Investimentos

Tarifa de novo? O circo protecionista não fecha as cortinas nunca; veja o que é destaque na quarta-feira (9)

Cruzada protecionista interminável de Trump continua com novas cartadas do republicano ao mercado internacional.

Por Matheus Spiess

09 jul 2025, 09:00 - atualizado em 17 jul 2025, 16:06

estados unidos eua trump tarifas economia

Imagem: iStock/ Sviatlana Barchan

Donald Trump voltou a agitar os mercados com mais uma cartada na sua interminável cruzada protecionista. Na terça-feira (8), o presidente americano anunciou, sem aviso prévio, uma tarifa de 50% sobre o cobre — o dobro do que o mercado já temia. Como era de se esperar, os futuros do metal em Nova York dispararam, registrando o maior ganho intradiário em décadas. A medida veio logo após mais um recuo nas tarifas “recíprocas” que o próprio Trump havia prometido — e adiado — anteriormente. Agora, ele jura que esta será a última postergação. A promessa, claro, já foi feita antes.

A nova leva de tarifas, somada à ameaça de sobretaxa de 200% sobre importações farmacêuticas, parece mais um capítulo da velha estratégia da Casa Branca: eleger um bode expiatório da vez, transformar retórica em espetáculo e deixar o mercado lidar com os escombros. No caso do cobre, porém, o impacto é potencialmente mais corrosivo. Os EUA importam cerca de metade de todo o cobre que consomem. Com a nova alíquota, os preços domésticos devem se manter entre 20% e 25% acima das cotações globais, o que pode comprometer os índices de confiança — que vinham ensaiando uma recuperação — e reduzir o espaço para cortes de juros neste ano.

Enquanto isso, a Europa sobe no dia, à espera da ata do Fed, e parte relevante do mercado parece simplesmente ter desistido de levar 100% a sério qualquer palavra que saia da Casa Branca (crise de credibilidade). Na Ásia, o fechamento foi misto — uma reação comedida para um cenário que já virou um teatro tarifário; aliás, um espetáculo que, ao que tudo indica, ainda tem pelo menos mais três anos e meio pela frente.

· 00:59 — Sincericídio

No Brasil, o Ibovespa encerrou o pregão de ontem (8) em queda, refletindo o clima de cautela dos investidores diante do novo capítulo da novela tarifária dos Estados Unidos. A postergação das tarifas anunciada por Donald Trump para 1º de agosto não trouxe alívio: apenas prolongou a incerteza. A queda só não foi mais acentuada graças ao suporte das ações da Petrobras (PETR4), que acompanharam a alta do petróleo no exterior.

Outro ponto que mereceu atenção foram os dados de vendas no varejo, que vieram muito abaixo das expectativas e revelaram uma desaceleração clara da demanda. A composição dos números reforça a percepção de esfriamento gradual da atividade, especialmente em setores sensíveis ao crédito — onde os efeitos da política monetária contracionista seguem se fazendo sentir. O cenário é ambíguo: por um lado, a fraqueza da atividade aumenta a probabilidade de cortes de juros ainda em 2025; por outro, impõe um viés de baixa às projeções de crescimento e margens das empresas.

A agenda desta quarta-feira (10) é esvaziada, com mercados operando com menor liquidez em razão do feriado municipal em São Paulo. Mas isso não significa calmaria: o drama fiscal continua seu curso. Ontem à noite, houve um primeiro encontro entre Fernando Haddad, Hugo Motta e Davi Alcolumbre, com a presença de Gleisi Hoffmann e líderes governistas. As conversas foram, como de costume, restritas aos bastidores, mas os vazamentos ao longo do dia podem impactar os vértices mais longos da curva de juros.

Haddad insiste em seu mantra: a meta fiscal de superávit de 0,25% do PIB para 2026 não será alterada. O problema? O mercado já aprendeu a desconfiar. O histórico do ministro fala por si: metas fiscais já foram revistas antes, e a credibilidade, hoje, é um ativo escasso no Ministério da Fazenda. Enquanto isso, o governo se enreda em suas próprias contradições. Durante audiência na Comissão Mista de Orçamento, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, protagonizou mais um capítulo da série “governo versus governo”. Não disse nenhuma grande novidade, o sincericídio de suas declarações escancarou a inconsistência do discurso oficial. Enquanto Lula e Haddad seguem alardeando uma melhora fiscal que só resiste no discurso, coube a Simone Tebet trazer um sopro de realismo: reconheceu que será necessário encontrar alternativas à arrecadação do IOF para viabilizar a manutenção da meta fiscal.

Entre as propostas, está a revisão dos chamados gastos tributários, com corte sugerido de 5%, o que poderia gerar cerca de R$ 20 bilhões adicionais. O problema? O Brasil conta com cerca de 150 tipos distintos de benefícios fiscais, todos defendidos com unhas e dentes por lobbies bem organizados. A Câmara até aprovou ontem o regime de urgência para tramitação do projeto de lei do deputado Mauro Benevides (PDT), que prevê corte linear mínimo de 10% nesses benefícios para os anos de 2025 e 2026. Mas Tebet foi clara: a aprovação não será fácil, e os obstáculos políticos são enormes.

Além disso, a ministra reiterou o que já sabemos — as despesas discricionárias estão sendo progressivamente esmagadas pelo crescimento das despesas obrigatórias. Em 2026 e 2027, o cenário tende a se tornar francamente insustentável. Não haverá espaço para manobra. Um grande ajuste fiscal será inevitável a partir de 2027, por mais que Lula e Haddad insistam em negar o óbvio e sigam vendendo ilusões à militância barulhenta.

E o problema não para por aí. A bomba dos precatórios está prestes a voltar ao centro do palco. A partir de 2027, todas as despesas da União com precatórios voltarão a ser contabilizadas dentro do limite de gastos e da meta de resultado primário. Em outras palavras, o governo está empurrando com a barriga um explosivo que deve detonar no colo do próximo presidente. A bomba está armada e o cronômetro já começou a correr.

· 01:46 — Um boa oportunidade comercial

O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, esteve em visita de Estado ao presidente Lula nesta terça-feira e alguns acordos comerciais foram assinados. O governo brasileiro tratou de anunciar um número redondo para causar impacto: estima-se que a cooperação econômica entre Brasil e Índia possa alcançar US$ 20 bilhões. Nenhum prazo foi apresentado para a concretização dessa cifra. O que se sabe, com base nos dados mais recentes, é que a corrente de comércio entre os dois países somou US$ 12,1 bilhões em 2023, o que representa uma alta de 4,9% frente ao ano anterior.

Tanto Lula quanto Modi defenderam a ampliação do acordo Mercosul–Índia, com o objetivo de reduzir barreiras tarifárias e não tarifárias — um movimento que, ao menos em tese, poderia aumentar significativamente o volume de comércio bilateral. Hoje, apenas 14% das exportações brasileiras para o mercado indiano estão cobertas pelo acordo atual, o que evidencia o tamanho da oportunidade. A Índia, com sua economia em expansão e apetite por matérias-primas e alimentos, desponta como um parceiro comercial estratégico — mas o Brasil ainda engatinha na construção de uma relação mais profunda. Se houver seriedade e pragmatismo por parte do governo brasileiro, este pode ser um raro caso em que a política externa resulta em ganhos concretos.

· 02:31 — De volta às manchetes

Nos EUA, as tarifas voltaram ao centro das atenções, com a Casa Branca reafirmando o novo prazo de 1º de agosto para a entrada em vigor das chamadas tarifas “recíprocas”, ao mesmo tempo em que ensaia a criação de novas tarifas setoriais. O retorno da incerteza comercial, como era de se esperar, interrompeu o fôlego de alta dos índices acionários, que até então vinham renovando máximas históricas.

Em uma tentativa pouco convincente de conter a crescente crítica ao seu estilo de negociação errático — sintetizado na sigla “TACO” (Trump Always Chickens Out) —, Trump jurou que não haverá nova postergação. O problema é que ele já jurou isso antes… e voltou atrás. Assim, entre ameaças infladas, prazos renegociáveis e bravatas que não se sustentam, seguimos em mais um ato do circo tarifário da Casa Branca.

Em mais um capítulo do seu manual de política externa problemática, o presidente americano afirmou que os EUA encaminharão ainda nesta semana uma carta formalizando a aplicação de tarifas sobre importações provenientes da União Europeia. Se o governo realmente decidir implementar as ameaçadas alíquotas de 50% sobre os produtos europeus, o impacto direto seria uma elevação estimada de 0,4 ponto percentual nos preços ao consumidor. A questão, no entanto, é que poucos acreditam que isso de fato acontecerá. A própria presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, já acenou com a disposição de fechar um acordo com os Estados Unidos.

Enquanto isso, para além das cortinas políticas, o mercado observa atentamente a divulgação da ata da última reunião do Federal Reserve, realizada em meados de junho — uma peça fundamental para entender como a autoridade monetária vem interpretando os efeitos dessa nova rodada de incertezas comerciais sobre a inflação.

· 03:28 — Tarifas setoriais

Em mais um episódio da novela tarifária que parece não ter fim, o presidente Trump aproveitou uma reunião de gabinete para lançar novas ameaças comerciais — desta vez mirando o setor farmacêutico e o mercado de metais. Sem qualquer cerimônia, pediu tarifas de até 200% sobre medicamentos importados e de 50% sobre produtos de cobre. A simples menção foi suficiente para provocar um salto de mais de 17% nos contratos futuros do cobre em Nova York, que depois devolveram parte dos ganhos, mas ainda assim mostraram um dos maiores avanços intradiários das últimas décadas.

A ameaça sobre o cobre parece, ao menos por ora, a mais concreta. Trump deu a entender que essa medida seria prioridade, enquanto as tarifas sobre medicamentos seguem mais no campo das ideias. A fala escancarou o improviso com que tem sido conduzida a política comercial da maior economia do mundo. Trata-se da mais nova reviravolta em um ambiente já conturbado para as commodities industriais, que agora precisam lidar não só com a dinâmica de oferta e demanda global, mas também com a volatilidade gerada pelas decisões políticas em Washington. Ruim para a indústria.

Trump, que já impôs tarifas sobre aço e alumínio e conduz uma série de investigações sobre o comércio de outros metais estratégicos, parece determinado a usar a pauta comercial como ferramenta política e símbolo de nacionalismo econômico. O objetivo declarado seria estimular a mineração e a fundição domésticas — ainda que o custo disso seja uma escalada inflacionária e mais incerteza para os mercados globais.

E por que o mercado ainda não reagiu com mais veemência? Simples: ninguém mais leva Trump tão a sério quando o assunto são prazos e tarifas. A experiência recente ensinou que muitas dessas ameaças são apenas instrumentos de barganha, com prazos continuamente empurrados à frente à medida que as negociações evoluem — ou empacam. Mas seria um erro confundir essa descrença com uma imunidade.

A complacência pode custar caro. Os efeitos plenos desse novo pacote tarifário ainda não apareceram nos dados econômicos, e não há qualquer garantia de que a Casa Branca continuará atenuando seus próprios impulsos para evitar turbulência nos mercados. A julgar pelas últimas sinalizações, o caos tarifário está longe de dar trégua — e, desta vez, com alvos mais sensíveis à inflação e à confiança global.

· 04:14 — Prêmio Nobel?

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não poupou elogios ao presidente Donald Trump durante um jantar na Casa Branca. A cena teve mais de bajulação do que de diplomacia — uma tentativa transparente de afagar o ego do líder americano, que sonha com um desfecho favorável para a guerra em Gaza e, mais ainda, com um Prêmio Nobel da Paz que ainda não ganhou (e que o atormenta desde que Barack Obama foi laureado). Ninguém leva a sério a possibilidade de Trump receber o Nobel da Paz, mas a sua obsessão pelo prêmio ajuda a decifrar parte de suas motivações.

Trump, de fato, tem pressa. A guerra já se arrasta por 21 meses e, apesar de recentemente ter dito que uma trégua estaria próxima, as diferenças entre Israel e Hamas seguem intransponíveis. O presidente, que enfureceu os isolacionistas ao ordenar bombardeios contra instalações nucleares iranianas no mês passado, agora busca um troféu diplomático que não apenas o redima no cenário internacional, mas o projete como pacificador — papel que escapou ao seu antecessor, Joe Biden.

Israel está social e economicamente exaurido após quase dois anos de conflito em múltiplas frentes contra o Irã e suas milícias radicais. Internamente, o governo Netanyahu ainda não conseguiu alcançar seus principais objetivos estratégicos, e os custos da guerra seguem se acumulando. Mesmo nas negociações de trégua em Doha, o máximo que se espera — com algum otimismo — é a devolução de cerca de metade dos 50 reféns ainda mantidos pelo Hamas. Pouco, diante do desgaste.

Diante desse impasse, Netanyahu decidiu dobrar a aposta política: enviou uma carta formal ao comitê do Prêmio Nobel da Paz, indicando Donald Trump à honraria. Mais do que reconhecimento, o gesto revela cálculo: Netanyahu precisa de Trump ao seu lado caso os combates em Gaza se prolonguem — e conta com a influência do aliado para manter o Irã sob pressão, impedindo Teerã de reconstituir seus programas nucleares e ampliar seu arsenal de mísseis balísticos. Trata-se menos de um elogio e mais de uma aliança de conveniência em meio ao colapso de um equilíbrio regional já fraturado.

· 05:06 — Notícias interessantes

Nos últimos dias, o CEO da Vale Base Metals, Shaun Usmar, voltou a defender com firmeza a abertura de capital da subsidiária de metais básicos da Vale. Criada em 2023 para destravar valor em operações de cobre e níquel, a VBM teve 10% de seu capital vendido à saudita Manara Minerals por US$ 2,5 bilhões, o que a avaliava em US$ 25 bilhões. Essa discrepância expõe o potencial represado dentro da holding. A gestão mira o IPO em 2027, mas quer estar pronta para aproveitar qualquer janela favorável antes disso. A expectativa é elevar produtividade, cortar custos e alcançar múltiplos de até 10x EV/EBITDA — bem acima dos pares globais e da própria Vale — sustentados pela promessa de entregas operacionais robustas.

Ao mesmo tempo…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.