Investimentos

Ibovespa e bolsas globais: Inflação na Zona do Euro, dados do varejo nos EUA e pronunciamento de Lula serão destaques nesta quinta-feira (17)

Enquanto isso, a temprada de resultados corporativos continua aquecida no exterior. Confira.

Por Matheus Spiess

17 jul 2025, 09:24 - atualizado em 17 jul 2025, 16:13

BOLSA DE VALORES IBOVESPA mercado (1) europa

Imagem: iStock/ solarseven

A quinta-feira (17) amanhece com uma agenda econômica menos carregada do que nos últimos dias — mas nem por isso menos relevante. Os holofotes se voltam para três frentes principais: a leitura da inflação na Zona do Euro, os dados de vendas no varejo nos Estados Unidos e a continuidade da temporada de resultados corporativos lá fora. No entanto, o que realmente prende a atenção dos investidores é o impasse comercial patrocinado pelo presidente Donald Trump: afinal, ele cumprirá a promessa de aplicar novas tarifas no início de agosto ou fará mais uma de seus recuos estratégicos, empurrando a decisão para frente e tentando extrair ganhos de barganha?

No caso do Brasil, a situação ganha contornos ainda mais politizados — como se já não estivéssemos suficientemente ocupados com nossos próprios ruídos domésticos. Enquanto isso, os mercados asiáticos encerraram a sessão desta quinta-feira em tom majoritariamente positivo, impulsionados por ações de tecnologia e por sinais de possível reabertura do diálogo entre China e Estados Unidos — com exceção pontual de Hong Kong. Na Europa, o sentimento também é construtivo nesta manhã, em parte graças ao aparente abrandamento da retórica de Trump em relação a Pequim. Nada foi resolvido, é verdade, mas a simples ideia de que o presidente americano possa, mais uma vez, ceder no tom já foi suficiente para dar algum alívio aos mercados globais.

· 00:51 — A briga entre poderes continua

O Ibovespa conseguiu interromper a sequência de quedas na sessão de ontem (16) — um alívio pontual, ainda que o pano de fundo siga praticamente inalterado. A pauta política continua dominando o debate, com destaque para a vitória do governo na manutenção do decreto do IOF, excluindo apenas o risco sacado da cobrança. Foi um avanço para o Planalto. No mesmo dia, Lula decidiu vetar o projeto que ampliava o número de deputados na Câmara. Tecnicamente, o veto faz sentido — não há justificativa plausível para aumentar o tamanho do Congresso, e talvez fosse mais apropriado discutir uma redução. Mas, politicamente, o gesto soou como uma provocação deliberada. O presidente poderia simplesmente ter permitido que o Congresso resolvesse a questão por conta própria. Preferiu bancar a briga — e, num momento de tensão institucional, o movimento parece menos técnico e mais revanchista.

Ainda no tema IOF, havia expectativa de que o ministro Alexandre de Moraes estendesse a revisão às operações com planos VGBL, mas ela acabou restrita ao risco sacado. Ruim. A decisão adiciona mais um ingrediente à já longa lista de incertezas jurídicas do país. Segundo cálculos da Fazenda, a exclusão do risco sacado deve reduzir a arrecadação do IOF em cerca de R$ 450 milhões em 2025 e R$ 3,5 bilhões em 2026. Mas não se enganem: outras batalhas fiscais seguem em curso, como a PEC dos precatórios — uma solução que, na prática, apenas empurra o problema para debaixo do tapete — e a novela da isenção do imposto de renda. Enquanto isso, Lula, embalado por uma ligeira recuperação nas pesquisas de popularidade, deve fazer um pronunciamento em rede nacional ainda hoje (17), capitalizando o sentimento nacionalista ao falar das recentes investidas de Washington contra a “soberania brasileira”.

Aliás, no plano internacional, o esforço técnico para evitar o pior segue sob comando do vice-presidente Geraldo Alckmin e do chanceler Mauro Vieira, que já enviaram carta formal aos EUA. Escalar a tensão com os EUA seria um grande erro. Pelo menos a investigação americana com base na Seção 301, por pior que seja, pode dar contornos mais objetivos ao debate, substituindo o ruído ideológico por um debate técnico. A lista de temas investigados inclui até o Pix, cuja rápida adoção teria afetado negativamente empresas como Visa e Mastercard. Aliás, o sucesso do sistema brasileiro frustrou planos de pagamentos do WhatsApp e da Meta por aqui. Diante disso, não seria surpresa que parte da pressão venha dessas empresas — Trump, afinal, tem se mostrado defensor das big techs americanas em diferentes arenas. Seja como for, temos algum terreno para negociar — o que, dadas as alternativas, já é um avanço.

· 01:48 — Tudo bem até aqui

Os mercados acionários americanos oscilaram ao longo da quarta-feira (16), reagindo a rumores contraditórios sobre uma possível demissão de Jerome Powell por parte do presidente Donald Trump — mais um episódio na longa novela de tensões entre a Casa Branca e o Federal Reserve. Ainda assim, os temores foram absorvidos com relativa rapidez, e os índices encerraram o dia no positivo. O Nasdaq, mais uma vez, renovou máximas históricas, embalado por um pano de fundo que, apesar dos ruídos políticos, segue ancorado em uma temporada de resultados corporativos sólida.

Três megabancos divulgaram seus balanços ontem (16): Bank of America, Morgan Stanley e Goldman Sachs. Todos enfrentavam a expectativa de superar comparativos desafiadores — e conseguiram entregar acima do esperado. Mesmo operando em um ambiente de incerteza crescente, especialmente no que diz respeito à política comercial errática de Trump, os grandes bancos mostraram resiliência. Aliás, esse é o tom que tem predominado nos bastidores corporativos: empresas seguem cautelosas, mas há sinais de que boa parte dos executivos decidiu parar de esperar previsibilidade e, em vez disso, começou a operar dentro da própria volatilidade.

Para esta quinta-feira (17), a agenda de resultados segue movimentada. Entre os nomes no radar estão Abbott Laboratories, Citizens Financial Group, GE Aerospace, Interactive Brokers, Netflix, Novartis, PepsiCo, U.S. Bancorp e Taiwan Semiconductor Manufacturing — esta última, aliás, apresentou um resultado especialmente forte, reforçando sua posição como protagonista na cadeia global de semicondutores. No campo macroeconômico, o dado mais relevante do dia será a leitura das vendas no varejo de junho, indicador importante para medir a força do consumo em meio a um cenário ainda permeado por incertezas monetárias e geopolíticas.

· 02:36 — Demissão?

Donald Trump voltou a tensionar os alicerces institucionais dos EUA ao insinuar, mais uma vez, a possível demissão do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell — nomeado pelo próprio Trump em 2017. A faísca ganhou combustível após uma reunião com parlamentares republicanos, na qual o presidente teria apresentado um rascunho de carta de demissão e solicitado opiniões sobre o movimento. Apesar de ter recuado publicamente logo na sequência, classificando a demissão como “altamente improvável”, o episódio foi suficiente para acender alertas nos mercados e provocar reações contundentes de figuras de espectros políticos distintos. De republicanos a democratas, formou-se um raro consenso em torno da importância de preservar a independência do Fed diante de qualquer tentativa de interferência política direta — algo que poderia corroer a credibilidade da política monetária americana.

Como se não bastasse a ameaça em si, o governo ainda testou narrativas jurídicas, ventilando uma suposta “justa causa” para remover Powell do cargo — alegando má gestão em reformas físicas de edifícios do Fed, com estouros orçamentários da ordem de bilhões de dólares. A justificativa, no entanto, soa como cortina de fumaça: tecnicamente questionável, politicamente conveniente. Vale reforçar que uma substituição forçada de Powell teria potencial de desorganizar os mercados de câmbio e renda fixa em escala global. No curto prazo, a leitura dominante é de que Trump está, mais uma vez, apenas esticando a corda — testando os limites institucionais. Mas a dúvida incômoda permanece: quem viria no lugar de Powell? E, sobretudo, com qual grau de autonomia? A simples ideia de instalar um presidente do Fed alinhado ao Executivo — um “independente de fachada” — já é suficiente para reacender o debate sobre a erosão do Estado de Direito americano e o risco, ainda latente, de fragilização do dólar como âncora institucional do sistema financeiro global.

· 03:23 — O TACO Trade sobreviverá?

O cronômetro corre rumo a 1º de agosto e, com ele, aumenta a pressão para que a União Europeia responda à nova ameaça tarifária de Donald Trump (30% sobre produtos europeus caso não haja acordo). Diferentemente dos blefes anteriores — tantas vezes adiados que renderam o meme “TACO” (“Trump Always Chickens Out”, ou “Trump sempre se acovarda”) — assessores garantem que, desta vez, o presidente está jogando para valer. Paris assumiu a linha de frente e já convenceu várias capitais a empunhar o “Instrumento Anticoerção”, arma regulatória que daria a Bruxelas carta branca para revidar: taxar big techs dos EUA, limitar investimentos americanos e até barrar empresas dos EUA de contratos europeus. Um recado direto à Casa Branca.

Do lado brasileiro, Lula dispõe de pouquíssima margem — jurídica ou política — para atender às exigências de Washington. A pauta bilateral tromba com questões internas que Brasília enxerga como prerrogativas de outro Poder: o julgamento de Bolsonaro e o pacote de regras para redes sociais, visto nos EUA como censura. Tampouco há muita munição comercial: vários produtos americanos já entram com tarifas baixas, e alguns novos eventuais cortes dependeriam do aval do Mercosul. Some-se a isso o embaraço legal nos EUA: Trump baseia-se na IEEPA, lei de emergências econômicas que lhe permitiria agir sem o Congresso — mas cuja constitucionalidade a Suprema Corte deve examinar em breve. Até lá, o mercado navega num mar agitado por incerteza tarifária, risco jurídico e o velho dilema: onde começa a realidade comercial.

· 04:19 — Grande orçamento

A Comissão Europeia apresentou uma proposta de orçamento de quase € 2 trilhões para o período de 2028 a 2034 — uma cifra recorde, projetada para enfrentar desde a intensificação da competição econômica global até a crescente pressão por investimentos em defesa. A ambição impressiona, mas não ilude: em Bruxelas, cifras grandes não necessariamente significam consensos fáceis. Muitos Estados-membros já lidam com restrições fiscais severas e devem contestar o volume e a distribuição desses recursos. A França é o exemplo mais eloquente da contradição europeia entre discurso expansivo e realidade orçamentária: o país anunciou um pacote de corte de €43,8 bilhões para conter a trajetória explosiva da dívida pública.

O plano francês prevê congelar praticamente todos os gastos públicos em 2026 no mesmo patamar de 2025 — exceções serão feitas, claro, para a defesa. Medidas adicionais incluem a não reposição de ao menos um terço dos servidores públicos que se aposentarem e até a eliminação de dois feriados nacionais. Com um déficit de 5,8% do PIB em 2023 e um ambiente político ainda intoxicado por crises recentes, Paris tenta correr contra o relógio fiscal. O primeiro-ministro François Bayrou chegou a antecipar a apresentação do orçamento numa tentativa de ganhar tempo e convencer o Legislativo a engolir uma dose amarga de cortes e aumento de impostos. Enquanto isso, os custos de financiamento do Tesouro francês disparam frente aos seus pares, e o país passa a carregar o maior déficit da zona do euro. No fim, fica o lembrete: o problema fiscal não é exclusivo do Brasil, mas da realidade do mundo em que vivemos.

· 05:04 — O Acordo com a OTAN

Comentei recentemente neste espaço a reunião entre Donald Trump e o premiê holandês Mark Rutte, representante da OTAN. Na ocasião, Trump voltou a bater na mesma tecla: acusou os países europeus de não cumprirem sua parte no financiamento da aliança e de subinvestirem em defesa. Até aí, nada de novo. Mas a retórica ácida parece ter surtido efeito. Com novos compromissos formalizados pelos membros europeus, Trump passou a adotar um tom mais conciliador. 

A OTAN, que opera com um orçamento anual em torno de US$ 5 bilhões, viu seus membros se comprometerem — no fim de junho — a elevar os gastos em tecnologias estratégicas de defesa para 3,5% ao ano, mais do que o dobro do que vinham aplicando até aqui. É uma inflexão relevante, que reposiciona a segurança europeia e agrada ao presidente, especialmente quando o cheque volta a circular em dólares.

Mais do que discurso…

Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.