Investimentos

O rei está nu

Temos enfrentado uma verdadeira cruzada contra a pressão dos bancos e a patrulha virtual de concorrentes, por vezes respaldada pela imprensa.

Por Felipe Miranda

03 abr 2017, 10:59

O meu prazer agora é risco de vida. Antes, as pessoas achavam instigantes minhas críticas aos problemas da indústria financeira, cujos resultados práticos implicavam prejuízos a seus clientes. Elas me enviavam brincadeiras: “já comprou seu colete à prova de balas, menino? rsrs”. Agora já não é mais tão divertido. Meu primo Regis escreve sério: “eu acho esta briga grande demais pra você.”

Não é brincadeira. Também não é briga. É apenas o meu trabalho. E se ele parece grande demais para alguns, eu preciso discordar. Golias nunca teria a menor chance contra Davi. Contamos com um reforço de peso ao nosso lado: a verdade. Quanto mais luz jogarmos sobre a questão, mais forte ficaremos. E quando eles tentam nos calar, por esforços obscuros e indiretos, apenas reforçam o caráter antifrágil da informação. A forma mais eficiente de espalhar uma ideia é tentar censurá-la.

Por que criamos a Empiricus? Essa é a pergunta central. Quando levanto a questão, não proponho uma narrativa ensimesmada. Isso diz respeito a você, à forma com que administra seu dinheiro e se informa sobre questões financeiras. A Empiricus é somente a metonímia deste mercado de informação independente.

Os incentivos da indústria financeira, principalmente no Brasil, estão absolutamente distorcidos e precisam ser corrigidos. Quem paga a conta, meu caro, é você.

É por isso que o research independente ganha tanto espaço no mundo. E é também por isso que nos propusemos, há cerca de oito anos, a desenvolver este mercado por aqui.

Em que pesem os esforços recentes de firmas independentes – e precisamos aqui reconhecer o grande mérito da XP nesse processo -, onde está aplicado a maior parte do dinheiro das pessoas? Nos bancos, certo? Em um sistema absolutamente oligopolizado, sem incentivo à concorrência e ao oferecimento de bons produtos aos clientes. O gerente, no lado favorável da assimetria de informação, apropria-se da falta de conhecimento do cidadão comum e lhe empurra produtos caros e ruins de sua instituição financeira. É a raposa no galinheiro.

A relação dos poupadores brasileiros com seu dinheiro passa quase necessariamente pela abordagem dos gerentes dos bancos – e não são eles os culpados; apenas respondem a seus incentivos. Se quem lhes paga a conta é a instituição financeira, atuar no melhor interesse do banco (e não do cliente) surge como tautologia.

Ora, o que significa atuar no melhor interesse do banco? Aquele que lhe gera maior receita, ou seja, o mais caro, de maiores taxas. Há uma clara transferência de excedente do cliente para a instituição financeira.

Esse é o conflito mais óbvio, mas passa longe de ser o único problema. Quando falamos de investimentos envolvendo crédito privado ou ações, a coisa fica ainda mais evidente. Imagine um analista trabalhando para um banco que acaba de fazer o IPO da empresa XYZ. Ele acha a respectiva ação ruim ou cara. No entanto, aquela companhia acaba de deixar 40 milhões de reais em fees para o banco, que coordenou a operação. Poderá realmente falar mal daquela empresa, ferindo todas as relações institucionais da instituição para que trabalha?

Não há como não lembrar do fatídico caso do Santander, em que Emílio Botin, ainda vivo, servia a cabeça de uma de suas funcionárias em uma bandeja ao ex-presidente Lula, seu amigo, após comentários negativos a respeito do governo Dilma.

Nada mais ultrajante. Quando se lê uma carta mensal de investimentos de seu banco, imagina-se que aquilo foi feito no melhor interesse dos clientes, com isenção e pesquisa, certo? Afinal, dali partirá uma decisão sobre onde você aplicará seu dinheiro. O documento não pode estar contaminado por nenhuma outra relação, com empresas ou governo, não é mesmo?

O núcleo de pesquisas dentro de um banco não lhe gera receita diretamente. Ao contrário, trata-se de um grande centro de custos, criado apenas para fomentar outras áreas, essas, sim, geradoras de receita. É isto mesmo: o research, no banco, é feito para atender aos interesses de geração de negócios em outras áreas (corretagem, IPOs, M&As, etc). Daí emerge um óbvio conflito ético, com as pessoas atuando em prol do autointeresse e tentando maximizar suas remunerações anuais, o que implica perseguir resultado para o banco, às custas, claro, do cliente.

Mas não é apenas uma questão ética. Embora importante, ela sozinha não explica tudo. Ao lado dela, há uma questão de competência. A verdade também é que a maior parte dos gerentes não entende de investimentos com propriedade. Ele está, sim, muito treinado para vender os produtos de interesse do banco – sobre esses, poucos saberão mais do que o gerente. Agora, tente manter uma conversa aprofundada com ele sobre as vantagens do prefixado sobre o indexado, sobre a importância de aumentar o duration de suas aplicações, sobre uma determinada ação… Ele simplesmente não consegue. Está basicamente fora de seu escopo, por falta de competência técnica.

“Ah, mas eu sou um cliente grande e, portanto, tenho acesso direto à área de research do meu banco.” Isso não resolve o problema. Primeiramente, porque o sell side não entende de Bolsa – ele pode até entender das empresas, mas não entende da dinâmica da renda variável, de trading, do véu da interação social que há entre as ações e as respectivas companhias. Aqui resgato a noção de conflation, devidamente esmiuçada por Nassim Taleb. Ações não são empresas – tente trocar uma ação por um pedaço de uma mesa, acessar diretamente os lucros não sendo pela forma de dividendos, influenciar a gestão. Ao comprar uma ação, você tem acesso a uma série de direitos e deveres. Ela se liga, sim, à empresa, mas numa função cuja forma ninguém ainda foi capaz de modelar, por um simples motivo: as decisões de compra e venda em Bolsa passam necessariamente pelos homens e pelas mulheres. E o comportamento humano é imodelável.

As finanças pertencem aos praticantes e os analistas de bancos, até por regras de compliance, estão impedidos de praticar compra e venda de ações. Desse modo, estão alijados do fator preponderante para geração de retornos anormais em Bolsa. Se você não pratica uma determinada atividade, me perdoe, mas você não está apto àquilo.

Há outro ponto fundamental. Lembra da personagem do Jeremy Irons no filme Margin Call? “Seja mais rápido, mais inteligente ou trapaceie. Eu não trapaceio. E embora eu ache que vocês sejam excepcionalmente inteligentes, há também muita gente esperta por ai. Só nos resta sermos mais rápidos.” O research de um banco é necessariamente lento, o último a chegar na festa. Para um analista brasileiro mudar seu call sobre uma determinada companhia, o economista macro global terá de revisar suas estimativas de crescimento mundial, o economista local terá de mudar suas projeções para o Brasil e, somente então, poderemos revisar as expectativas setoriais. Enquanto você assistia pacientemente a cada um desses passos, os fundos de investimento perceberam a oportunidade na sua frente e mudaram sua visão antecipadamente, compraram antes e exauriram aquele potencial de valorização. O analista sell side é o último a chegar à festa.

Mas você possivelmente sabe de tudo isso. Então, decide checar se as informações que o banco lhe transmite estão certas. Você reconhece estar do lado desfavorável da assimetria de informação. Vai procurar nos jornais notícias capazes de referendar ou refutar aquilo que lhe fora dito. Ora, ora, mas os principais anunciantes dos jornais são os bancos, a maior parte das fontes dos repórteres de economia trabalha nas instituições financeiras e os jornalistas são ainda mais incompetentes para falar de investimentos do que seu gerente. Qual a chance disso dar certo?

O repórter escreve uma matéria sobre os bancos, que, no fim do dia, é quem paga seu salário, por meio de cotas de patrocínio. A indústria financeira inteira está nua. Precisamos jogar luz sobre isso. É basicamente o que temos feito ao longo dos últimos oito anos.

Com o pequeno crescimento que conseguimos, hoje temos notícias de que incomodamos. Após nossa campanha implacável para oferecer produtos mais baratos e rentáveis comparativamente àqueles disponibilizados pelos bancos e publicados nos jornais, O Império Contra-ataca.

Soube que o desconforto começou nos bancos grandes porque clientes de 30, 40, 50 milhões de reais começaram a rejeitar as propostas de produtos que lhes eram oferecidos pelo private banking para seguir as nossas recomendações. Veja a profundidade disso: enquanto eram clientes pequenos, não tinha problema. O banco não ligava. Claro, não lhe dava muita receita. Quando chegou ao topo da pirâmide, a relação azedou e agora eles vêm pra cima de nós, criando grupos de trabalho e colocando grupos de advogados de grandes escritórios de advocacia para estudar diligentemente cada passo da Empiricus, atrás do primeiro deslize. Tentem à vontade. Nunca serão, jamais serão. Aqui, temos uma única agenda: perseguir as melhores oportunidades de investimento para nossos clientes.

Se você se identifica com isso em alguma instância, se há ressonância em você dessas questões, hoje eu tenho um pedido. Por favor, solicito gentilmente que leia este material e o encaminhe para um(a) amigo(a). É com a luz da informação e da educação financeira que defenderemos os interesses do investidor pessoa física. Com a sua ajuda, somos imparáveis. Isso aqui é feito por e para você. Muito obrigado, de coração.

Mercados brasileiros iniciam a segunda-feira com tendência predominantemente positiva, atentos ao comportamento das bolsas no exterior e à revisão para baixo nas projeções para taxa Selic. Queda do minério de ferro e recrudescimento da tensão política doméstica impedem desempenho mais favorável.

Agenda doméstica traz uma série de referências importantes. Relatório Focus revisou para baixo mediana das projeções para taxa Selic ao final do ano, de 9,00% para 8,75%. IPC-S apontou inflação em linha com projeções. Ainda hoje temos dados da Fenabrave, pesquisa da CNI e PMI Markit Industrial. Mercado digere rompimento formal de Renan Calheiros com governo Temer, temendo eventual impacto sobre reformas, enquanto aguarda julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE, com início previsto para amanhã.

Nos EUA, temos falas de dirigentes do Fed, PMI Markit, ISM e investimentos em construção. Na Europa, saem dados industriais, inflação ao produtor e desemprego.

Ibovespa Futuro abre em leve alta de 0,1%, enquanto dólar fica perto do zero a zero contra o real. Juros futuros cedem com projeção de Selic mais baixa.

Sobre o autor

Felipe Miranda

CIO e estrategista-chefe da Empiricus, é ex-professor da FGV e autor da newsletter Day One, atualmente recebida por cerca de 1 milhão de leitores.

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