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O que o mercado de trabalho americano ainda tem a dizer sobre os juros? Veja os destaques desta quinta-feira (3)

As bolsas internacionais se preparam para dias mais parados, às vésperas do feriado de 4 de julho nos EUA.

Por Matheus Spiess

03 jul 2025, 09:39 - atualizado em 17 jul 2025, 16:04

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Imagem: iStock/Edson Souza

O mercado abre hoje (3) de olho na divulgação do relatório de payroll de junho — o indicador mais aguardado da semana. Um número mais fraco que o consenso pode reforçar a expectativa de corte de juros nos EUA no segundo semestre, sobretudo após o relatório ADP de ontem (2) mostrar a eliminação de 33 mil vagas no setor privado. Vale lembrar que, por lá, o dia será mais curto: os mercados americanos encerram o pregão mais cedo, em função do feriado de 4 de julho amanhã. Ou seja, teremos uma sessão anêmica em termos de liquidez internacional, com menor volume de negócios e pouca disposição a tomar risco. Ainda assim, os mercados seguem abertos nas demais praças, com destaque para a Ásia, que fechou o dia em terreno misto — leve alta na China, recuo no Japão e em Hong Kong — e para a Europa, que sobe moderadamente, ainda que com alguma cautela antes da divulgação do payroll.

No pano de fundo, seguem as preocupações com o pacote fiscal de Trump e os desdobramentos comerciais. O acordo com o Vietnã, anunciado ontem, ajudou a manter o apetite por risco, mas não foi suficiente para dissipar a incerteza quanto às tarifas sobre o Japão, a União Europeia e a China. Para adicionar uma pitada de ansiedade, o Banco do Japão alertou que pode subir juros caso o ambiente comercial melhore. Para o Brasil, o payroll também importa. Um dado fraco nos EUA tende a ampliar a percepção de que o Fed começará a cortar juros mais cedo, o que abre espaço para flexibilização monetária em outros países, inclusive por aqui. Portanto, não se trata apenas de saber quantos empregos foram criados ou perdidos em junho, mas de entender o que esses números significam para o custo do dinheiro no mundo inteiro. 

· 00:58 — Radicalizar para perder: Lula caminha para o isolamento

Com a agenda doméstica esvaziada, os holofotes se voltam inevitavelmente para o dado de emprego nos Estados Unidos — com potencial de balizar expectativas globais sobre juros — e, claro, para o enredo político de Brasília, já que o governo segue operando em modo de autossabotagem. O dólar voltou ao patamar dos R$ 5,42, mas não se iluda: a valorização do real deve-se mais à fraqueza global da moeda americana do que a qualquer mérito local. Internamente, a crise entre Executivo e Legislativo segue viva no radar, ainda que disfarçada por gestos pontuais de trégua.

Mesmo em meio ao ambiente conflagrado, houve avanços. O Senado aprovou a MP do Fundo Social — permitindo leilões de excedentes do pré-sal que podem render até R$ 20 bilhões aos cofres públicos — e também a MP do consignado para trabalhadores da iniciativa privada. Mas não nos enganemos: o estrago político já foi feito. O ambiente no Congresso continua ácido, com parlamentares prometendo ampliar as retaliações. O episódio do IOF, levado ao STF pelo governo numa aposta judicial mal calculada, acentuou as fissuras entre os poderes. E, mais grave: mostrou um Executivo disposto a dobrar a aposta antes das eleições, mesmo em condições de clara inferioridade tática.

Fernando Haddad, por sua vez, foi sincero ao dizer que precisa desesperadamente do IOF para tentar fechar o orçamento de 2026 com a meta de superávit de 0,25% do PIB. Mas essa conta depende também da aprovação de corte de R$ 15 bilhões em benefícios tributários e da elevação de tributos sobre apostas e aplicações financeiras. E, honestamente, depois do espetáculo de beligerância institucional promovido pelo Planalto, não é garantido que qualquer uma dessas medidas passe pelo Congresso.

Como se já não fosse suficiente, Lula decidiu reacender tensões ao prometer vetar o aumento do número de deputados — uma proposta, convenhamos, merecedora de veto, já que o problema do Brasil não é a falta de parlamentares. Mas, do ponto de vista estratégico, é mais um movimento impensado de um presidente que parece movido por ressentimentos, agindo com impulso e espírito de revanche, como se governar fosse uma vendeta. A paralisia já se insinua. O relatório do projeto de isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil foi empurrada para depois do recesso, assim como a regulamentação da reforma tributária. O governo perdeu o centro político e, com ele, perdeu também o timing. Lula está indo para o confronto sem base, sem retaguarda e sem plano — e a história mostra que esse tipo de ousadia termina mal.

As últimas pesquisas mostram o presidente perdendo para nomes como Tarcísio em um eventual segundo turno em 2026. A resposta do lulopetismo? Radicar o discurso e retomar o velho e demagógico “nós contra eles”, como se o país ainda estivesse na década de 1990. É uma tentativa de ressuscitar o espírito do confronto ideológico que já não se mobiliza como antes. Pior: ignora que Lula jamais venceu uma eleição apostando na radicalização. Sempre que triunfou, foi porque caminhou ao centro.

Desprezar esse centro, que lhe deu a vitória por margem apertada em 2022, é um erro estratégico crasso. Dobrar a aposta e confrontar um Congresso hostil é flertar com o desastre. O pêndulo político, assim, tende a girar com força rumo a uma agenda mais reformista, fiscalista e pró-mercado. A tese de inflexão ganha corpo. Mas até lá, prepare-se: o caminho promete ser turbulento, instável e, acima de tudo, imprevisível.

· 01:43 — Qual a situação do mercado de trabalho?

Nos EUA, tanto o S&P 500 quanto o Nasdaq registraram ontem (2) seu segundo recorde de fechamento da semana. Isso porque o pregão foi marcado por forte volatilidade, em meio à ansiedade dos investidores diante da divulgação do relatório oficial de empregos (payroll) previsto para esta quinta-feira. Por trás do brilho das máximas históricas, o avanço foi tudo menos amplo: cerca de 42% das ações que compõem o S&P 500 terminaram o dia no vermelho. A performance foi puxada por um grupo já conhecido — as gigantes de tecnologia com perfil de crescimento agressivo. É como se o mercado americano estivesse se equilibrando sobre um tripé de apostas concentradas, ignorando que a base real da economia não acompanha o mesmo ritmo.

Outro destaque do dia foi o setor de consumo discricionário, que apresentou desempenho surpreendentemente positivo. O índice setorial subiu 0,8%, embalado pela notícia de que o governo Trump fechou um acordo tarifário com o Vietnã — país-chave na cadeia global de produção de roupas, calçados e móveis. 

Agora, o foco do dia agora recai sobre o relatório de payroll, um dos dados mais aguardados pelos mercados — e que carrega o potencial de mexer significativamente nas expectativas para a trajetória dos juros americanos. O consenso atual aponta para a criação de 115 mil vagas de emprego não-agrícolas em junho, uma desaceleração frente às 139 mil registradas em maio. A taxa de desemprego, por sua vez, deve subir de 4,2% para 4,3%. Embora a maioria do mercado ainda veja a reunião de setembro como a data provável para o próximo corte de juros por parte do Federal Reserve, um número particularmente fraco hoje pode reacender apostas em uma flexibilização já em julho. Na prática, sigo cética quanto a esse cenário antecipado: os membros do Fed, apesar da pressão, tendem a manter a cautela e aguardar mais sinais antes de agir. A própria média de criação de empregos neste ano — 123,8 mil por mês — já mostra um claro arrefecimento quando comparada aos 191,9 mil dos dois anos anteriores.

O dado do ADP divulgado ontem, mostrando uma destruição líquida de 33 mil postos no setor privado, adicionou mais lenha à fogueira da especulação. Se o payroll de hoje vier igualmente fraco, a hipótese de corte em julho pode deixar de ser apenas uma ousadia dos investidores mais otimistas e se tornar uma possibilidade real, ainda que improvável. Em suma, o mercado está em compasso de espera. 

· 02:32 — O acordo com o Vietnã

O presidente Donald Trump anunciou um acordo comercial com o Vietnã. Pelo novo arranjo, as exportações americanas para o país asiático ficarão isentas de tarifas, enquanto os produtos vietnamitas enviados aos EUA serão taxados em 20% — um recuo considerável em relação aos 46% previamente ameaçados em abril. Já os bens de terceiros países que apenas transitam pelo Vietnã antes de chegarem aos EUA serão penalizados com uma tarifa de 40%, evidenciando o esforço da Casa Branca em combater o redirecionamento de rotas comerciais para driblar as barreiras tarifárias.

Este é o segundo acordo do tipo fechado por Trump desde que resolveu ressuscitar sua agenda de “tarifas recíprocas“, em tese para reequilibrar relações comerciais bilaterais — o primeiro foi com o Reino Unido. A reação do mercado foi imediata: ações de empresas americanas de vestuário e calçados com cadeias produtivas cada vez mais deslocadas da China, como a Nike, subiram com a notícia. Nada como um pouco de previsibilidade tarifária, ainda que relativa, para trazer alívio ao setor.

O acordo, no entanto, soa mais como um ensaio do que como um grande ato. Faltando poucos dias para o prazo de 9 de julho — data marcada por Trump para aplicar tarifas recíprocas de maneira generalizada —, o governo americano parece correr contra o relógio para selar acordos com parceiros estratégicos. Mas o ritmo dos avanços é desigual e os resultados tímidos. O anúncio com o Vietnã, apesar de útil, foi pouco para quem prometia uma revolução comercial em 90 dias. Um anticlímax, no mínimo.

Ainda assim, o movimento serve como amostra do que pode estar por vir em negociações com outros países asiáticos: acordos parciais, com concessões seletivas e muitos ruídos no meio do caminho. Dado o histórico errático da atual política comercial americana, a tendência é que uma trégua temporária ganhe fôlego.

· 03:27 — As primárias democratas em NY…

Confesso que preferia não ter de comentar este episódio, mas diante da repercussão que tomou, é impossível ignorar. Na semana passada, as primárias democratas para a prefeitura de Nova York trouxeram um sinal estranho: Zohran Mamdani, um socialista de 33 anos, venceu com ampla margem o ex-governador Andrew Cuomo, forçando sua retirada da disputa. Com um programa que inclui taxação agressiva sobre milionários e grandes empresas para bancar transporte público gratuito, creches universitárias e congelamento de aluguéis, Mamdani representa uma guinada radical em plena capital financeira do mundo. Sua ascensão abalou o establishment democrata e acendeu os alertas da oposição. Donald Trump classificou Mamdani como um “lunático 100% comunista” e disse que o Partido Democrata foi sequestrado pela extrema esquerda. Exageros à parte, há uma questão real aqui: o avanço de figuras como Mamdani sinaliza mais do que fragmentação interna. Revela um teste de estresse institucional — o que acontece quando a militância ideológica se infiltra na máquina pública.

A julgar pelas propostas, trata-se de um déjà vu para qualquer latino-americano acostumado a promessas populistas progressistas embaladas por discursos revolucionários. A fórmula é velha conhecida: vilanizar os ricos, estatizar os serviços e sufocar a livre iniciativa com uma burocracia salvadora. Para os que conhecem os efeitos práticos dessas ideias — fuga de capitais, decadência urbana, explosão de criminalidade e colapso fiscal —, o futuro de uma Nova York sob Mamdani não inspira otimismo. Los Angeles já trilha essa rota. E Detroit é o exemplo acabado do que pode acontecer quando o poder público abandona a racionalidade econômica.

Enquanto isso, cidades como Miami, Austin e outras que preservam os fundamentos da tradição americana — liberdade econômica, segurança jurídica e ambiente de negócios amigável — continuam a atrair talento, capital e crescimento. O contraste não poderia ser mais claro. Ainda assim, é preciso colocar os fatos em perspectiva. A vitória de Mamdani não garante sua eleição em novembro. A disputa foi restrita ao eleOnde investir neste mês? Veja 5 ações com bons dividendos para buscar lucros na bolsa de valores brasileira. Baixe o relatório gratuito aqui. itorado democrata — um público historicamente mais à esquerda, especialmente em Nova York, uma cidade mais progressista. O atual prefeito vai concorrer como independente e conta com uma base robusta de apoio que rejeita as propostas radicais do socialista. Há, portanto, uma chance real de que Mamdani fique pelo caminho. Curiosamente, se o Partido Democrata seguir flertando com o extremismo ideológico, permitindo que sua ala mais radical e barulhenta dite os rumos, pode continuar perdendo espaço entre os eleitores moderados e empurrando o eleitorado americano para os braços de figuras como Trump — não por amor ao trumpismo, mas por repulsa ao delírio regressivo travestido de progresso. O sonho americano sobrevive, apesar dos subversivos.

· 04:14 — Uma nova indústria flerta com a inteligência artificial

Desde o lançamento do ChatGPT pela OpenAI, no final de 2022, testemunhamos o início de uma corrida bilionária no mundo da inteligência artificial. As cinco maiores hiperescaladoras ocidentais — Amazon, Microsoft, Google, Meta e Oracle — já despejaram impressionantes US$ 477 bilhões em infraestrutura voltada para IA. E os planos seguem ambiciosos: a expectativa é que esse montante ultrapasse a marca de US$ 1,15 trilhão até 2027. Some-se a isso os bilhões adicionais aportados por players privados como a própria OpenAI e a xAI, de Elon Musk, e temos diante de nós um ciclo de investimentos sem paralelo na história recente da tecnologia.

Já é consenso que a IA vai redesenhar o mercado de trabalho de colarinho branco. A combinação de automação, algoritmos e aprendizado de máquina deverá dizimar uma quantidade significativa de empregos administrativos, repetitivos e baseados em regras — primeiro no nível operacional e, com o tempo, nos degraus mais altos da hierarquia corporativa. O que parecia coisa de ficção científica vai se tornando realidade concreta até o fim desta década, com efeito prolongado para os anos 2030. Diante desse cenário, o Goldman Sachs decidiu olhar para outra vítima em potencial da revolução algorítmica: o mercado global de publicidade.

A publicidade digital é talvez o subsetor que mais avançou na adoção e desenvolvimento de soluções baseadas em IA. Aqui, a inteligência artificial já deixou de ser conceito e virou processo. As ferramentas que remodelam o planejamento e a estratégia de campanhas, a criação de peças, a compra e otimização de mídia, além do CRM e da personalização de conteúdo, já estão em pleno funcionamento — algumas com resultados expressivos, outras ainda em fase beta, mas todas com uma direção clara: menos humanos, mais algoritmos.

A mensagem é simples, embora desconfortável: quase meio trilhão de dólares investidos em infraestrutura de IA pelas Big Techs não estão apenas mirando produtividade ou inovação. Estão pavimentando o caminho para a reconfiguração completa de indústrias inteiras. A mais recente trincheira a ser ocupada? O mercado publicitário — que, ironicamente, sempre foi mestre em vender futuros brilhantes, mas agora precisa desesperadamente encontrar o seu.

· 05:09 — Sem fronteiras

Na maior gestora de ativos do planeta, um fato curioso começou a chamar atenção. O fundo de Bitcoin da BlackRock, o iShares Bitcoin Trust ETF (IBIT), já fatura mais com taxas do que o seu produto mais tradicional e emblemático: o ETF que replica o S&P 500. A moeda digital outrora renegada pelas mesas de alocação virou fonte primária de receita para uma casa que sempre simbolizou a ortodoxia financeira global. Com um patrimônio de cerca de US$ 75 bilhões, o IBIT viu uma verdadeira avalanche de recursos nos últimos meses, vindos tanto do varejo quanto de investidores institucionais. Apenas um único mês dos últimos dezoito registrou saídas líquidas.

O motivo? Após …

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.