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Em dia de PPI, Livro Bege e falas de dirigentes do Fed, mercado vê retórica de Trump entrar nos indicadores de inflação; veja os destaques desta quarta (16)

Nesta quarta-feira (16), investidores internacionais terão vários indicadores relevantes nos EUA para medir a temperatura do mercado. Confira.

Por Matheus Spiess

16 jul 2025, 09:27 - atualizado em 17 jul 2025, 16:13

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Imagem: iStock/ metamorworks

A quarta-feira (16) começa com ares pesados no exterior. A agenda internacional está recheada de eventos relevantes, incluindo o índice de preços ao produtor (PPI), dados de produção industrial, a divulgação do Livro Bege, novas falas de dirigentes do Federal Reserve e mais uma leva de resultados corporativos. É o tipo de cardápio que, isoladamente, já teria potencial de mexer com os mercados. Mas tudo ganha outra dimensão após os dados de inflação ao consumidor divulgados ontem: embora o núcleo — que exclui os itens mais voláteis — tenha vindo levemente abaixo das expectativas, o detalhe da composição acendeu um sinal amarelo. A qualidade do número preocupa, sobretudo diante das distorções tarifárias já em curso e dos ruídos ensaiados pela Casa Branca, que parece determinada a aumentar seu protecionista. A retórica inflamada de Donald Trump vai, pouco a pouco, entrando nos indicadores.

Enquanto isso, por aqui, o noticiário divide-se entre dois eixos igualmente ruidosos. De um lado, segue o impasse jurídico em torno do IOF: após o fracasso da tentativa de reconciliação, caberá ao STF arbitrar o destino do tema, em mais um capítulo que mistura arrecadação e insegurança jurídica. Do outro lado, o impasse internacional trouxe dois sinais positivos e um alerta em potencial. O governo brasileiro, ao que tudo indica, busca adotar uma postura mais diplomática sob a condução cautelosa de Geraldo Alckmin, que tem se esforçado para conter impulsos revanchistas. Paralelamente, Bolsonaro tenta reorganizar sua base após o choque público entre Tarcísio e Eduardo, em um movimento de contenção de danos típico de quem enxerga o risco de sua tropa desintegrar-se em disputas antes mesmo da próxima batalha.

O lado menos animador vem dos Estados Unidos: o acionamento de uma investigação sobre práticas comerciais desleais pelo Brasil indica um passo adicional na escalada protecionista. A depender da leitura, trata-se de algo ruim — mas com uma nuance. O gesto pode sinalizar uma tentativa da Casa Branca de dar um verniz institucional ao protecionismo, abandonando o improviso político caótico da fase anterior em favor de uma retaliação com carimbo formal. Um avanço no conteúdo, ainda que não na  forma.

Com esse pano de fundo, os mercados internacionais amanhecem sem direção definida. Os futuros americanos e as bolsas europeias operam de forma mista, refletindo os dados recentes da balança comercial e a atenção renovada às tarifas no radar. A sessão promete ser sensível a nuances, em um ambiente onde política comercial, decisões jurídicas e sinalizações monetárias se entrelaçam com volatilidade.

· 00:58 — Cabo de guerra

O Ibovespa encerrou a terça-feira (15) praticamente estável, travado pelas quedas de Vale (VALE3) e Petrobras (PETR4), em um pregão sem alívio e sem catalisadores relevantes na agenda econômica. O noticiário de hoje deverá permanecer concentrado no campo político — tanto em Brasília quanto nos bastidores do xadrez geopolítico. Por aqui, o destaque negativo ficou por conta do fracasso na audiência pública no Supremo Tribunal Federal sobre a elevação do IOF. Sem qualquer sinal de consenso entre governo e Congresso, a conciliação terminou como começou: em impasse. Como não há novas audiências previstas, caberá ao ministro Alexandre de Moraes a decisão final sobre a matéria.

Enquanto isso, o Congresso corre para mostrar algum protagonismo. Instalou uma comissão mista para analisar a Medida Provisória que trata de soluções alternativas à alta do IOF. A expectativa é de um arranjo híbrido, com medidas que tentem agradar a gregos e troianos — e que provavelmente não agradarão plenamente a ninguém. Caso a composição vingue, o movimento já deverá aparecer no próximo Relatório Bimestral de Receitas e Despesas. Ainda na frente fiscal, a Comissão Mista de Orçamento aprovou o relatório preliminar da LDO de 2026, preservando as principais diretrizes propostas pelo Executivo, incluindo a meta de superávit primário de 0,25% do PIB. Paralelamente, uma nova Proposta de Emenda à Constituição propõe retirar os precatórios do teto de gastos e estabelece uma transição de dez anos para que passem a ser incorporados à meta fiscal, a partir de 2027. A ideia é que, a cada ano, 10% do volume de precatórios seja absorvido no resultado primário previsto na LDO.

Parece uma solução. Mas não é. Na prática, trata-se de uma bomba-relógio que apenas ganhou novo cronômetro. O problema fiscal segue presente, e sua complexidade aumenta conforme o tempo avança — especialmente quando o próprio Executivo contribui para o desgaste político. O presidente Lula deve vetar hoje, por exemplo, o projeto que aumenta o número de deputados. Embora o veto pareça acertado sob a ótica técnica — afinal, não há justificativa plausível para inchar ainda mais o Legislativo —, ele servirá apenas para tensionar a relação com o Congresso, já que os parlamentares devem, com ampla margem, derrubar a decisão presidencial. É um veto que, embora correto, tem eficácia próxima de zero e custo político elevado.

Apesar disso, as últimas pesquisas mostraram uma leve melhora na aprovação de Lula, como já antecipamos aqui. O avanço é tímido, provavelmente pontual e de curto prazo, mas revela certa eficácia na mobilização da base radicalizada e no discurso de defesa da soberania nacional — uma narrativa que o Planalto tem explorado com afinco. Talvez por isso o governo tenha comparecido à audiência de conciliação com pouca disposição para, de fato, reconciliar. E sabemos o que acontece quando a soberba começa a subir a rampa: basta lembrar os efeitos da Cúpula dos BRICS.

No entanto, ao menos por ora, parece prevalecer certa racionalidade na condução da política externa. O governo tenta encontrar caminhos para negociação e pode até estender o prazo para resolver o impasse tarifário além do limite original de 1º de agosto. Seria um passo positivo — se não tivéssemos recebido, na noite de ontem, mais um indício de escalada por parte dos Estados Unidos. A Casa Branca anunciou a abertura de uma investigação formal contra o Brasil, sob a justificativa de apurar práticas comerciais desleais. A ação será conduzida com base na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 — a mesma base legal usada para justificar tarifas contra a China no passado. Os alvos da apuração são amplos: comércio digital, serviços de pagamento eletrônico, tarifas preferenciais, combate à corrupção, propriedade intelectual, etanol e até desmatamento ilegal. É ruim? Sim. Mas é menos primitivo do que as investidas anteriores. Ao contrário da retórica política personalista vazia, focada em Bolsonaro de no STF, essa nova ofensiva sugere uma tentativa de institucionalização da disputa comercial. Em vez do escárnio improvisado, agora o protecionismo ganha moldura técnica e formal. Não à toa, o próprio Trump recuou no discurso e afirmou que Bolsonaro “não era seu amigo”, apenas “alguém que conhecia”.

Aliás, o ex-presidente brasileiro também esteve em cena ontem (15), concedendo uma entrevista relevante para o nosso contexto. Como já destacamos em relatórios anteriores, o maior risco à tese de inflexão política em direção a uma agenda mais pró-mercado, reformista e fiscalista em 2026 não é o governo Lula — é a própria direita, caso insista em se sabotar. A disputa entre Tarcísio de Freitas — governador de São Paulo, nome mais competitivo da direita moderada e provável herdeiro natural da candidatura — e Eduardo Bolsonaro provocou ruído no campo da oposição. Bolsonaro pai agiu rápido. Declarou publicamente que conversou com ambos, defendeu a união da direita, elogiou Tarcísio com entusiasmo — chegou a chamá-lo de “irmão” — e desautorizou o próprio filho. Flávio Bolsonaro também saiu em defesa do governador.

Foi um bom sinal para quem aposta no amadurecimento da direita racional, institucional, articulada e moderada. Caso as projeções de um Congresso ainda mais conservador se confirmem, o Brasil pode ter, pela primeira vez desde a redemocratização, uma janela real para mudança de paradigma econômico — com responsabilidade fiscal, reformas e racionalidade política não populista. Mas o caminho até lá será tudo, menos tranquilo. O mercado assistirá ao espetáculo entre a euforia e a cautela. E talvez, mais do que nunca, seja prudente manter o cinto afivelado.

· 01:43 — Começou a temporada de resultados

Nos EUA, o Nasdaq teve um dia histórico, renovando máximas impulsionado — mais uma vez — pelo entusiasmo quase religioso em torno da Nvidia. A ação saltou 4% após vir à tona a notícia de que a empresa teria conseguido convencer o governo Trump a suavizar as restrições às exportações de chips avançados para a China. Um feito e tanto, que mostra o tamanho do lobby da companhia e sua capacidade de moldar, a seu favor, até a política externa americana. Mas o entusiasmo ficou restrito. 

Fora do universo tech, a resiliência dos mercados foi mais pontual e menos exuberante. Ainda que o início do pregão tenha sido marcado por um certo otimismo, embalado pela divulgação dos resultados do segundo trimestre dos grandes bancos, o clima não se sustentou de forma generalizada. JPMorgan Chase superou as expectativas de lucro, assim como o Citigroup. O Wells Fargo também veio com números acima do esperado — mas, mesmo assim, viu suas ações recuarem, após o banco cortar a projeção para a receita líquida de juros em 2025. O mercado, como sempre, digere bem os lucros do presente, mas tem pouca tolerância com revisões pessimistas para o futuro. No agregado, foi um dia mais positivo do que negativo para os gigantes bancários americanos. E esse desempenho reforça a tese de que o setor está se saindo melhor do que muitos imaginavam diante de um cenário ainda contaminado por incertezas macro — entre elas, os impactos das tarifas comerciais.

Para hoje, o radar segue movimentado. Entre os nomes que divulgam resultados, destaque para ASML, Bank of America, Goldman Sachs, Johnson & Johnson, Morgan Stanley, PNC Financial Services, Prologis e United Airlines. Um verdadeiro desfile corporativo que deve testar a tração do mercado fora da bolha high-tech. Afinal, não dá para viver só de Nvidia — embora, no momento, Wall Street pareça achar que sim.

· 02:37 — Impacto inflacionário

Donald Trump segue dobrando a aposta em sua cruzada tarifária, mirando agora setores de alta sensibilidade econômica e política — como o farmacêutico e o de semicondutores. A ameaça de tarifas adicionais, que podem chegar a 200%, já tem data para sair do discurso e entrar em vigor: o fim deste mês. Se confirmadas, empresas como Pfizer, Merck e Eli Lilly serão atingidas em cheio, com impacto direto nos custos de produção e, por consequência, no bolso do consumidor americano. O que antes era apresentado como uma política de “reciprocidade” começa a ganhar contornos de retaliação sistematizada, com a previsão de tarifas amplas já para 1º de agosto. Desta vez o efeito pode começar a transbordar para os dados econômicos.

O índice de preços ao consumidor (CPI) de junho veio dentro das expectativas, mas a leitura aprofundada não tranquiliza. A inflação acumulada em 12 meses subiu para 2,7%, acima dos 2,4% registrados em maio. No mês, o avanço foi de 0,3% — a maior alta em cinco meses. E o que mais preocupa é a decomposição: itens fortemente ligados à cadeia de importação, como roupas, móveis e brinquedos, foram os que mais pressionaram. Mesmo com uma leve desaceleração no núcleo da inflação, o mercado começa a absorver a realidade: as tarifas, antes vistas como ruído político, estão começando a contaminar a cadeia de preços. Isso reduz substancialmente a margem para cortes de juros por parte do Federal Reserve, e pode inclusive atrasar — ou enterrar — qualquer perspectiva de afrouxamento monetário no curto prazo.

O prazo imposto por Trump para renegociações comerciais termina em 1º de agosto, e a cada nova sinalização, os riscos inflacionários ganham mais força. Muitos alertam que ainda estamos nos estágios iniciais dessa escalada, e que os efeitos plenos sobre preços e margens corporativas devem se intensificar gradualmente nos próximos trimestres. O índice de preços ao produtor (PPI), que será divulgado hoje, servirá como termômetro para medir até que ponto as empresas estão conseguindo repassar os custos tarifários à cadeia produtiva — e, claro, ao consumidor final. Neste cenário, o Fed tende a adotar uma postura ainda mais cautelosa. Não porque a inflação já esteja desancorada, mas porque ela começa a se mover, com persistência preocupante, na direção errada. E como bem sabemos, quando a inflação pega a trilha da montanha, reverter o curso costuma ser mais penoso do que o mercado gostaria de lembrar.

· 03:21 — Um novo acordo

Os Estados Unidos e a Indonésia anunciaram um novo acordo comercial, celebrado com entusiasmo por Donald Trump. O presidente americano não economizou nos adjetivos ao classificar o pacto como um grande avanço — ainda que, na prática, imponha uma tarifa de 19% sobre produtos indonésios enquanto garante “acesso total” dos EUA ao mercado do país asiático. Nas palavras do próprio Trump, os Estados Unidos saem “ilesos” do arranjo. Como parte do pacote, a Indonésia se comprometeu a comprar 50 jatos da Boeing, além de US$ 19,5 bilhões em produtos agrícolas e energéticos norte-americanos. Trump também afirmou que um acordo com a Índia seguirá “na mesma linha”, sugerindo um modelo de negociação assimétrico em que o protecionismo americano é rebatizado como pragmatismo diplomático.

Em paralelo, as tratativas com a China parecem avançar. Segundo Scott Bessent, as negociações entre as duas maiores economias do mundo estão em um “lugar muito bom”, prestes a serem formalizadas em uma nova reunião nas próximas semanas. Bessent chegou a tranquilizar os mercados ao minimizar os riscos associados ao dia 12 de agosto. A mensagem implícita é clara: enquanto Trump bate à porta com ameaças tarifárias, ele também sabe quando recuar e capitalizar os gestos diplomáticos como se fossem concessões unilaterais. Vale notar que Indonésia, Índia e China estiveram presentes na recente Cúpula dos BRICS+ no Rio de Janeiro. O Brasil, porém, ficou à margem — o anfitrião que não foi convidado para a mesa principal.

No mesmo compasso, a Rússia também entrou na mira do presidente americano, com Trump ameaçando sanções severas caso Moscou não interrompa suas ações militares na Ucrânia dentro de um prazo de 50 dias. Ainda assim, dada a atual aproximação entre Washington e parceiros comerciais estratégicos como China e Índia — ambos com laços sólidos com Moscou —, é improvável que uma nova rodada de tarifas seja direcionada aos países que mantêm relações comerciais com os russos. A ameaça, neste caso, soa mais como parte do roteiro habitual de Trump. 

· 04:16 — Outra cúpula esvaziada

Ao assumir a presidência rotativa do G20, a África do Sul sonhava alto: queria reposicionar a agenda global em direção às prioridades do mundo em desenvolvimento — como alívio da dívida soberana, financiamento climático e reforma das instituições financeiras internacionais. Mas o projeto esbarrou, já nos primeiros passos, em uma muralha de indiferença e hostilidade vinda de Washington. Donald Trump tratou as propostas com desprezo e boicotou praticamente todos os encontros do grupo. A ausência reiterada do secretário do Tesouro, Scott Bessent — inclusive na reunião desta semana na costa leste sul-africana — apenas confirma o desinteresse dos EUA. A Casa Branca simplesmente não leva a África a sério — não enxerga nela nem força estratégica, nem relevância geopolítica, exceto como fornecedora de recursos naturais.

A África do Sul, por sua vez, caminha sobre ovos. Evita confrontar frontalmente seu segundo maior parceiro comercial, mas tampouco conseguiu articular um contraponto coletivo à influência americana dentro do G20. A saída encontrada tem sido recuar silenciosamente: os temas mais divisivos foram deixados de lado (medo do que aconteceu com o Brasil depois da Cúpula dos BRICS+), e as reuniões passaram a orbitar consensos genéricos — como crescimento global e estabilidade fiscal. Ainda assim, o presidente Cyril Ramaphosa tenta salvar a cúpula, empenhando esforços para garantir a presença de Trump no encontro final, marcado para novembro em Joanesburgo — justamente quando os EUA herdarão a liderança do bloco. 

· 05:04 — Comércio liberado

Jensen Huang, CEO da Nvidia, está em Pequim com a missão de destravar as licenças americanas que permitirão à empresa retomar as exportações de seus chips de inteligência artificial H20 para a China — mercado estratégico e sedento por semicondutores de alto desempenho. Após uma suspensão inesperada das restrições impostas anteriormente pelo governo Trump, a expectativa agora é de retomada das vendas. O movimento foi viabilizado por uma reviravolta política em Washington, após Huang argumentar diretamente ao presidente que as barreiras comerciais apenas estimulariam a autossuficiência tecnológica chinesa, prejudicando os interesses estratégicos dos próprios EUA. O recuo americano levou as ações da Nvidia a subirem.

A reversão das restrições marca…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.