
Imagem: iStock/ Dilok Klaisataporn
A reação contida do governo brasileiro à tarifa de 50% imposta por Trump trouxe certo alívio aos mercados, que haviam iniciado o dia em clima de forte tensão. Com o Planalto sinalizando que não pretende responder de imediato — ao menos até o prazo oficial de 1º de agosto —, os investidores respiraram mais tranquilos e o pregão se acomodou ao longo do dia. Resta saber se o bom senso vai perdurar nas negociações diplomáticas, já que a relação entre Brasil e Estados Unidos, que há tempos oscila entre pragmatismo e tropeços ideológicos, agora caminha em terreno minado. Ontem (10), comentei em detalhes o movimento tarifário dos EUA contra o Brasil — se você perdeu, clique aqui para acessar. Dado o aprofundamento de ontem, hoje serei mais conciso.
O grande risco segue sendo o da reciprocidade. Caso o Brasil decida revidar com tarifas próprias, abre-se uma janela para a escalada do conflito comercial — e aquilo que hoje é percebido como uma tempestade limitada contornável pode se transformar em um furacão de consequências mais sérias para os ativos brasileiros. Felizmente, por ora, o Planalto resistiu à tentação de devolver na mesma moeda, o que seria, convenhamos, o pior dos mundos. O mercado agradece a moderação. A aposta crescente agora é que Trump volte atrás — um padrão já conhecido e recorrente em sua cartilha de negociação, onde a ameaça costuma preceder a meia-volta estratégica.
O pano de fundo global, contudo, permanece conturbado. Trump decidiu mirar também no Canadá, impondo uma tarifa de 35% sobre produtos do vizinho do norte, e deve anunciar ainda hoje novas tarifas direcionadas à União Europeia — fator que, não por acaso, pressiona as bolsas europeias nesta manhã. Na Ásia, o dia foi misto: as bolsas chinesas conseguiram fechar em leve alta, ao contrário de Tóquio e Seul, que encerraram no vermelho. Entre as commodities, o petróleo subiu diante da combinação entre novas sanções dos EUA ao óleo russo e rumores de que a Arábia Saudita e outros membros da OPEP+ estudam pausar o aumento na produção após o mês que vem. E, no mercado de criptoativos, o Bitcoin voltou a roubar os holofotes: atingiu novo pico e se aproxima rapidamente da impressionante marca dos 120 mil dólares.
· 00:52 — Depois do coice, vem a conversa: agora, calma e jogo de cintura
No Brasil, o Ibovespa encerrou o pregão em queda, refletindo a apreensão inicial dos investidores diante do novo capítulo da cruzada tarifária de Donald Trump, que desta vez mirou diretamente o Brasil com a imposição de tarifas de 50% sobre nossos produtos. O impacto, no entanto, foi se diluindo ao longo do dia. E isso não aconteceu por acaso — há três razões principais para a acomodação dos mercados.
Em primeiro lugar, existe margem razoável para negociação. Ao contrário da retórica trumpista, os Estados Unidos não possuem déficit comercial com o Brasil — muito pelo contrário. Nos últimos 15 anos, acumulamos um déficit de aproximadamente US$ 415 bilhões com os americanos. Essa assimetria abre espaço para tratativas à moda da atual Casa Branca: ameaça-se alto, mas se negocia abaixo. Em segundo lugar, como já comentei (clique aqui para relembrar), o impacto econômico direto da medida é limitado, ao menos no agregado. As exportações brasileiras aos EUA representam apenas cerca de 2% do nosso PIB. Por fim, a própria composição da pauta exportadora permite diferenciar com alguma clareza os setores mais vulneráveis daqueles que tendem a resistir melhor ao choque. A Embraer (EMBR3), por exemplo, sentiu o baque, dado seu alto grau de exposição ao mercado americano. Por outro lado, segmentos como petróleo, aço, alimentos e agronegócio devem sofrer menos, principalmente por conta da capacidade de redirecionar parte da produção para outros destinos.
É verdade, claro, que há divergências. Algumas vozes relevantes têm alertado para o risco de relativizar o impacto econômico. É uma ponderação legítima. No entanto, meu entendimento é que, desde que o Brasil evite cair na tentação de escalar o conflito com uma retórica ruidosa de retaliação, há espaço real para uma mitigação dos danos. Alguns setores vão, sim, sentir mais — mas não há, por ora, elementos para supor um estrago generalizado. Justamente por isso, seria imprudente insistir em gestos performáticos agressivos, como a reciprocidade tarifária. Já vimos o que esse tipo de beligerância política nos trouxe. É hora de deixar a diplomacia técnica do Itamaraty conduzir o processo com a serenidade e firmeza que a situação exige — naturalmente, uma negociação só será possível se a questão político-ideológica for deixada de lado.
Nesse sentido, o governo brasileiro parece ter optado por esperar a poeira baixar e usar o relógio até o prazo final de 1º de agosto como instrumento de pressão suave, na esperança de que Trump recue (como já o fez tantas vezes). No pano de fundo, o barulho também é político. Há quem argumente que, no curtíssimo prazo, o episódio até reforça a imagem de Lula como defensor da soberania nacional. Não é impossível. De fato, aliados do ex-presidente Bolsonaro já cogitam apelar diretamente a Trump para reverter a tarifa — o que apenas reforça o grau de polarização que 2026 já começou a carregar. Mas, sejamos claros: esse efeito positivo para Lula deve ser pontual e não deve alterar de forma substancial a trajetória do cenário eleitoral.
A contaminação político-partidária do tema, aliás, já provocou atrasos na reação institucional. Os presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta e Davi Alcolumbre, só se manifestaram ontem à tarde — por meio de uma nota conjunta defendendo o uso da Lei de Reciprocidade Econômica. É um movimento mais retórico do que prático, até porque uma reação tarifária brasileira apenas alimentaria a sanha protecionista de Trump, que sabe escalar conflitos como poucos. A tendência é que esse discurso seja mantido apenas como instrumento de barganha, até que alguma negociação avance.
E tudo isso ainda acontece em meio a um cenário doméstico que já não é simples: o governo segue com pautas relevantes travadas no Congresso — da substituição do IOF à revisão de incentivos fiscais, passando por medidas de arrecadação e o projeto de isenção do IR. A tempestade tarifária chegou, mas não sozinha. E enquanto ela passa, é preciso não perder de vista os nós internos que continuam sem desatar.
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· 01:45 — O mundo virou alvo: Trump aperta o botão tarifário sem pensar duas vezes
Estamos no meio do que pode ser descrito como a etapa mais ruidosa da atual cruzada tarifária de Donald Trump. O ambiente segue carregado de tensão e novos ruídos nas negociações devem continuar provocando volatilidade de curto prazo. O episódio mais recente veio na noite de ontem, com Trump ameaçando impor tarifas de 35% sobre determinados produtos canadenses a partir de 1º de agosto, mirando nada menos que um dos maiores parceiros comerciais dos Estados Unidos. Isso, vale lembrar, apesar das concessões que o Canadá já havia feito na questão dos impostos digitais — ou seja, mesmo quem cede não escapa. Ainda não está claro se a nova tarifa abrangerá todos os produtos canadenses ou apenas os que estão fora do escopo do USMCA (o antigo NAFTA), atualmente tarifados em 25%, ou se se estenderá ao petróleo, que hoje sofre uma tarifa de 10%. A política comercial dos EUA sob Trump tornou-se um jogo de blefes agressivos, muitas vezes desconectados de qualquer lógica econômica.
É importante lembrar que a maioria dessas tarifas, quando efetivamente aplicadas, tende a impactar os consumidores americanos com uma certa defasagem temporal — geralmente alguns meses. Mas tarifas sobre alimentos e combustíveis, caso venham, seriam sentidas de forma muito mais imediata e dolorosa, inclusive com potencial para alimentar a inflação num momento delicado. Aqui, entra o paradoxo que desafia os mercados: os investidores seguem confiantes de que Trump vai recuar — como já fez em inúmeras ocasiões anteriores. Essa expectativa alimenta os preços dos ativos. Mas, justamente por manter os mercados em alta, essa mesma confiança reduz o custo político de Trump manter sua postura beligerante. Ou seja, os mercados apostam no recuo… e isso pode ser exatamente o que o mantém firme.
No radar de hoje, a próxima peça do tabuleiro: a aguardada carta de Trump direcionada à União Europeia, com novos termos sobre impostos comerciais. O mercado acompanhará de perto não apenas o conteúdo da ameaça americana, mas principalmente os sinais de como Bruxelas pretende responder. Uma escalada retaliatória com o bloco europeu teria peso bem diferente do embate com o Canadá — e pode mudar o tom das apostas em risco global.
· 02:32 — E ainda assim, temos diluição do risco…
Nos EUA, o mercado acionário parece ter entrado em modo celebração. Uma recuperação ampla dos ativos, puxada principalmente pela febre da Inteligência Artificial, levou dois dos três principais índices americanos a novos recordes históricos de fechamento ontem. A exuberância não é modesta: as ações ligadas à IA continuam em escalada vertiginosa, com o ETF iShares Semiconductor subindo 1% e a Nvidia cravando um novo marco — ultrapassou pela primeira vez a marca de US$ 4 trilhões em valor de mercado, tornando-se não só a primeira empresa americana a atingir esse patamar, mas também a primeira a encerrar o dia nesse nível.
Mas seria um erro atribuir toda a alta ao frenesi da IA. O avanço foi generalizado: nove dos onze principais setores do S&P 500 fecharam no azul, sendo que oito deles subiram mais de 0,5%. Há claramente uma ampliação da performance para além das “queridinhas da tecnologia”, sugerindo uma rotação saudável e uma recuperação mais disseminada. O investidor, ao que tudo indica, está disposto a ignorar — por ora — o ruído geopolítico e as ameaças tarifárias de Donald Trump, incluindo a já famosa leva de tarifas programadas para entrar em vigor em 1º de agosto. O mercado simplesmente escolheu não se importar com a possibilidade de preços mais altos ou com o risco de uma desaceleração econômica à frente.
O reflexo disso pode ser observado no VIX, o índice de volatilidade da CBOE, que caiu para 15,78 — o menor nível desde fevereiro. Em outras palavras, a sensação de risco evaporou. A comparação mais próxima? Lembra muito o cenário do ano passado, quando o Nasdaq surfava uma alta animadora antes da temporada de resultados do segundo trimestre em julho. O investidor, ao que parece, voltou a apostar no melhor dos mundos — e o mercado, por enquanto, está comprando essa narrativa.
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· 03:26 — Renúncia no feudo de Musk
Em mais um capítulo da rotina multitarefa de Elon Musk, a CEO da X — a plataforma anteriormente conhecida como Twitter — anunciou sua renúncia. Linda Yaccarino, que ocupava o cargo havia dois anos, saiu sob o manto de uma “reviravolta histórica nos negócios”, segundo suas próprias palavras. A saída de Yaccarino ocorre em um momento sensível: a X acaba de ser fundida à xAI, a empreitada de inteligência artificial de Musk — um movimento que levanta a suspeita de que a saída tenha menos a ver com realizações históricas e mais com mudanças de rota estratégicas.
Naturalmente, qualquer movimentação em uma das empresas do bilionário atrai escrutínio redobrado — afinal, estamos falando de alguém que, além de comandar a X e a xAI, também lidera a Tesla, a SpaceX, a The Boring Company e a Neuralink. A saída de Yaccarino, portanto, acrescenta mais uma bola para Musk equilibrar no ar. E, como qualquer equilibrista sabe, uma a mais pode ser justamente a que desestabiliza tudo. No caso de Musk, é cada vez mais difícil distinguir se estamos diante de genialidade visionária ou de pura sobrecarga operacional. De qualquer forma, para os investidores, o risco de dispersão e de execução mal calibrada é real.
· 04:11 — O mundo não pertence aos incumbentes moderados, aparentemente
Há pouco mais de um ano, Keir Starmer subiu as escadas do número 10 da Downing Street com a promessa de restaurar a sobriedade institucional. A vitória foi contundente: maioria de 174 cadeiras no Parlamento e um Partido Conservador vindo da pior eleição de sua história. Starmer parecia ter nas mãos todas as cartas para reposicionar o Reino Unido no tabuleiro global — e com uma agenda centrista, moderada, bem distinta do trabalhismo radical sob Jeremy Corbyn.
Mas do entusiasmo inicial à realidade política, o caminho revelou-se ingrato. Desde o início de seu mandato, o premiê vem acumulando tropeços. O mais recente foi a derrota humilhante de uma proposta central de seu governo: a reforma do sistema de previdência social. Starmer não conseguiu apoio nem dentro de seu próprio partido para endurecer critérios de concessão de benefícios por invalidez. A esquerda trabalhista reagiu com força. O resultado foi a implosão de uma medida que se mostrava necessária do ponto de vista fiscal — e que serve como espelho de um dilema global: todo mundo precisa ajustar os gastos, mas ninguém quer pagar a conta.
A derrota veio na esteira de meses de frustração econômica. O Reino Unido, atolado em estagnação crônica desde o Brexit, continua sem sinal de recuperação consistente. As tímidas tentativas de reanimar o crescimento naufragaram entre as amarras fiscais e a inércia estrutural. Mesmo os acertos do governo — como os acordos comerciais firmados com os Estados Unidos e a Índia — mal encontraram espaço no noticiário, soterrados por uma percepção de paralisia e ineficácia.
O custo político está sendo brutal. As pesquisas mais recentes mostram o Partido Trabalhista com meros 24% das intenções de voto, enquanto o índice de aprovação líquida de Starmer despencou para -40 — um número que, em qualquer democracia, cheira a colapso iminente. O recado é claro: o eleitorado está impaciente, e o centro político, que um dia foi símbolo de racionalidade e estabilidade, tornou-se um alvo fácil tanto para a direita populista quanto para a esquerda radical.
O caso de Starmer escancara um problema maior enfrentado por partidos moderados ao redor do mundo. Eles operam como tecnocratas dentro de sistemas que os eleitores passaram a considerar quebrados, oferecendo soluções milimétricas para problemas estruturais, enquanto o ambiente exige narrativas contundentes e gestos de ruptura. É o paradoxo da política contemporânea: para ser eleito, é preciso ocupar o centro; mas, uma vez no poder, tentar governar a partir dele leva à erosão do capital político, porque ninguém mais se satisfaz com reformas mornas e consensos desgastados.
O mundo de hoje castiga os incumbentes, especialmente os que se recusam a gritar. A moderação virou sinônimo de fraqueza, e a construção institucional, de lentidão. Keir Starmer é, nesse sentido, mais um personagem em um enredo que já virou tendência: o centrismo está à deriva, tentando navegar em um mar que já não reconhece bússolas. Ao menos, a rejeição ao incumbente reforça nossa tese de que o pêndulo político continua girando — e pode girar também no Brasil nas eleições de 2026.
· 05:04 — US$ 4 trilhões
A disparada das ações da Nvidia atingiu mais um patamar histórico. A gigante dos semicondutores tornou-se a primeira empresa listada a ultrapassar a marca de US$ 4 trilhões em valor de mercado, superando até mesmo a Apple. Para se ter uma ideia da escala, a maior capitalização já registrada pela fabricante do iPhone havia sido de US$ 3,9 trilhões, no fim de dezembro de 2023 — marca que agora parece distante, dado que a própria Apple ronda atualmente os US$ 3,15 trilhões.
Fundada em 1993 por Jensen Huang, a Nvidia nasceu como um nicho entre gamers entusiastas. Durante anos, foi…