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O dia já começa com os mercados globais sob o peso da agenda corporativa carregada. Nos Estados Unidos, por exemplo, os holofotes se voltam para a divulgação dos balanços de gigantes como Walt Disney e McDonald’s — seria o suficiente para influenciar o humor dos mercados. Além disso, aguardamos discursos de três membros do Federal Reserve, que podem oferecer pistas adicionais sobre a trajetória dos juros. Para apimentar ainda mais o ambiente, Donald Trump promete anunciar ainda nesta semana o nome que substituirá Adriana Kugler no Fed, com forte expectativa de que a escolha reforce a ala mais dovish do comitê, favorecendo cortes na taxa de juros.
Enquanto isso, as bolsas asiáticas encerraram a sessão majoritariamente no azul, em clara dissociação do recuo observado em Nova York ontem — queda essa provocada por sinais de enfraquecimento no setor de serviços americano. Na Europa, os índices avançam com investidores voltando às compras após o recuo recente, mesmo diante de resultados corporativos mistos e da ameaça renovada de tarifas por parte dos EUA.
Já o petróleo retoma fôlego após bater mínimas de cinco semanas, impulsionado por estoques americanos menores do que o esperado e pelo recrudescimento das tensões geopolíticas. No Brasil, entra oficialmente em vigor a tarifação imposta pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros. Uma nova rodada do jogo comercial que, embora esperada, obriga o investidor a ajustar seu radar — o protecionismo americano pode ter implicações mais amplas do que os primeiros movimentos deixam transparecer.
· 00:51 — As tarifas saem do papel
Por aqui, o Ibovespa encerrou o pregão de ontem em leve alta, mesmo sob o pano de fundo tenso da decisão de colocar o ex-presidente Jair Bolsonaro em prisão domiciliar. A reação do mercado foi morna — o que, por si só, já é revelador. Como já pontuei, não há um efeito direto e imediato entre a prisão de Bolsonaro e o desempenho dos ativos locais, mas isso não significa que a situação seja irrelevante. Pelo contrário: o desconforto institucional gerado, somado ao potencial de represálias externas e de reconfiguração das forças políticas rumo a 2026, pode reintroduzir volatilidade ao radar.
A decisão, vale destacar, provocou incômodo dentro do próprio Supremo Tribunal Federal. Ministros demonstraram desconforto com a condução do processo por Alexandre de Moraes, que teria, ao isolar-se politicamente, colocado em risco a credibilidade do próprio colegiado. A possibilidade de recuo da medida, nesse caso, não seria apenas uma derrota pessoal, mas um abalo à autoridade da corte como um todo — ainda que, para observadores jurídicos, a prisão seja juridicamente frágil, politicamente desnecessária e operacionalmente insustentável. Há até quem sugira que o ex-presidente teria deliberadamente forçado sua detenção, como estratégia para capitalizar politicamente o desgaste do judiciário, reforçando o clima de tensão.
A situação complica-se ainda mais com a sombra da Lei Magnitsky, que segue pairando sobre os tribunais brasileiros. O temor de sanções internacionais pode constranger votos futuros no plenário do STF. E, como se não bastasse, chegamos ao aguardado 6 de agosto: data em que as tarifas comerciais dos EUA contra o Brasil finalmente entram em vigor. O impacto, como já alertei, deve ser bem menor do que os alarmismos iniciais sugeriam — mas não irrelevante. O governo, por ora, aposta suas fichas na via diplomática, buscando ampliar a lista de isenções e suavizar as alíquotas punitivas. Fernando Haddad, inclusive, se encontrará na próxima quarta-feira com Scott Bessent, um dos principais interlocutores do time de Trump para os temas comerciais.
Outras frentes estão em análise, mas nenhuma delas é simples ou gratuita: abertura de novos mercados (processo lento e custoso), estímulos ao consumo doméstico, crédito subsidiado, compras públicas e programas de renúncia fiscal emergencial. Parte disso pressiona, claro, o já apertado espaço fiscal — e exige escolhas que o governo vinha tentando adiar. Na agenda, o destaque doméstico é a fala de Gabriel Galípolo, que pode reforçar o tom hawkish da última ata do Copom de ontem. Também digerimos o resultado do Itaú, que veio em linha com as expectativas, mas animou os investidores com as ações em Nova York. Vale lembrar que, lá fora, os ativos de países emergentes seguem se beneficiando da crescente expectativa de cortes de juros nos EUA ainda neste ano. Em suma, o Brasil dança conforme a música global — mesmo que o palco doméstico esteja, no momento, especialmente instável por questões políticas.
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· 01:49 — Uma atividade realmente mais fraca
Os dados mais recentes da economia americana continuam entregando um retrato ambíguo, mas com tonalidades sombrias — especialmente no setor de serviços, epicentro do dinamismo doméstico. O PMI até tentou animar, mas bastou olhar para o ISM, tradicionalmente mais robusto, para o otimismo esfriar: o índice recuou para 50,1, perigosamente perto da linha divisória que separa crescimento de contração. Ainda mais preocupantes são os subíndices — como novos pedidos, emprego e atividade empresarial — flertando com as mínimas do ciclo. O mercado de trabalho, por sua vez, reforça o mau presságio: pelo segundo mês consecutivo, o índice de emprego do ISM de serviços caiu, depois dos dados de payroll decepcionaram com a criação de apenas 73 mil vagas na última sexta-feira, muito concentradas em saúde. Setores como indústria, lazer e hospitalidade seguem estagnados, alimentando o temor de que os EUA estejam escorregando para um terreno pantanoso: crescimento fraco com inflação persistente — o velho fantasma da estagflação rondando outra vez.
A reação dos mercados foi fiel ao diagnóstico: queda generalizada nos principais índices americanos, à medida que se acumula o desconforto com a piora dos fundamentos e a escalada do barulho geopolítico. Donald Trump, em sua conhecida coreografia de imprevisibilidade, voltou a pressionar o tabuleiro comercial, ameaçando novas tarifas contra a Índia e mirando setores sensíveis como farmacêutico e semicondutores. As conversas com a China continuam em banho-maria, e o prazo de 12 de agosto para a ampliação das tarifas segue no radar — com chances reais de um impasse explosivo (há chance de postergação). A indefinição sobre a política comercial, somada à fragilidade do mercado de trabalho, compõe um ambiente ruidoso, instável e de visibilidade reduzida. Enquanto isso, a temporada de balanços corporativos avança, com nomes de peso como Walt Disney, McDonald’s e Uber tentando resgatar o humor dos investidores nesta quarta-feira — tarefa ingrata num cenário onde a volatilidade parece ter vindo para ficar.
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· 02:35 — E por falar em tensão comercial…
As tensões comerciais seguem em escalada, alimentadas por novas ameaças do presidente Donald Trump — que agora volta sua mira para países que ainda importam petróleo da Rússia. A proposta em discussão prevê tarifas adicionais sobre produtos oriundos dessas nações, elevando o grau de incerteza política e regulatória para qualquer empresa que dependa do mercado americano. Nesse cenário de imprevisibilidade institucional, as múltiplas camadas de tarifação tornam o sistema comercial não apenas mais opaco, mas também mais caro e disfuncional, minando a previsibilidade necessária para decisões de investimento e operação de longo prazo.
Como se não bastasse, Trump resolveu reacender seu projeto de reindustrialização pela força bruta, mirando agora o setor farmacêutico. Em entrevista à CNBC, prometeu anunciar em breve tarifas escalonadas sobre medicamentos importados: começariam “pequenas”, mas subiriam para 150% em até 18 meses e poderiam alcançar até 250% — em uma tentativa declarada de forçar a produção de medicamentos em solo americano. A indústria, naturalmente, soou o alarme: medidas dessa magnitude teriam efeito direto sobre os preços ao consumidor e poderiam comprometer seriamente a capacidade de financiar inovação e pesquisa. E a lista de alvos não para por aí. Os semicondutores, cuja cadeia global depende fortemente de Taiwan, também entraram no radar tarifário — acrescentando combustível a uma política comercial errática.
· 03:26 — A sucessão no Fed
Donald Trump afastou oficialmente a possibilidade de nomear Scott Bessent — atual secretário do Tesouro — para a presidência do Federal Reserve. A justificativa, segundo o próprio presidente, foi simples: Bessent “prefere continuar onde está”. O gesto, embora apresentado com aparente leveza, elimina do páreo um nome com significativa influência política e econômica, sugerindo que a sucessão de Jerome Powell, cujo mandato se encerra em maio do próximo ano, está longe de ser trivial. Permanecem na disputa figuras ideologicamente mais alinhadas à cartilha de Trump, como o atual governador do Fed, Christopher Waller; o diretor do Conselho Econômico Nacional, Kevin Hassett; o ex-diretor da instituição Kevin Warsh. Nomes diferentes, mesma afinidade: todos vistos como possíveis agentes de uma inflexão institucional profunda. A questão de fundo, portanto, não é apenas “quem será”, mas “quão independente será”. Acredito que Kevin Warsh seja o favorito.
Porque, para além da troca de comando, o que se delineia é um projeto de reengenharia do próprio Fed. A proposta vai muito além da redução de juros — foco das críticas persistentes de Trump a Powell. O plano inclui cortes de pessoal, a reorganização dos bancos regionais e, sobretudo, uma redefinição da missão da autoridade monetária: o Fed passaria a operar sob nova lógica, mais atrelada aos interesses da Casa Branca do que ao manual ortodoxo de política econômica. Kevin Warsh chamou isso, sem rodeios, de uma “mudança de regime”. O efeito colateral seria imediato: o rompimento da coesão institucional do comitê e a politização de uma instituição historicamente guiada pela tecnocracia. O FOMC se aproximaria, assim, do modelo da Suprema Corte americana — polarizado, instável e sujeito a guerras de nomeações. Com apenas duas cadeiras disponíveis para nomeação no próximo mandato, a sucessão de Powell pode transformar-se em peça-chave não apenas da política monetária, mas da própria batalha eleitoral e da estabilidade dos mercados.
· 04:17 — Vento favorável?
O aumento das tarifas comerciais por funcionar, sim, como um paliativo fiscal para os Estados Unidos. Ao inflar a arrecadação, ajuda a mascarar temporariamente a fragilidade das contas públicas, oferecendo um alívio momentâneo em meio ao agravamento estrutural do quadro fiscal. Mas a anestesia tem prazo de validade. As projeções do CBO (Escritório de Orçamento do Congresso) seguem alarmantes, com a dívida pública podendo ultrapassar 160% do PIB até 2054 — uma trajetória difícil de ignorar, mesmo para os otimistas de plantão. Nesse cenário, a gestora Apollo ensaia uma provocação mais esperançosa: e se a inteligência artificial (IA), devidamente implementada, for capaz de impulsionar a produtividade a ponto de estabilizar a dívida em torno de 120% do PIB, sem a necessidade de apertos fiscais draconianos?
O argumento se ancora num mecanismo bem conhecido dos ciclos de transformação tecnológica: ganhos de produtividade reduzem o custo unitário do trabalho, arrefecem pressões inflacionárias e abrem espaço para juros mais baixos — o que, por sua vez, estimula o crescimento econômico e amplia a base arrecadatória. Esse encadeamento virtuoso pode fazer a relação dívida/PIB cair naturalmente, sem cortes agressivos de despesas nem aumentos de impostos. Os dados da Apollo ilustram bem essa tese: com produtividade crescendo entre 0,9% e 2,0% ao ano, a dívida poderia recuar de 117% para algo entre 99% e 77% do PIB. E há precedente: nos anos 1990, o próprio CBO superestimou o endividamento justamente por subestimar a força da produtividade. Em outras palavras, se a IA cumprir parte do que promete, talvez os EUA consigam escapar da armadilha fiscal com uma solução elegante — e menos indigesta que os tradicionais pacotes de austeridade. Mas o futuro ainda está aberto…
· 05:02 — Os gigantes
Nos últimos dias, os resultados estrondosos das gigantes de tecnologia não apenas fizeram suas ações decolarem — eles reacenderam o entusiasmo em torno de todo o complexo de inteligência artificial. De forma consistente, essas empresas têm…