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Estamos prestes a encerrar o terceiro trimestre com desempenho notável das bolsas americanas. O S&P 500 acumula ganhos superiores a 13% no ano e caminha para registrar seu melhor setembro desde 2013, enquanto o Dow Jones e o Nasdaq também se mantêm próximos de suas máximas históricas. Esse otimismo tem sido sustentado pela combinação entre a expectativa de cortes de juros por parte do Federal Reserve e resultados corporativos acima do previsto, fatores que, somados, vêm enfraquecendo o dólar no cenário global e impulsionando ativos em diferentes mercados, inclusive no Brasil (o trimestre também foi bom por aqui). Ainda assim, não faltam sinais de euforia especulativa, lembrando que a narrativa do “excepcionalismo americano”, embora siga viva, não está isenta de riscos de correção episódica. A história mostra, porém, que períodos de baixo risco de recessão e políticas monetária e fiscal ainda favoráveis tendem a sustentar novos avanços, especialmente no quarto trimestre.
No entanto, esse quadro de otimismo convive com um pano de fundo repleto de incertezas políticas, econômicas e geopolíticas. Nos Estados Unidos, a ameaça de paralisação do governo (“shutdown”) pode interromper a divulgação de indicadores-chave, como o payroll de setembro, em um momento no qual a política monetária do Fed depende diretamente das evidências vindas do mercado de trabalho. Na Europa, os mercados enfrentam pressão após a nova rodada de tarifas anunciada por Donald Trump sobre madeira e móveis, enquanto, na Ásia, investidores monitoram a fraqueza persistente da atividade chinesa e o desenrolar das tensões em torno de Taiwan. Nas commodities, o petróleo recua diante da expectativa de aumento de produção pela OPEP+ e da retomada de exportações do Curdistão iraquiano via Turquia, o que reduz parte do prêmio de risco embutido nos preços. No campo diplomático, segue no radar o plano de paz para Gaza apresentado por Trump e Netanyahu, cuja efetividade ainda depende da adesão do Hamas. O balanço, portanto, é de um mercado amparado por fundamentos sólidos e elevada liquidez, mas exposto a choques potenciais que podem rapidamente ampliar a volatilidade no curto prazo.
· 00:57 — Resistiu
No Brasil, a atenção do dia recai sobre a divulgação da taxa de desemprego da Pnad Contínua, enquanto, na véspera, o Caged mostrou a criação líquida de 147.358 vagas formais em agosto. O número representou uma aceleração em relação a julho, quando haviam sido abertas 129.775 vagas, mas ficou aquém da expectativa de 182 mil e marcou o pior resultado para o mês desde 2020. Apesar dessa decepção pontual, o mercado de trabalho brasileiro segue robusto. Justamente por isso, leituras mais fracas tendem a ser interpretadas como sinais de desaceleração da atividade, contribuindo para a formação de expectativas de cortes na Selic — por ora postergados apenas para a primeira ou segunda reunião de 2025. Ontem, inclusive, foi essa percepção sobre o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos que manteve o real entre as moedas de melhor desempenho no ano. A queda do petróleo, motivada pela expectativa de acordo em Gaza e pelo aumento da oferta da Opep+, normalmente teria peso negativo sobre nossa moeda, dada a relevância da commodity para a pauta exportadora. No entanto, a combinação de enfraquecimento do dólar em nível global e do carry trade ajudou a blindar o real. Vale lembrar também que a disputa técnica em torno da formação da Ptax hoje também tem gerado volatilidade adicional no câmbio.
No front fiscal, seguimos acompanhando uma trajetória que inspira preocupação. O relatório do TCU criticou duramente a prática do governo de mirar apenas o piso da meta do arcabouço fiscal, em vez do centro, além de destacar que R$ 89,9 bilhões em gastos foram retirados do limite por meio de seis medidas excepcionais entre 2024 e 2025. Como tenho reiterado, excluir despesas dessa forma mina a credibilidade da política fiscal, dificulta a estabilização da dívida e pressiona a curva de juros. Não surpreende, portanto, que o mercado dê pouca atenção ao resultado primário prometido pelo Executivo — até porque, para tentar se aproximar do centro da meta, o governo pode ser obrigado a congelar até R$ 34 bilhões em pleno ano eleitoral. O déficit nominal, afinal, segue próximo de 8% do PIB, e não adianta culpar os juros: eles só estão tão elevados assim justamente justamente pela falta de compromisso fiscal, alimentando um ciclo vicioso. Nesse contexto, a Câmara deve votar amanhã o projeto que amplia a faixa de isenção do IR para R$ 5 mil mensais. O governo pretende compensar a renúncia fiscal com taxação sobre alta renda, mas há forte articulação no Congresso para derrubar essa contrapartida, o que representaria mais uma bomba fiscal. No fundo, sabemos que as fragilidades estruturais só serão enfrentadas a partir de 2027, independentemente de quem vença as eleições (o tema é inevitável, já que o orçamento chegou ao seu limite). Até lá, a questão central será se 2026 trará, de fato, um debate reformista real, com propostas viáveis e ancoradas em convicção política suficiente para redesenhar o orçamento e recuperar o controle da trajetória fiscal.
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· 01:45 — Que comecem os dados
Os índices americanos iniciaram a semana em território positivo, demonstrando relativa resiliência diante da possibilidade de uma paralisação do governo a partir de 1º de outubro. A reação otimista encontra respaldo na memória recente dos investidores: desde 2013, os Estados Unidos já enfrentaram quatro episódios de shutdown, todos de curta duração e com efeitos limitados sobre a atividade econômica. Esse histórico ajuda a sustentar a percepção de que, mesmo em meio a impasses orçamentários, o que realmente orienta os preços no médio prazo são os fundamentos — como os lucros corporativos, a trajetória da inflação e o ciclo de crescimento econômico. Em outras palavras, os agentes preferem olhar além do ruído político imediato.
Ainda assim, um cenário de paralisação mais prolongada carrega riscos não triviais, sobretudo pela possibilidade de atrasar a divulgação de dados fundamentais para a calibragem da política monetária. Entre eles, o destaque é o relatório de emprego de setembro, que pode ser decisivo para a próxima reunião do Federal Reserve. Como a fragilidade do mercado de trabalho é hoje o principal argumento a favor de cortes de juros, a ausência desses indicadores acrescentaria incerteza à leitura dos dirigentes do Fed e dos investidores. Além disso, permanecem no radar indicadores relevantes para o pulso da economia americana: os preços dos imóveis, que mostraram alta em julho; a confiança do consumidor, cuja projeção aponta para uma leve retração em setembro; e o relatório Jolts, que deve sinalizar queda no número de vagas abertas, abrindo a série de dados de emprego na semana. O conjunto reforça a percepção de que a economia avança em ritmo mais moderado, ainda que sem sinais de deterioração abrupta.
· 02:39 — Risco real
Os Estados Unidos se aproximam de uma paralisação (“shutdown”) do governo a partir da meia-noite desta terça-feira (30), caso democratas e republicanos não encontrem consenso em torno do orçamento ou de um projeto provisório de financiamento. A reunião realizada entre Donald Trump e as lideranças do Congresso não conseguiu romper o impasse, concentrado sobretudo na pauta da saúde. De um lado, os democratas exigem a extensão permanente dos subsídios do Obamacare, a reversão dos cortes no Medicaid e a garantia de recursos já aprovados pelo Congresso; de outro, os republicanos insistem em um orçamento “limpo”, sem novas concessões. A disputa se agravou nas últimas horas com trocas públicas de acusações entre o vice-presidente JD Vance e o líder democrata no Senado, Chuck Schumer, elevando a temperatura política a poucos instantes do prazo final.
Caso a paralisação se confirme, centenas de milhares de funcionários públicos considerados não essenciais deverão ser dispensados, enquanto serviços básicos serão mantidos sob forte restrição. Além disso, indicadores econômicos fundamentais, como o relatório mensal de empregos, terão sua divulgação adiada, aumentando a opacidade de um cenário já marcado por inflação resiliente e sinais de enfraquecimento gradual no mercado de trabalho. Historicamente, episódios de shutdown tiveram efeitos temporários e foram seguidos pelo pagamento retroativo de salários, mas a dimensão atual da disputa — centrada em temas sensíveis como saúde e política fiscal — sugere que o impacto pode ser mais profundo desta vez, corroendo a confiança de agentes econômicos e ampliando a volatilidade nos mercados globais.
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· 03:23 — As compras de soja
A ausência inédita de compras de soja americana pela China no início da colheita marca um ponto de inflexão na já desgastada relação comercial entre Washington e Pequim. Historicamente, o país asiático absorvia mais da metade da produção de soja dos EUA, destinada sobretudo à fabricação de ração animal e óleo de cozinha. No entanto, as tarifas retaliatórias impostas por Pequim tiraram a competitividade dos grãos americanos frente a fornecedores alternativos, em especial Brasil e Argentina. Este último, em busca desesperada por dólares, suspendeu temporariamente impostos de exportação, ampliando sua atratividade. O efeito foi imediato: até meados de setembro, os pedidos de soja americana caíram 37% em relação ao ano anterior, segundo a Argus Media, em meio a um cenário de preços em queda superior a 3% e risco crescente de excesso de estoques. Em Chicago, isso se traduziu em pressão adicional sobre os grãos e oleaginosas, com especuladores próximos de níveis máximos líquidos vendidos. O quadro climático — com tempo seco e ameno no Cinturão dos Grãos — acelera a maturação de soja e milho, e, portanto, a colheita. No caso da soja, em particular, esse ritmo mais intenso se choca com a ausência da demanda chinesa, ampliando o risco de novas quedas de preço.
A relevância desse movimento não pode ser subestimada. Em 2024, as exportações de soja para a China renderam US$ 12,6 bilhões aos EUA, configurando-se como sua principal venda ao país asiático. Agora, com a perda de espaço para concorrentes, cresce a insatisfação dos produtores, que pressionam Donald Trump por uma solução rápida. A Associação Americana de Soja, inclusive, criticou duramente a decisão do Tesouro de conceder uma linha de crédito de US$ 20 bilhões justamente à Argentina — hoje beneficiária da demanda chinesa que antes pertencia aos americanos. À frente, os produtos agrícolas tendem a ocupar o centro das negociações entre Trump e Xi Jinping no próximo mês, com espaço até para o Brasil entrar na equação. O governo americano chegou a ventilar a possibilidade de usar parte da arrecadação com tarifas para compensar os agricultores locais, mas isso não altera o fato de que a participação dos EUA no mercado chinês segue em queda. O episódio ecoa a guerra comercial de 2018, agora reacendida no segundo mandato de Trump, e reforça como a disputa pela soja se transformou em mais uma frente dessa nova fase da rivalidade sino-americana.
· 04:11 — Um novo plano
O presidente Donald Trump e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu apresentaram um novo plano para encerrar a guerra em Gaza, estruturado em torno de um cessar-fogo imediato, da libertação de todos os reféns em até 72 horas e da criação de um “Conselho da Paz” internacional para liderar o processo de reconstrução (Tony Blair, ex-premiê britânico, surge como nome cotado para assumir o governo provisório em Gaza). O desenho do acordo exclui qualquer papel futuro do Hamas no território, impondo como condições seu desarmamento completo e a renúncia ao governo. Em contrapartida, prevê anistia aos combatentes que entregarem suas armas. Embora Trump afirme contar com o respaldo de líderes do Oriente Médio, incluindo países de maioria islâmica, o êxito do plano depende de forma crucial da adesão do próprio Hamas — que há anos rejeita termos semelhantes. Para Israel, a proposta tem um atrativo adicional: caso o movimento recuse os termos, Netanyahu recebeu de Trump a promessa de apoio irrestrito dos EUA para “fazer o que for necessário”.
No tabuleiro diplomático, a proposta também abre espaço para movimentos estratégicos. Catar e Turquia, historicamente próximos ao Hamas, podem utilizá-la para pressionar o grupo, ao mesmo tempo em que preservam a narrativa de defesa da Palestina. Já Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, alinhados aos interesses de estabilização regional, veem no acordo a oportunidade de afastar o Hamas da governança em Gaza, ainda que mantenham, em público, o discurso em favor de um futuro Estado palestino. Para os palestinos, a proposta sugere um alívio imediato e traz a garantia americana de impedir anexações na Cisjordânia, mas posterga, de maneira indefinida, a concretização de um projeto de autodeterminação nacional. A ausência de clareza sobre a legitimidade de um Conselho Internacional para gerir Gaza, somada à influência persistente de atores como Irã e Houthis, mantém a paz como possibilidade frágil, envolta em mais incertezas e riscos do que em garantias tangíveis.
· 05:08 — Em busca da Margem…
Na semana passada, a Petrobras (PETR4) avançou em um passo decisivo rumo à exploração da Margem Equatorial ao obter do Ibama a aprovação da Avaliação Pré-Operacional (APO). Esse procedimento, que simula situações de emergência ambiental para testar a capacidade de resposta das operadoras, era condição indispensável para que a companhia pudesse iniciar as atividades exploratórias na Foz do Amazonas. Embora o órgão regulador tenha solicitado ajustes complementares, a própria Petrobras afirmou que se tratam de adaptações simples, sem risco de comprometer o cronograma estabelecido. A importância desse aval cresce à medida que…