O payroll desta sexta-feira (6) mostrou a criação de 336 mil novas vagas de emprego em setembro nos Estados Unidos. O número é muito superior às expectativas do mercado, de 170 mil, e o maior desde janeiro deste ano.
O dado é o mais importante do mercado de trabalho dos EUA. Mas o de hoje tinha ainda mais importância para definir os rumos da economia norte-americana e, consequentemente, global.
Por que o payroll de hoje tinha mais importância que o habitual?
Antes de tudo, é importante entender o cenário atual. A percepção de que as taxas de juros dos EUA ficarão mais altas por mais tempo tem impulsionado os títulos do tesouro do país aos maiores níveis desde 2007, um ano antes da crise financeira de 2008.
Essa percepção tem fundamento na resiliência da economia norte-americana ao aperto monetário. Quando se aumenta o juro para conter a inflação, a tendência natural é uma desaceleração econômica.
Mas, ao contrário disso, os dados dos Estados Unidos têm mostrado uma resistência maior da economia. E os dados do payroll, nesta sexta-feira, apontaram para um mercado de trabalho aquecido e reforçaram essa robustez.
Neste contexto, o corte de juro nos EUA, que beneficiaria os ativos de risco, fica mais distante, como explica o analista Enzo Pacheco, da Empiricus Research.
“O corte de juros pelo Fed, que antes era precificado para o primeiro semestre de 2024, agora está ficando cada vez mais longe. Por um lado mostra que a economia está bem, mas manter a taxa de juros alta por muito tempo pode criar problemas mais à frente”.
Alta do Treasury de 10 anos é prejudicial para os ativos de risco
Com isso, há um ajuste por parte do mercado nas curvas mais longas de juros, como é o caso do Treasury de 10 anos. Esse título do tesouro em especial é responsável pela arbitragem de investimentos em todo o mundo.
“O Treasury de 10 anos é parte da precificação de todos os ativos. Se você achava que o Fed iria cortar o juro rapidamente, teria impacto em todas as curvas de juros e, consequentemente, o Treasury de 10 anos sofreria uma redução. Com um corte de juro menor pelo Fed, o impacto na curva como um todo não é tão grande e você tem que reprecificar todos os seus fluxos de caixa com esse juro longo por mais tempo. Isso pode pegar os ativos de risco” explicou Pacheco.
Além de a alta do Treasury de 10 anos afetar negativamente o cálculo de valuation das empresas, ele se torna uma alternativa interessante para os investidores, que passam a ter um rendimento favorável (atualmente, perto de 4,8% ao ano) em um título livre de risco e em dólar.
Desta maneira, há uma fuga de capital da renda variável para o Treasury, um fortalecimento do dólar e a queda das bolsas.
Dados mistos da economia norte-americana deixam futuro imprevisível
Depois de uma queda brusca no início da manhã com o payroll muito acima do esperado, o Ibovespa virou para o positivo ao longo do dia. Por volta das 16h, mostra alta de 1%.
Segundo Pacheco, a reviravolta pode ter se dado por algumas especificidades do número de setembro. “Com o final do verão e o começo do ano escolar, tem uma contração maior no segmento de educação, por exemplo”.
“O relatório de emprego tem também o dado de ganho médio por hora dos funcionários. Esse número vem caindo ao longo do tempo, a estimativa para este mês era uma alta de 0,3% e veio 0,2%, levemente abaixo. Isso é uma premissa importante pro Fed. Se as pessoas estão ganhando menos, ainda que 4% esteja muito acima da meta de 2% acima da inflação do Fed, dá para ver um certo desaquecimento nesse sentido”.
Por isso, o analista reforça a importância dos próximos dados de inflação a serem divulgados, para dar uma maior indicação de quais serão os próximos passos do Fed com relação aos juros norte-americano.
“Fica complicado [prever], porque apesar desse crescimento forte nas vagas de empregos, outros indicadores, como da indústria, ainda estão em campos contracionistas. São números muito mistos para ver qual o estado real da economia. Temos que aguardar, não tem um sinal claro. Vamos ver como vai ser a inflação de outubro nas métricas mais específicas”.
Enquanto isso, o analista espera volatilidade tanto no Ibovespa quanto nas bolsas pelo mundo. A saída, para ele, é uma carteira diversificada e adequada ao perfil de risco de cada investidor.
“Se tivermos um número muito forte de inflação poderemos ver os mercados sofrendo no curto prazo. Você deve ter uma certa cautela neste momento. Ainda acho que o curto prazo tende a ser um pouco mais negativo que positivo”, avaliou.
Confira a entrevista completa de Enzo Pacheco no Giro do Mercado: