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IPCA-15 de maio, índice de sentimento econômico da Zona do Euro e dados de confiança do consumidor nos EUA estão entre os destaques desta terça-feira (27); veja mais

Mercados internacionais ensaiam recuperação e EUA voltam de feriado morno após recuo de tarifas de Trump.

Por Matheus Spiess

27 maio 2025, 09:20 - atualizado em 27 maio 2025, 09:20

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Na volta do feriado de Memorial Day, os mercados internacionais ensaiam uma recuperação, embalados pelo recuo estratégico de Donald Trump, que decidiu adiar para julho o aumento das tarifas sobre produtos da União Europeia. A medida, ainda que temporária, foi suficiente para destravar o apetite por risco e aliviar parte das tensões comerciais acumuladas na última semana. As bolsas europeias avançaram com força, lideradas pelo setor de defesa, impulsionado pela ameaça paralela de sanções adicionais contra a Rússia. A Bolsa alemã, inclusive, renovou sua máxima histórica — validação prática de uma tese que temos destacado recorrentemente.

O movimento ganha contornos ainda mais significativos diante do crescente desconforto com o cenário fiscal e geopolítico dos Estados Unidos, que começa a deslocar fluxos para ativos fora do eixo americano. Do outro lado do mundo, no Japão, os mercados reagiram positivamente à possível redução da emissão de títulos de longo prazo, aliviando a curva de juros local e enfraquecendo o iene — movimento que favorece os setores voltados à exportação e ajuda a recompor as perdas recentes.

Na agenda do dia, os investidores monitoram o índice de sentimento econômico da Zona do Euro e os dados de confiança do consumidor nos EUA, ambos importantes para calibrar expectativas em relação à atividade e à política monetária. Nas commodities, o petróleo sobe levemente, com os mercados preferindo focar no alívio tarifário momentâneo em vez das incertezas envolvendo a reunião da Opep+. 

· 00:56 — De onde virá o dinheiro?

A semana começou com os ativos brasileiros em alta, embalados por um ambiente externo de baixa liquidez — reflexo do feriado nos Estados Unidos — e pela expectativa em torno da divulgação do IPCA-15 de maio, prevista para hoje (27). A prévia da inflação oficial pode ajudar a balizar melhor os próximos passos do Banco Central, já que há crescente expectativa de encerramento do ciclo de aperto monetário. A estimativa é de leve aceleração, de 0,43% para 0,44% na variação mensal, e de 5,5% na comparação anual. Mesmo que venha uma surpresa altista, dificilmente haverá mudança relevante nas apostas de política monetária: com o episódio do IOF ainda fresco na memória, o mercado já enxerga a medida — ainda que revertida em parte — como uma ferramenta de aperto monetário, que alivia, por tabela, o trabalho do BC. E como se não bastasse, teremos nos próximos dias dados de atividade e mercado de trabalho que devem reforçar o ambiente benigno para a autoridade monetária.

Enquanto isso, o cenário político continua rendendo capítulos que beiram o tragicômico. A oposição não perdeu tempo e protocolou a convocação de Fernando Haddad no Congresso, além de um projeto para sustar o decreto que reajustou o IOF. A chance de prosperar é mínima, mas o desgaste político já está contratado. O presidente da Câmara, Hugo Motta, não poupou críticas e escancarou o desconforto com a obsessão arrecadatória de Lula. O diagnóstico é direto: o governo se recusa a enfrentar a raiz do problema, que está nos gastos, e insiste em espremer a receita, mesmo em um país já exausto do ponto de vista tributário. Resultado? Desgaste político crescente e queda na popularidade. E ainda temos um novo buraco fiscal de R$ 2 bilhões, deixado pela reversão parcial da medida. Resta saber se o governo vai tapar esse buraco com mais um contingenciamento ou se tentará outra mágica arrecadatória de curto prazo. Dado o contexto, o primeiro parece mais provável.

O mais curioso é que, mesmo em meio ao ruído, o mercado seguiu subindo. Parte disso se explica pelo efeito indireto da medida do IOF, que reforça o argumento técnico para encerrar o ciclo de alta da Selic. Parte, também, pela aposta de que o atual governo continuará se enfraquecendo politicamente até 2026, fortalecendo a tese de mudança de pêndulo político — com figuras como Tarcísio de Freitas ganhando protagonismo. Por fim, soma-se a esse caldo o desconforto crescente com o cenário fiscal e comercial dos EUA, que tem favorecido a rotação de capital para mercados emergentes. No fim das contas, a combinação de valuation atrativo, fluxo externo positivo e perspectiva de inflexão política mantém os ativos brasileiros resilientes. Mas o investidor precisa saber: essa travessia não será suave. E Brasília segue se esforçando para ser o principal risco de um cenário que tinha tudo para ser promissor.

· 01:41 — Digerindo o recuo

Nos EUA, o retorno do feriado trouxe de volta ao radar dos investidores o vaivém característico da Casa Branca sob Donald Trump. Depois de ameaçar, na sexta-feira (23), impor tarifas de 50% sobre produtos europeus já a partir de junho, o presidente recuou — estendendo o prazo até julho. O movimento é típico: lança-se o choque, mede-se a reação, recua-se parcialmente. Um manual que já está começando a desgastar até os que se beneficiavam da imprevisibilidade como tática de barganha.

O problema é que o ruído deixou sequelas. O dólar americano continua pressionado, oscilando próximo às mínimas recentes frente às principais moedas globais — reflexo direto da crescente incerteza fiscal e da ausência de um plano comercial coerente. A percepção é de que o ambiente econômico americano está cada vez mais vulnerável a solavancos. No radar do dia, os investidores acompanham os dados de pedidos de bens duráveis de abril e o índice de sentimento do consumidor — este último, cada vez mais contaminado pelo viés político. Fala de dirigentes do Fed também está no radar.

· 02:38 — Guerra de capitais?

Do ponto de vista estrutural, os EUA estão jogando um jogo perigoso — e jogando mal. A pergunta que começa a assombrar os investidores mais atentos é se a atual guerra comercial, iniciada com tarifas, pode evoluir para algo ainda mais preocupante: uma guerra de capitais. O risco não é desprezível. Diante da ineficácia parcial das tarifas para conter o déficit gêmeo (fiscal e em conta corrente), ganha corpo a hipótese de que Trump possa recorrer a medidas mais drásticas e repressivas para fechar suas contas.

O raciocínio da Casa Branca é claro, ainda que brutal: se os EUA bancam a segurança global — e atuam como principal obstáculo geopolítico à ascensão da China — nada mais justo do que cobrar por isso. Tarifas seriam só o começo. Caso não surtam efeito, o governo americano pode decidir impor, por exemplo, uma taxa de “uso” sobre os títulos do Tesouro detidos por estrangeiros, ou, ainda mais ousado, forçar a conversão compulsória desses papéis em instrumentos de ultralongo prazo — títulos de 100, 150, até 200 anos. O movimento teria gravíssimas implicações para o sistema financeiro.

A maioria das carteiras globais não está minimamente preparada para operar num ambiente em que a confiança no mercado de dívida soberana americana — pilar da arquitetura financeira mundial nas últimas décadas — esteja sob suspeita. Reavaliar o peso da exposição estrutural aos EUA e buscar alternativas em ativos reais, moedas fortes e geografias mais previsíveis é mais do que prudência: é sobrevivência.

· 03:22 — Perdeu a posição

Depois de mais de três décadas no topo, o Japão acaba de perder o posto de maior credor do planeta — um título que mantinha com firmeza desde 1991. Mesmo com um volume recorde de ativos no exterior, que atingiu US$ 3,7 trilhões ao fim de 2024 (alta de 13% em relação ao ano anterior), os japoneses foram superados pela Alemanha, cujos ativos externos líquidos somaram expressivos US$ 3,95 trilhões. A China, embora ainda distante, fecha o pódio com US$ 3,58 trilhões. Em ienes, o tombo japonês foi ampliado pela valorização de cerca de 5% do euro frente à moeda japonesa no período — o que elevou, em termos nominais relativos, o valor dos ativos alemães.

A virada reflete desequilíbrios econômicos persistentes. A Alemanha vem se beneficiando de um superávit em conta corrente robusto — US$ 282 bilhões no ano passado — alavancado principalmente por sua força industrial e performance comercial, mesmo em meio a um cenário global mais adverso. O Japão, por outro lado, também registrou superávit, mas bem menor: US$ 204 bilhões. Em termos simples, a Alemanha exporta mais, lucra mais e investe melhor seu excedente. A perda de liderança pode parecer simbólica, mas diz muito sobre o novo mapa da hegemonia financeira global. Como tenho falado, a Europa está voltando a ganhar destaque.

· 04:14 — O que virá depois?

Desde o colapso do sistema de Bretton Woods e o abandono do câmbio fixo em 1971, o dólar norte-americano tem oscilado entre longos ciclos seculares de valorização e desvalorização. O mais recente — iniciado após a Crise Financeira Global de 2008 — foi de alta persistente, sustentado por uma combinação poderosa: políticas monetárias agressivas, força institucional relativa e, sobretudo, o desempenho estelar das ações americanas, especialmente das gigantes de tecnologia. Empresas como Apple, Amazon e Microsoft não apenas dominaram os índices domésticos, como passaram a ocupar fatias desproporcionais dos benchmarks globais. Como reflexo, investidores ao redor do mundo passaram os últimos 15 anos aumentando sistematicamente sua exposição ao mercado americano, muitas vezes à custa da diversificação real.

Mas tudo que sobe… pode começar a perder sustentação. A guinada política dos EUA sob Donald Trump está mexendo com os alicerces do regime que sustentou essa hegemonia. A escalada protecionista, os conflitos geopolíticos, os riscos fiscais crescentes e o uso errático da política tarifária como arma de negociação estão minando parte do soft power institucional que fazia dos EUA um porto (relativamente) seguro. E aqui reside o ponto crítico: podemos estar diante do fim de mais um ciclo secular de força do dólar — e, com ele, do outperformance histórico dos ativos americanos. O dólar forte e o equity americano dominante podem ter passado do ponto. Se essa inflexão se confirmar, será uma notícia particularmente boa para ativos emergentes, historicamente favorecidos em ciclos de enfraquecimento do dólar e reequilíbrio de fluxos globais. A janela pode estar se abrindo para o Brasil…

· 05:07 — Proteção espacial

Na semana passada, Donald Trump revelou um plano bilionário para reforçar a defesa dos EUA — desta vez, mirando o espaço. Inspirado no sistema israelense “Iron Dome”, mas rebatizado com o toque de ouro característico do presidente como “Golden Dome”, o projeto prevê uma sofisticada rede de sensores e interceptadores espaciais para detectar e neutralizar ameaças ainda nos estágios iniciais de lançamento. Com orçamento estimado em US$ 175 bilhões e previsão de operação para 2029, o escudo espacial reacende velhos fantasmas da era Reagan, mas agora com um verniz tecnológico mais polido — e com o complexo industrial-militar já esfregando as mãos. 

Empresas como…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.