelações classificar a maioria delas como ilegais, como já comentei aqui, mas mantê-las em vigor até 14 de outubro, prazo em que a Casa Branca deve recorrer à Suprema Corte.

O debate ganhou contornos ainda mais tensos após o assessor comercial da Casa Branca, Peter Navarro, afirmar que a dissidência registrada na decisão judicial oferece um roteiro para convencer a Suprema Corte de que existe uma emergência nacional — justificada tanto pelo déficit comercial quanto pela crise do fentanil. Enquanto isso, o setor empresarial e parte do Congresso pressionam por uma definição rápida, diante da insegurança que paralisa investimentos e afeta exportadores e importadores. Ao mesmo tempo, apenas em julho, o governo arrecadou US$ 28 bilhões em tarifas, valores que têm ajudado a mitigar um déficit orçamentário superior a US$ 1,7 trilhão. Uma eventual reversão desse fluxo não apenas comprometeria a arrecadação, mas também poderia pressionar os rendimentos dos Treasuries, como já se observou ontem. Em paralelo, o Congresso se prepara para enfrentar outro desafio imediato: a negociação do financiamento do governo antes de 30 de setembro, em mais uma batalha orçamentária que promete elevar a tensão política e os riscos fiscais.

· 03:27 — Não conseguem isolar

Os esforços da União Europeia para isolar economicamente a Rússia sofreram um duro revés com o recente anúncio de um novo acordo estratégico entre Moscou e Pequim. A Gazprom fechou com a China a construção do gasoduto Power of Siberia 2, projeto que aprofunda a cooperação energética entre os dois países e consolida a presença russa em economias asiáticas em expansão. O acerto, firmado durante a cúpula da Organização de Cooperação de Xangai, soma-se a outros vinte pactos bilaterais, incluindo a isenção de vistos para cidadãos russos em território chinês, e reforça a aproximação entre Vladimir Putin e Xi Jinping em meio à tentativa ocidental de sufocar financeiramente o esforço de guerra russo na Ucrânia. Trata-se de um gesto pragmático, que mostra não apenas a resiliência da parceria, mas também a disposição de ambos em criar alternativas ao sistema econômico do Ocidente.

Enquanto isso, a União Europeia segue em busca de novas formas de pressão, discutindo sanções secundárias e restrições adicionais a exportações consideradas estratégicas. A Alemanha chegou a sugerir que o bloco interrompa as vendas de sucata de cobre à China — insumo essencial para cadeias industriais ligadas à transição energética, como a de baterias. O risco, porém, é que tais medidas acabem atingindo setores vitais da própria economia europeia, acentuando vulnerabilidades em um momento de desaceleração. A mensagem transmitida pela reunião sino-russa é cristalina: China e Rússia pretendem demonstrar que detêm massa crítica e influência global suficientes para resistir às pressões de Europa e EUA, buscando reposicionar-se como polos alternativos de poder em um mundo cada vez mais fragmentado.

· 04:11 — O desfile

O desfile militar em Pequim, realizado para marcar os 80 anos da derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial, transformou-se em uma vitrine cuidadosamente orquestrada por Xi Jinping para projetar o poder militar e a crescente influência diplomática da China. Ao lado de chefes de governo como Vladimir Putin e Kim Jong Un, o líder chinês buscou enviar uma mensagem clara de desafio à ordem internacional liderada pelos Estados Unidos, ocupando o Portão da Paz Celestial enquanto tanques, mísseis e tropas marchavam em perfeita sincronia pela imensa praça. Sem dúvida, foi teatral.

Mais do que a exibição de força bruta, o evento simbolizou a disposição de China, Rússia e Coreia do Norte em coordenar-se de forma mais explícita e estratégica diante do Ocidente, no Eixo das Ditaduras. A presença de estrangeiros acompanhando o desfile reforçou ainda mais a dimensão global dessa mensagem, sublinhando o caráter geopolítico do espetáculo preparado por Pequim. O impacto político foi imediato. Em Washington, Donald Trump reagiu acusando Xi, Putin e Kim de conspirarem contra os EUA, num contexto em que a Rússia acaba de avançar no acordo para construir o gasoduto Power of Siberia 2 em direção à China, como comentei anteriormente.

Para Xi, o desfile serviu como prova de sua tentativa de liderança global em meio a um ambiente de tensão crescente. O episódio, carregado de simbolismo, reforça a percepção de que vivemos uma nova Guerra Fria, marcada por alinhamentos explícitos e um clima de enfrentamento que, ao que tudo indica, tende a se intensificar.

· 05:09 — Decisão favorável

O julgamento antitruste contra o Google trouxe uma decisão que, embora imponha restrições relevantes, preserva a espinha dorsal do modelo de negócios da companhia. O pior cenário foi afastado: apesar do reconhecimento de que a empresa manteve um monopólio ilegal no mercado de buscas, a proposta do Departamento de Justiça de forçar a venda do navegador Chrome ou do sistema Android foi considerada desproporcional e, portanto, descartada. Em vez disso, a Corte determinou que o Google não poderá mais firmar contratos de exclusividade — como os acordos com a Apple — e terá de compartilhar parte dos dados usados em seus resultados de busca. Na prática, a sentença protege os ativos mais estratégicos da companhia, preservando sua estrutura central, mas impõe limites a práticas que reforçavam sua posição.

A reação do mercado foi imediata e positiva. As ações do Google avançaram no after hours com o alívio de que não houve…

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.