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Investimentos

Relatório de receitas e despesas do terceiro bimestre e discurso de Powell devem agitar o mercado; veja os destaques desta terça-feira (22)

Em mais um capítulo da novela tarifária de Donald Trump, o mercado global aguarda novos posicionamentos da UE e Japão.

Por Matheus Spiess

22 jul 2025, 09:18

Atualizado em 22 jul 2025, 09:18

jerome powell

Imagem: Flickr

Os mercados seguem atentos ao desenrolar da novela tarifária protagonizada pela Casa Branca, em busca de qualquer indício de avanço nas negociações comerciais ainda em aberto. A especulação em torno de acordos com os Estados Unidos promete se arrastar por mais algum tempo, alimentada por uma retórica ambígua e, não raro, agressiva. No radar, estão as posições da União Europeia e do Japão — dois atores que vêm tentando equilibrar, sem muito sucesso, o pragmatismo econômico e a serenidade diplomática diante da postura cada vez mais unilateral dos EUA.

Enquanto isso, os holofotes também se voltam para Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, que deve falar ainda hoje (22). Apesar das expectativas, não se espere qualquer aceno sobre política monetária: com a reunião do FOMC marcada para a próxima semana, Powell já está oficialmente no chamado “período de silêncio”. Ainda assim, o mercado — sempre ávido por pistas — deve tentar extrair significado até do subtexto e da entonação do presidente do Fed. Procurar pelo em ovo é parte do ofício.

No pano de fundo, os mercados asiáticos encerraram a sessão de terça-feira (22) com desempenho misto: avanços modestos em Xangai e Hong Kong contrastaram com quedas nas demais praças da região. Já na Europa, o dia começou no vermelho. O sentimento deteriorado se deve, em grande parte, ao impasse tarifário — a União Europeia prepara contramedidas para o caso de fracasso nas negociações com os EUA, sinalizando que o tom pode subir ainda mais antes que se vislumbre qualquer solução. A manhã também não é das melhores entre os futuros americanos.

· 00:53 — Entre o fiscal desequilibrado e a escala jurídica

No Brasil, todas as atenções do dia se voltam para o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do terceiro bimestre. O documento deve manter o congelamento orçamentário de R$ 31 bilhões, mesmo com a recomposição parcial da arrecadação via IOF. Caso o governo opte por flexibilizar essa contenção, o mercado pode azedar rapidamente; por outro lado, uma contenção adicional, embora improvável, seria recebida como alívio. Não custa lembrar que para zerar o déficit primário neste ano, seria preciso congelar pouco mais de R$ 57 bilhões em despesas. Em meio à ansiedade, o mercado conseguiu esboçar alguma reação positiva ontem (21), com leve alta do Ibovespa, recuo do dólar e devolução de prêmios na curva de juros. 

Mas que isso não iluda: não há sinal de alívio duradouro à vista. O governo brasileiro parece realmente acreditar que Donald Trump está determinado a impor uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros. A leitura no Planalto é de que, após a retaliação americana com o cancelamento dos vistos de oito ministros do STF, restou pouco espaço para negociação. E o pior: há promessa de novas sanções a serem anunciadas nos próximos dias. Medidas extremas — como descredenciamento do Swift ou desligamento do GPS — ainda são improváveis, por serem desproporcionais. Mas, considerando o que já ocorreu até aqui, não se pode descartar um aumento de tarifas ou mesmo a aplicação da Lei Magnitsky a determinadas autoridades brasileiras. A interlocução com a Casa Branca tem sido errática e confusa. O fato concreto é que o cenário degringolou com velocidade e segue escalando. A direção é péssima até aqui.

Por ora, o Ministério da Fazenda sinaliza que não haverá retaliações contra empresas ou indivíduos americanos — o que é positivo. Tampouco há, até o momento, intenção de abandonar as tratativas diplomáticas. O problema segue sendo a retórica presidencial: ontem, Lula mais uma vez agravou a tensão ao afirmar que “a guerra tarifária vai começar quando eu der uma resposta ao Trump, se ele não mudar de opinião”. É exatamente esse tipo de declaração, aliás, que ajudou a abrir a porta para o tarifaço: desde o início do terceiro mandato do presidente, o governo optou por uma linha antiamericana explícita, com direito a discurso nitidamente inflamado na Cúpula dos BRICS+, o que irritou profundamente Washington. Agora, paga-se o preço.

A situação se agrava ainda mais com a contaminação política do processo. Trump exige que o Brasil encerre o que chamou de “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro. Como alertei anteriormente, não apenas isso não aconteceria — como o processo contra o ex-presidente parece acelerar. Ontem, o ministro Alexandre de Moraes deu 24 horas para que a defesa de Bolsonaro explique, sob pena de prisão, o descumprimento da ordem que o proíbe de usar redes sociais de terceiros. Na semana passada, Moraes já havia determinado o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno e proibição de se aproximar de embaixadas. A Primeira Turma do Supremo referendou a decisão por 4 votos a 1 — com voto contrário apenas de Luiz Fux, um dos três ministros fora do alvo direto do Departamento de Estado americano (ajuda a preservar um canal institucional razoável dentro do STF para além dos indicados por Bolsonaro).

O ponto central é que essa escalada contamina o curto prazo e embaralha as projeções para 2026. O sentimento do investidor se deteriora, e o ruído político transforma qualquer cenário base em terreno movediço. Como antecipei, o “ganho político” de Lula com o enfrentamento a Trump veio aquém do desejado (limitado e apenas no curto prazo). Segundo o Lulômetro, medido por O Antagonista e Real Time Big Data, a avaliação do presidente voltou ao mesmo patamar anterior ao tarifaço: 46% de ruim/péssimo, contra apenas 26% de ótimo/bom. No máximo, foi um voo de galinha.

Por sorte, essa crise veio longe da eleição — diferentemente de outros casos ao redor do mundo em que o timing foi letal. Mas a dúvida permanece: por quanto tempo ainda seremos arrastados nessa disputa inútil, que coloca o Brasil no papel constrangedor de satélite periférico de uma guerra entre populismos? Do lado de lá, um Trump agressivo, agitado por um bolsonarismo esvaziado e ressentido. Do lado de cá, um lulopetismo ultrapassado e reativo. E no meio, um país inteiro esquecido às margens das disputas.

· 01:49 — Há um caminho razoável?

Nos EUA, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, aproveitou os dados mais recentes de inflação para atacar, de forma indireta, a prudência do Federal Reserve diante da escalada tarifária promovida pela Casa Branca. Mas o argumento soa, ao menos em parte, desonesto. Tarifas comerciais podem funcionar sim como um choque inflacionário, mas com defasagem. Ou seja, os atuais níveis de inflação não capturam o impacto pleno dessas medidas. Logo, usá-los como justificativa para criticar a postura do Fed não funciona. Em um cenário de política monetária independente, o efeito inflacionário costuma se manifestar meses após a imposição das tarifas. Já em contextos de ingerência sobre o BC, a história nos leva direto à inflação da década de 1970 — um lembrete de que flertar com a perda de independência monetária é ruim.

Além da incerteza tarifária, soma-se ao cenário o expansionismo fiscal. A nova proposta de cortes de impostos encampada por Donald Trump deve adicionar cerca de US$ 3,4 trilhões ao déficit acumulado da próxima década. O número é o resultado de uma queda de US$ 4,5 trilhões em receitas, parcialmente compensada por uma redução estimada de US$ 1,1 trilhão em gastos até 2034. Em outras palavras, a política fiscal continua pressionando — e qualquer tentativa de minimizar os riscos inflacionários por meio de um argumento político, como se bastasse trocar o presidente para mudar a orientação do Fed, ignora o funcionamento de uma autoridade monetária que, até segunda ordem, segue independente e comprometida com sua missão.

A verdade incômoda é que, se o objetivo for manipular os rumos da política monetária, será preciso declarar guerra à independência institucional — algo que, até aqui, ainda encontra resistência tanto dentro quanto fora do banco central americano.

Mesmo diante desse pano de fundo — com pressões inflacionárias latentes, ruído fiscal e riscos institucionais —, os mercados acionários americanos seguem resilientes. Ontem, os principais índices renovaram suas máximas históricas, sustentados pela expectativa positiva em torno da temporada de resultados do segundo trimestre. O otimismo gira em torno dos balanços que começam a ser divulgados nesta semana, com grandes nomes do mercado trazendo seus números. Entre os destaques de hoje estão Baker Hughes, Capital One Financial, Chubb, Coca-Cola, Danaher, General Motors, Intuitive Surgical, Invesco, Lockheed Martin, MSCI, Northrop Grumman, Philip Morris International, RTX, SAP, Sherwin-Williams e Texas Instruments. É um desfile corporativo de peso — e, por ora, é ele que segue comandando o apetite ao risco, ao menos até que a realidade macroeconômica resolva bater à porta.

· 02:31 — A aplicação e a retaliação

Scott Bessent voltou a reforçar a lógica da intimidação tarifária como instrumento de barganha: segundo ele, o novo pacote de tarifas — com vigência prevista para o dia 1º de agosto — aumentará a pressão sobre outros países para que aceitem acordos mais favoráveis aos interesses americanos. Em outras palavras, a Casa Branca parece disposta, desta vez, a abandonar de vez o jogo de cena e aplicar as tarifas para valer, encerrando a era do “TACO Trade” — a diplomacia tarifária com final feliz para todos.

Assim, EUA e União Europeia têm até o início de agosto para selar um novo acordo comercial. Mas a retórica beligerante do presidente Trump, com a ameaça explícita de impor uma tarifa de 30% sobre produtos europeus — vindos da já apelidada “Terra Sem Ar-Condicionado” — empurrou as tratativas a um novo grau de tensão. E a resposta do outro lado do Atlântico começa a tomar forma com uma contundência inédita: pela primeira vez, a UE estuda ativar o chamado Instrumento Anticoerção.

Trata-se de um dispositivo legal criado para dar ao bloco ferramentas de retaliação contra medidas unilaterais e coercitivas de parceiros comerciais. Na prática, isso abre espaço para ações de impacto real: desde a imposição de tarifas próprias até medidas ainda mais agressivas, como a criação de barreiras para que empresas americanas concorram em licitações públicas na Europa, limitação de investimentos americanos no continente e sobretaxação sobre big techs. Uma escalada como essa, vale lembrar, atinge diretamente o coração do maior acordo bilateral de comércio do planeta. Segundo o Conselho Europeu, o volume de trocas entre EUA e UE somou US$ 1,96 trilhão em 2024 — qualquer faísca pode gerar incêndios de proporções globais.

Diante disso, a pergunta que paira no ar é incômoda, mas inevitável: o que significaria, de fato, uma guerra comercial em larga escala entre as duas maiores potências econômicas ocidentais? O secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, tenta tranquilizar — diz esperar que um acordo seja fechado e, se não for, que as negociações prosseguirão mesmo após o início da vigência das tarifas. Mas o mercado não costuma lidar bem com incerteza institucionalizada. A simples sinalização de que Washington pode acionar o gatilho tarifário já carrega peso simbólico — e risco real.

· 03:28 — A briga dos titãs do petróleo

Tivemos a conclusão de uma das maiores disputas corporativas no setor de energia: de um lado, a Chevron (gigante californiana avaliada em US$ 261 bilhões). Do outro, a texana Exxon Mobil (avaliada em robustos US$ 481 bilhões). No centro do embate, um ativo estratégico: os direitos sobre um dos maiores e mais promissores campos de produção de petróleo do mundo, enterrado sob as águas da costa da Guiana.

A disputa girava em torno da aquisição da Hess, detentora de 30% do chamado Bloco Stabroek — joia da coroa na Bacia das Guianas. A Chevron avançou para comprar a Hess em uma jogada que, desde o início, foi vista com profunda desconfiança por sua arquirrival Exxon. Esta última, aliada à chinesa CNOOC, alegava ter direito de preferência sobre a participação da Hess no campo, excluindo a Chevron. Mas o impasse ganhou contornos judiciais — e terminou com vitória da Chevron.

A decisão final reconheceu que os termos do contrato de joint venture não davam à Exxon e à CNOOC poder de veto sobre a transação. Com isso, a Chevron assegura não apenas um lugar à mesa como também exposição direta a um dos projetos mais lucrativos e geopoliticamente relevantes da nova fronteira petrolífera das Américas. A Exxon, por sua vez, preserva sua fatia majoritária de 45% no ativo e segue liderando o desenvolvimento da região — mas o controle absoluto escorregou por entre os dedos.

No fim, a Chevron conseguiu fazer o que poucos esperavam: atravessou a cortina jurídica da Exxon e fincou bandeira no território da rival. Não é exagero dizer que, sob o verniz do contrato, essa foi uma guerra — e, por enquanto, a vitória coube à Chevron.

· 04:15 — Uma barragem gigantesca

A China acaba de lançar a pedra fundamental de um de seus empreendimentos mais ambiciosos — e potencialmente mais controversos: uma megabarragem no Tibete, orçada em US$ 167 bilhões, com promessa de ser o maior projeto de energia do planeta. O anúncio foi feito pelo premiê Li Qiang no fim de semana, em meio a um esforço do governo para reacender o dinamismo econômico por meio de investimentos públicos em infraestrutura — uma cartilha velha, mas ainda em uso por Pequim.

A magnitude do projeto é colossal: segundo estimativas de engenheiros estatais, a capacidade anual de geração da nova usina será de 300 bilhões de kWh — o suficiente para abastecer, sozinha, todo o consumo elétrico do Reino Unido em 2024. Para fins de comparação, esse número é quase três vezes superior à produção da atual maior hidrelétrica do mundo, a também chinesa Barragem das Três Gargantas. O novo colosso hídrico seria, portanto, um marco na matriz energética global — e uma peça central na estratégia chinesa de neutralidade de carbono até 2060.

Mas como quase tudo que emerge das montanhas tibetanas, o projeto não vem sem turbulência geopolítica. A barragem será construída no curso superior do rio Yarlung Tsangpo, que desce do Himalaia e cruza a fronteira com a Índia, rebatizado de Brahmaputra, antes de desaguar em Bangladesh. Qualquer interferência significativa no fluxo hídrico tende a inflamar tensões diplomáticas com Nova Délhi, que considera a região do Arunachal Pradesh — por onde o rio serpenteia — parte de seu território, enquanto a China contesta essa soberania. A construção, portanto, arrasta consigo implicações estratégicas, em uma das fronteiras mais militarizadas do planeta.

Do ponto de vista econômico, o impacto é igualmente relevante. O projeto, que levará anos para ser finalizado, poderá adicionar até 0,1 ponto percentual ao crescimento anual do PIB chinês por uma década, segundo estimativas preliminares. Em um país que luta para manter o fôlego da expansão sem recorrer à bolha imobiliária, qualquer décimo de ponto vindo de infraestrutura “verde” é bem-vindo.

· 05:02 — Sinais de desalavancagem

A Raízen — joint venture entre Cosan e Shell — anunciou a descontinuação das operações da Usina Santa Elisa, dedicada à moagem de cana para produção de açúcar e etanol. Paralelamente, a companhia informou a venda de 3,6 milhões de toneladas de cana-de-açúcar na forma de terras agrícolas, transação que movimentará R$ 1,1 bilhão em pagamento à vista. O pacote inclui ainda os contratos vinculados de fornecimento de cana, o que reforça a natureza estratégica do desinvestimento.

O anúncio não veio por acaso. Vendas de ativos pela Raízen são…

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.