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Bombardeio dos EUA em instalações nucleares do Irã desenham o iníco de uma nova guerra? Entenda e fique por dentro dos destaques

Os EUA bateu o “Martelo da Meia-Noite”, bombardeando três usinas nucleares no Irã.

Por Matheus Spiess

23 jun 2025, 09:17 - atualizado em 23 jun 2025, 09:17

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Imagem: iStock/ gopixa

Em uma operação cirurgicamente batizada de “Martelo da Meia-Noite”, os Estados Unidos bombardearam a instalação nuclear de Fordow — um complexo iraniano de enriquecimento de urânio escavado no interior de uma montanha, considerado imune a tudo, exceto às munições “destruidoras de bunkers” do arsenal americano. Natanz e Isfahan, outras peças-chave do programa nuclear iraniano, também foram atingidas. 

A ofensiva militar inédita da Casa Branca mergulha o Oriente Médio — e, por extensão, o mundo — em um novo estágio de incerteza geopolítica. Vivemos numa era de polarização crônica e manchetes moldadas por algoritmos. Isso amplifica reações exageradas, tanto no debate público quanto nos mercados. Para o investidor, o risco não está apenas no míssil lançado, mas na pressa em precificar sua consequência.

A resposta do Irã ainda não foi formalizada, mas Teerã já avisou que todas as opções estão na mesa — e prometeu consequências “permanentes”. Ao mesmo tempo, Israel segue com seu próprio cronograma ofensivo, sem qualquer sinal de recuo.

O que mais preocupa, por ora, é a ameaça ao Estreito de Ormuz, por onde passa cerca de 20% de todo o petróleo consumido no mundo. Uma interrupção significativa nessa rota elevaria o risco de um choque nos preços do petróleo, com impacto direto sobre a Ásia — que consome mais de 80% do petróleo bruto da região. Mesmo assim, os mercados asiáticos reagiram com relativa resiliência no pregão mais recente, à espera de definições mais claras. Na Europa, o dia começou com desempenho misto nas bolsas. O petróleo, que inicialmente subiu com a notícia dos bombardeios, moderou o tom nas primeiras horas do pregão. Já os índices futuros americanos operam em alta.

Fora do campo de batalha, a política monetária volta a ocupar o centro do palco. O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, participa nesta semana de audiências no Congresso americano — encontros que podem fornecer sinais importantes sobre a postura do banco central. Em um ambiente já marcado por incertezas geopolíticas, qualquer nuance na retórica de Powell pode amplificar — ou suavizar — os ruídos.

· 00:55 — Martelo da Meia-Noite

No fim de semana, os Estados Unidos confirmaram que três instalações nucleares do Irã foram alvejadas em uma ofensiva coordenada de proporções raramente vistas. Segundo autoridades americanas, os bombardeios foram bem-sucedidos e teriam destruído ou, no mínimo, imposto um atraso relevante ao programa nuclear iraniano — se os ataques israelenses já haviam imposto alguns anos de atraso ao programa nuclear iraniano, a investida americana agora o empurrou décadas para o passado. Ou seja, o ataque complementa os estragos já causados por Israel, que, além de danificar parte da infraestrutura, também eliminou diversos cientistas envolvidos no desenvolvimento de armamentos para o regime desestabilizador regional (e global).

Na operação, um movimento de distração foi usado para enganar radares civis e rastreadores de voo, enquanto o maior deslocamento já feito de bombardeiros furtivos B-2 lançava mísseis sobre as instalações subterrâneas. Foram 37 horas de missão, com 125 aeronaves, mísseis Tomahawk lançados por submarino e uma precisão milimétrica para atingir as camadas mais protegidas do programa atômico iraniano. Se, por um lado, a missão causou dano severo às capacidades conhecidas do Irã, por outro, ela também abriu um novo jogo: o desafio agora será mapear o que restou.

As atenções se voltam inevitavelmente para o Estreito de Ormuz, gargalo geográfico que conecta o Golfo Pérsico ao resto do mundo e por onde trafega cerca de 20% do petróleo global. Em resposta aos ataques, o Parlamento iraniano votou pelo fechamento do estreito, ainda que a decisão esteja longe de ser exequível na prática. Num cenário menos dramático, é mais provável que Teerã opte por “assediar” embarcações comerciais, elevando o risco logístico e o custo do frete global, sem necessariamente desencadear um confronto direto. Ainda assim, o preço do petróleo já começa a incorporar um prêmio de risco. A ameaça de interrupção é real, mas não definitiva — até porque o Irã também precisa exportar petróleo para manter seu regime.

É verdade que ameaças de fechar Ormuz não são novidade e que, do ponto de vista operacional, o Irã teria condições de bloquear temporariamente o estreito. Mas manter esse bloqueio seria custoso, improvável e, no limite, autodestrutivo, dada a presença dominante frota americana baseada no Bahrein e equipada para garantir a segurança da rota. Um passo além nessa escalada — como o fechamento formal do estreito — pode, ironicamente, acelerar o colapso de um regime que já cambaleia. 

· 01:47 — Enquanto isso, no Brasil…

No cenário doméstico, a dor de cabeça envolvendo o aumento do IOF permanece sem solução. Diante da resistência generalizada, o Congresso pautou com urgência a votação de um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) com o objetivo de derrubar a medida provisória do governo. Ainda assim, ofereceu ao Executivo um prazo de duas semanas para apresentar uma alternativa viável — empurrando a votação do PDL para julho. Trata-se, na prática, de uma tentativa de conciliação. Enquanto isso, os mercados digerem mal o recado austero transmitido na última decisão do Copom, que elevou a Selic para 15% ao ano e deixou claro que a porta para o início de um ciclo de cortes de juros permanece, por ora, trancada. O resultado foi uma ressaca pós-feriado: o Ibovespa recuou, o dólar subiu e os juros curtos abriram, numa clara demonstração de que o BC não apenas fracassou na tentativa de reancorar expectativas — como pretendia — como também adicionou mais peso a uma economia real já fatigada (com juros nesse nível por tanto tempo, não são poucos os que ficarão pelo caminho).

Ainda assim, permanece em aberto uma trilha mais construtiva, guiada por dois vetores possíveis de valorização: a continuidade de um pouco de fluxo global em direção a alguns mercados emergentes e a crescente probabilidade de um realinhamento político em 2026 — cada vez mais visto como o ponto de inflexão da atual dinâmica fiscal e econômica. O caminho, claro, não será linear. Mas uma eventual conjunção entre uma janela eleitoral favorável e o início de cortes de juros entre dezembro de 2025 e março de 2026 pode muito bem servir como catalisador para uma reprecificação significativa dos ativos brasileiros. Na agenda econômica, a ata do Copom, que será divulgada na terça-feira (24), deve oferecer pistas adicionais sobre a reunião que elevou os juros na semana passada. Na sexta-feira (27), os destaques ficam por conta do IPCA-15 de junho, do Caged e da taxa de desemprego do IBGE — indicadores que devem lançar luz sobre a dinâmica recente de preços e atividade econômica no país.

· 02:36 — O que ele tem a nos dizer?

Nos EUA, retornamos de uma semana encurtada pelo feriado — e, dadas as circunstâncias, o desfecho não foi dos piores. Mesmo sob a sombra da possível entrada direta dos EUA no conflito no Oriente Médio, os principais índices acionários conseguiram manter-se em níveis elevados, sustentados por uma surpreendente resiliência do apetite por risco. Mas o alívio pode ser apenas temporário: a semana reserva novos testes de nervos para os mercados, com destaque para a ida de Jerome Powell ao Capitólio na terça e quarta-feira. O presidente do Federal Reserve apresentará ao Congresso o Relatório Semestral de Política Monetária — ocasião em que, mais do que o texto lido, a atenção se voltará para cada palavra em suas respostas aos parlamentares, diante de uma inflação que ainda se mostra desafiadora.

Além disso, teremos o aguardado PCE, índice de inflação favorito do Fed, que pode reorientar expectativas de juros com ainda mais força do que os discursos de Powell. Tudo isso ocorre em meio a um pano de fundo político cada vez mais tumultuado: no front fiscal, os republicanos do Senado apresentaram uma proposta de reforma tributária que projeta um aumento de US$ 3,4 trilhões na dívida pública americana — um movimento que, se levado adiante, adicionaria ainda mais lenha à fogueira da fragilidade fiscal dos EUA. Com a credibilidade da política monetária sendo posta à prova e a solvência das contas públicas novamente em debate, o investidor deve manter o cinto apertado: a travessia promete ser tudo, menos suave.

· 03:24 — Robotaxis

Os robotáxis da Tesla finalmente começaram a circular — de forma limitada e com supervisão — pelas ruas de Austin, no Texas. O lançamento do serviço de transporte autônomo, inicialmente disponível apenas para convidados, ocorreu no fim de semana, com viagens restritas a uma área geocercada da cidade. Os primeiros relatos descrevem a experiência com adjetivos como “tranquila” e “ótima”. Embora Elon Musk tenha afirmado, ainda em janeiro, que os veículos operariam sem qualquer supervisão humana, os carros contam com monitores de segurança contratados pela Tesla, que verificam a identidade dos passageiros na entrada e, ao que tudo indica, foram instruídos a manter o silêncio absoluto durante o trajeto. Por ora, a frota conta com cerca de 20 Model Y adaptados, ostentando uma identidade visual própria. Já o tão aguardado Cybercab totalmente autônomo ficou para 2026 — pelo menos.

O mercado, por sua vez, reage com o misto habitual de entusiasmo e ceticismo. Alguns investidores já projetam que a era do robotáxi pode dobrar o valor de mercado da Tesla para US$ 2 trilhões até o fim de 2026, uma aposta ousada, mas não inédita entre os entusiastas de Musk. A questão, porém, é que a Tesla chega atrasada a uma festa em andamento: a Waymo, do Google (Alphabet), opera atualmente cerca de 1.500 táxis autônomos em cidades como São Francisco, Phoenix, Los Angeles e a própria Austin. Já a Zoox, da Amazon, também avança com seus veículos em São Francisco e Las Vegas. A diferença, segundo a Tesla, estaria no modelo de negócios: mais enxuto e escalável. Mas, como de costume, Musk confia que pode vencer mesmo quando parte atrás. A história já provou que subestimá-lo é perigoso. Eu não duvido de nada…

· 04:11 — Ruídos da Nova Guerra Fria

A ofensiva liderada por Israel — agora com o apoio explícito dos Estados Unidos — para desmantelar o programa nuclear iraniano escancarou mais uma rachadura no já desgastado tabuleiro da geopolítica global: o aprofundamento das tensões entre Washington e Pequim. De um lado, Xi Jinping se diz “profundamente preocupado” com o agravamento da segurança no Oriente Médio, ecoando a posição de seus diplomatas, que classificaram o ataque israelense como uma “violação do direito internacional”. Do outro lado do mundo, Trump não se deu ao trabalho da sutileza: ao ser questionado sobre o aiatolá Ali Khamenei, afirmou que “não o mataria — por enquanto” e exigiu a rendição completa do Irã. Tipo de retórica que dispensa tradução.

A aproximação entre China e Irã não chega a ser surpreendente — é a simetria clássica da geopolítica: enquanto os EUA sustentam há décadas seu apoio irrestrito a Israel, Pequim consolida sua aliança estratégica com Teerã. Em 2021, os dois países assinaram um ambicioso acordo de investimentos de US$ 400 bilhões, seguido da mediação chinesa na reaproximação entre Irã e Arábia Saudita. Hoje, mais de 90% das exportações de petróleo iraniano têm a China como destino, em uma clara afronta ao embargo americano. Mas essa aliança vai além da economia. Xi tem investido capital político real ao trazer o Irã para dentro da esfera institucional chinesa, acolhendo-o na Organização de Cooperação de Xangai e, mais recentemente, no BRICS+. Isso não significa, claro, que a China se moverá para salvar o Irã de forma aberta — mas deixa claro que o mundo se reorganiza em blocos rivais. Em pleno 2025, o termo “Nova Guerra Fria” já não parece mais um exagero jornalístico. É uma descrição técnica.

· 05:09 — Se preparando para a Nova Corrida Armamentista Global

Tenho alertado, já há mais de um ano, que estamos no meio de uma nova corrida armamentista — mais veloz, mais sofisticada, mais custosa e, sobretudo, mais perigosa do que qualquer outra desde a queda do Muro de Berlim. Em 2024, os gastos militares globais bateram um novo recorde: US$ 2,7 trilhões. Trata-se do maior salto anual desde o fim da Guerra Fria…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.