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O rebaixamento da nota de crédito dos EUA pela Moody’s até tentou azedar o humor dos mercados ontem (19), mas a reação inicial — negativa, como esperado — foi aos poucos perdendo força. Ao fim do dia, os principais índices globais conseguiram encontrar algum equilíbrio, encerrando a sessão com um tom menos amargo do que a abertura sugeria. Já nesta terça-feira (20), os futuros americanos voltam a mostrar fragilidade, enquanto a Ásia fechou no azul e a Europa segue, por ora, na mesma toada. No caso asiático, o corte de juros promovido pelo banco central chinês levou as taxas para mínimas históricas, num gesto claro de que Pequim pretende reforçar os estímulos monetários. Ainda assim, o movimento foi recebido com um misto de alívio e frustração: os investidores continuam esperando medidas fiscais mais contundentes, especialmente aquelas que possam destravar o consumo — a trava do crescimento.
No radar internacional, o dia será tecnicamente fraco, com destaque apenas para o índice de confiança na Zona do Euro e possíveis declarações de dirigentes do Fed. Mas, no pano de fundo, a preocupação segue firme: os mercados ainda digerem o novo capítulo da novela fiscal americana, agora com o selo oficial da Moody’s marcando o colapso do triplo A. Enquanto isso, o Brasil continua surfando a maré da rotação regional de portfólio, com fluxo para emergentes descontados e valorização de ativos locais. O ambiente externo continua desafiador, mas, paradoxalmente, seguimos entre os beneficiários — desde que não inventemos de piorar por conta própria.
· 00:54 — O downgrade é deles e o all-time high é nosso
Enquanto a agenda local traz apenas o IGP-M como destaque do dia, o pano de fundo continua sendo generosamente favorável aos ativos brasileiros. A crise fiscal dos EUA voltou a jogar a nosso favor, incentivando nova rodada de entrada de capital estrangeiro, em linha com o movimento de rotação já impulsionado pela guerra tarifária. O resultado foi um Ibovespa testando nova máxima histórica, dólar e juros futuros em queda, e investidores animados também com a leitura “dovish” dos comentários de Galípolo, que reforçaram a ideia de fim do ciclo de alta da Selic. A barreira dos 140 mil pontos chegou a ser rompida, mesmo que o índice tenha fechado um pouco abaixo.
Dois pontos merecem atenção. Primeiro, o governo segue acelerando o ritmo da economia mesmo com os freios do aperto monetário acionados — e está conseguindo algum sucesso nisso. O IBC-Br de março veio bem acima do esperado, com agro e indústria puxando o número e gerando revisão altista nas projeções de PIB do primeiro trimestre. A própria Secretaria de Política Econômica atualizou suas estimativas para cima — tanto em crescimento quanto em inflação. Soma-se a isso uma temporada de resultados que veio, até aqui, melhor do que o temido. A conclusão? O Banco Central teria argumentos técnicos para subir ainda mais os juros. Mas não o fará. O mais provável é que pare em 14,75% ou, talvez, entregue uma alta residual para 15% e segure o patamar por mais tempo — uma estratégia de “wait and hope”.
Essa perspectiva de fim do ciclo de alta anima o investidor. Ganha-se tempo. Com o fluxo externo favorecido pela busca por emergentes, os valuations ainda atraentes e um posicionamento global subalocado, o mercado brasileiro se beneficia — sobretudo com a aposta de que o pêndulo político pode mudar a partir de 2026, abrindo espaço para um ajuste fiscal em 2027. Ainda que a rota até lá seja acidentada, o destino pode compensar. No curto prazo, porém, a realidade fiscal segue difícil. O mercado aguarda para esta semana o Relatório Bimestral de Receitas e Despesas. O problema é que, em vez de sinalizar responsabilidade, o governo parece disposto a dobrar a aposta.
Em meio ao escândalo do INSS, o Planalto se vê acuado — e a reação tem sido previsível: ampliar benefícios e estímulos de viés claramente populista. Haddad nega tudo, como de costume, mas o mercado já entendeu o enredo. É mais uma tentativa de sustentar artificialmente o crescimento, via consumo e crédito, num país onde quase metade da população adulta está inadimplente e a dívida média ultrapassa os R$ 1.500. Pode gerar crescimento, mas é insustentável e pouco saudável. A travessia até 2026 promete ser turbulenta. Mas, por ora, o mercado parece disposto a seguir surfando o otimismo, mas com a mão próxima do botão de pânico.
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· 01:41 — A percepção fiscal importa?
Nos EUA, o agravamento das contas públicas voltou ao centro do radar global. A percepção de que a trajetória da dívida americana é insustentável — e de que ninguém em Washington parece disposto a lidar com isso — começa a corroer a confiança no dólar, que se enfraqueceu frente a outras moedas ao redor do mundo. Ainda assim, em mais um daqueles episódios típicos do mercado, as bolsas abriram a semana em alta. Nem mesmo o rebaixamento da nota de crédito dos EUA pela Moody’s — a última das grandes agências a cortar o tão simbólico triplo A — foi suficiente para mudar o humor.
Houve uma oscilação no começo do pregão, claro, mas logo os investidores voltaram à rotina. A leitura predominante é que o corte de rating foi mais uma formalização do óbvio do que uma revelação incômoda. As contas públicas americanas estão desequilibradas há tempos — o rebaixamento apenas confirmou o que os mercados já vinham precificando em silêncio. O déficit fiscal, como sempre, continua sendo um problema adiado: todos sabem que ele está lá, mas ninguém quer lidar com ele agora.
Por enquanto, o foco segue sendo o final da temporada de resultados. Em outras palavras, enquanto as empresas ainda entregarem lucros decentes e os ventos globais soprarem com alguma calma, o mercado está disposto a ignorar o elefante na sala. Mas vale o alerta: déficits nunca importam… até o dia em que importam. E esse dia, embora ainda possa parecer distante, está se aproximando a passos largos.
· 02:35 — One big beautiful bill
Os republicanos no Congresso flertam com um desastre fiscal em potencial ao insistirem em cortes de impostos abrangentes. Mas e se a economia entrar em recessão? Hoje, os EUA já operam com um déficit de 6,4% do PIB — cerca de US$ 2,4 trilhões. Mas esse número pode escalar rapidamente para algo próximo a US$ 4 trilhões caso o país enfrente uma desaceleração mais severa. O problema central é que o pacote atual de cortes tributários proposto pelos Republicanos parte da premissa de que o crescimento econômico será estável — pode soar otimista demais a depender do desfecho das próximas semanas de negociações comerciais.
Historicamente, recessões fazem os déficits explodirem: a arrecadação fiscal desaba enquanto os gastos com benefícios sociais aumentam. E isso não é teoria — é o padrão das últimas cinco ou seis recessões americanas. Em meio a esse cenário, as discussões sobre o novo pacote fiscal do presidente Trump seguem no Congresso. O Comitê Conjunto de Tributação estima que o custo da proposta será de US$ 3,8 trilhões na próxima década. Já o Comitê para um Orçamento Federal Responsável é menos diplomático: projeta um impacto fiscal ainda mais desastroso.
A confusão política só aumenta. Scott Bessent, apontado como possível figura de equilíbrio no time de Trump, mal consegue manter o foco em negociações comerciais. Desde o início de abril, com Besset precisando focar em outra coisa, a condução tem sido errática e o Congresso parece perdido entre prioridades que mudam ao sabor das manchetes. Assim, os juros dos Treasuries de longo prazo seguem em alta, refletindo a crescente preocupação com a saúde fiscal americana — o rendimento do título de 30 anos passou de 5% na segunda-feira. Vale lembrar: na década de 1990, foi justamente a escalada dos yields que forçou Washington a levar o ajuste fiscal a sério. Mas esse tipo de pressão tem um preço — para o Tesouro, para o mercado, e, inevitavelmente, para a economia como um todo. O custo do improviso, como sempre, vem com juros.
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· 03:26 — Tempo jogado no lixo?
O presidente Donald Trump afirmou que Rússia e Ucrânia estariam prestes a iniciar negociações de cessar-fogo, motivadas por uma longa ligação telefônica de duas horas que manteve com Vladimir Putin na véspera. Embora tenha classificado a conversa como “excelente”, a verdade é que nenhum acordo concreto emergiu da troca. O tom triunfalista de Trump contrasta com a realidade: não houve avanço imediato.
Aliás, apesar da retórica habitual, Trump deu sinais de recuo quanto ao papel direto dos EUA como mediador no conflito, insinuando que as conversas seriam conduzidas entre Moscou e Kiev — com Washington assumindo um papel mais lateral. Do lado russo, Putin soou menos entusiasmado, sem qualquer sinalização concreta.
Ainda que uma eventual trégua traga implicações econômicas de médio prazo — especialmente ligadas à reconstrução da Ucrânia —, o impacto imediato para os mercados globais tende a ser limitado. A dinâmica geopolítica segue marcada pela incerteza, e qualquer euforia prematura deve ser vista com cautela.
· 04:17 — Avanço promissor no Velho Mundo
O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, firmou um novo entendimento com a União Europeia que sinaliza um degelo nas relações pós-Brexit. O acordo estabelece as bases para uma cooperação mais estreita entre Londres e Bruxelas, incluindo a remoção da maioria dos controles de fronteira sobre alimentos e produtos agrícolas, além do compromisso de discutir o acesso do Reino Unido ao fundo europeu de defesa, avaliado em US$169 bilhões. Em outras palavras, depois de anos de atrito, as duas partes começam a admitir que um pouco de pragmatismo não faz mal.
Entre os pontos mais espinhosos do acordo está a extensão dos direitos de pesca a embarcações europeias — tema que, embora economicamente irrelevante, permanece um símbolo político (para eleições). A decisão de ceder nessa frente representa um risco real para o Partido Trabalhista, que já sente o avanço do Reform UK, de Nigel Farage, nas pesquisas. A retórica soberanista da era Brexit ainda ressoa, e qualquer aceno a Bruxelas é visto por parte do eleitorado como traição à causa nacional.
Para Starmer, no entanto, o cálculo é claro: a economia britânica precisa respirar. O governo aposta que aliviar barreiras comerciais com a UE pode ajudar a destravar o crescimento anêmico, especialmente para os exportadores. As estimativas oficiais indicam um acréscimo modesto de US$ 12 bilhões ao PIB até 2040 — algo em torno de 0,2% de crescimento adicional. Nada revolucionário, mas é o que se pode esperar de uma economia que ainda lida com os efeitos colaterais de um divórcio mal resolvido com o maior bloco econômico do mundo. Ao menos temos um início de reconciliação.
· 05:08 — Bons sinais da temporada do outro lado do planeta
A gigante chinesa Alibaba (NYSE: BABA; B3: BABA34) divulgou seus resultados referentes ao trimestre encerrado em março de 2025, confirmando o que já vínhamos acompanhando: a companhia entrou, de vez, em uma nova fase — menos obcecada por crescimento a qualquer custo e mais voltada à rentabilidade, inovação e retorno ao acionista.
Ainda assim, o mercado torceu o nariz para os números, reagindo mal ao lucro líquido contábil abaixo do esperado, contaminado por ajustes não recorrentes. A pergunta que paira no ar, depois de uma alta de 44% em dólares no ano, é inevitável: ainda vale a pena manter exposição?