Bom dia, pessoal. As finanças globais enfrentam um desafio duplo: a realidade e as expectativas não estão alinhadas. Nos Estados Unidos, a postura mais cautelosa das autoridades monetárias resultou em um aumento dos juros, mas paradoxalmente, o mercado de ações americano, especialmente o setor de tecnologia, continua a apresentar alta.
No Brasil, a situação é complicada pelos persistentes problemas fiscais e pela recente volatilidade das commodities, que contribuem para uma correção no mercado em 2024, ainda que modesta em comparação com o contexto global.
Geopoliticamente, os conflitos em várias regiões do mundo parecem estar se intensificando, o que gera preocupações adicionais. Isso não me cheira muito bem…
Em meio a isso, as discussões em Davos prosseguem. Espera-se que mais membros do Federal Reserve (Fed) se pronunciem nesta sexta-feira, mantendo a linha de cautela que tem sido a tônica das declarações recentes. Já ouvimos de John Williams, Christopher Waller e Raphael Bostic, e hoje será a vez de Michael Barr. Não se espera grandes novidades, além da repetição do discurso conservador do ponto de vista da política monetária.
Christine Lagarde, do BCE, também tem se manifestado frequentemente, enfatizando que um revés no processo de desinflação pode resultar em taxas de juros “mais altas por mais tempo”.
O mercado ainda precisa absorver e refletir essas informações em seus preços. Resta saber quanto tempo isso vai levar.
A ver…
· 00:52 — Não me diga, capitão óbvio…
No Brasil, a agenda econômica de hoje inclui o índice IBC-Br de novembro, um indicador considerado um termômetro do PIB. Espera-se que os dados revelem uma estabilidade, após a queda registrada em outubro.
Considerando que a performance econômica do país na segunda metade de 2023 não foi particularmente impressionante, minhas expectativas para este indicador são moderadas. Qualquer resultado acima do esperado no Brasil será visto de forma positiva, embora o foco permaneça nas questões fiscais.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, encontrou-se novamente com Arthur Lira, presidente da Câmara, ontem.
Uma decisão pendente de Lula é sobre o veto ao segmento da Lei de Diretrizes Orçamentárias que estabelece um calendário para o pagamento de emendas impositivas, uma decisão que pode influenciar a discussão sobre reoneração. O clima em torno dessas questões fiscais continua tenso.
Ontem, o mercado reagiu com preocupação ao relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), que destacou algo que já era de conhecimento geral: o governo provavelmente não cumprirá a meta fiscal estipulada.
De fato, o déficit previsto pelo TCU, cerca de R$ 55 bilhões, parece até otimista quando comparado à estimativa de R$ 134 bilhões (1,2% do PIB) da Instituição Fiscal Independente (IFI).
Surpresas podem ocorrer, dependendo do crescimento econômico em 2024, da balança comercial e da habilidade do governo em aumentar as receitas de maneira contínua.
Por enquanto, essa incerteza fiscal adia qualquer otimismo significativo no mercado de capitais brasileiro, com expectativas de que um avanço mais substancial só ocorra no segundo semestre.
· 01:46 — E a tecnologia volta a dar show
Nos Estados Unidos, a recente recuperação de algumas das maiores empresas de tecnologia globais impulsionou o índice Nasdaq 100 a atingir um novo recorde histórico. O destaque ficou por conta das Megacaps, especialmente após a Apple ter suas ações valorizadas devido a um upgrade pelo Bank of America, que prevê um aumento potencial de mais de 20% no valor das ações.
Além disso, a Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC), uma das principais fabricantes de semicondutores do mundo, anunciou expectativas otimistas para o mercado de semicondutores, prevendo um crescimento geral de cerca de 10% este ano, com a empresa podendo dobrar esse número, indicando um aumento de receita anual entre 20% a 25%. Esse prognóstico é favorável não só para a TSMC, mas também para seus principais clientes.
Paralelamente, outra notícia encorajadora veio do Congresso americano, que aprovou uma lei de gastos temporários para evitar um shutdown parcial do governo dos EUA no fim de semana.
Essa medida provisória financiará algumas agências governamentais até o início de março, concedendo aos legisladores tempo adicional para finalizar as negociações sobre o orçamento anual do ano fiscal que começou em 1º de outubro.
Esses desenvolvimentos positivos no setor tecnológico e a aprovação do projeto de lei no Congresso fizeram com que os investidores minimizassem a importância das declarações mais cautelosas dos membros do Federal Reserve, bem como os dados econômicos americanos que superaram as expectativas.
· 02:38 — Um clima pouco agradável
O cenário geopolítico global está cada vez mais tenso. Recentemente, houve intensificação das tensões entre Israel e Hamas e conflitos no Mar Vermelho, além de desentendimentos entre Irã e Paquistão.
Neste contexto, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, comunicou aos Estados Unidos sua rejeição à ideia de um Estado palestino em qualquer cenário pós-conflito, afirmando que só aceitará um acordo que permita a Israel manter o controle de segurança sobre toda a Faixa de Gaza. Esta postura sugere que a resolução do conflito está distante.
Além disso, a OTAN anunciou a mobilização de 90 mil soldados de países membros da aliança e da Suécia, marcando a maior convocação desde 1988, época da Guerra Fria.
Esses militares participarão de uma série de exercícios conjuntos até maio, preparando-se para um cenário hipotético de “ataque russo”. Se 2024 for realmente dominado por questões geopolíticas, as perspectivas parecem desfavoráveis para uma solução pacífica.
Os riscos envolvidos são significativos e crescentes.
· 03:25 — Crise estrutural
Nesta sexta-feira, as ações chinesas ficaram aquém do desempenho de outras importantes bolsas regionais, à medida que o otimismo em relação ao crescimento da demanda por semicondutores em 2024 favoreceu as empresas de tecnologia do Japão, de Taiwan e da Coreia do Sul. Paralelamente, o índice Hang Seng de Hong Kong recuou 1%, e o CSI 300 da China teve uma leve queda de 0,1%. A situação na China apresenta complexidades que podem ter um impacto estrutural mais profundo do que o previsto inicialmente.
O National Bureau of Statistics da China revelou uma preocupante tendência demográfica: a população do país diminuiu em mais de 2 milhões em 2023, totalizando 1,41 bilhão. Este é o segundo ano consecutivo de declínio populacional, sendo que a redução mais que dobrou em comparação com 2022, quando a China registrou pela primeira vez uma diminuição populacional desde a Grande Fome da era Mao Zedong, em 1961. A taxa de natalidade despencou para um recorde de baixa de 6,39 nascimentos por mil habitantes, a menor desde 1949.
Historicamente, a China tem sido um pilar fundamental tanto em termos de mão-de-obra quanto de demanda de consumo. Contudo, a sua taxa de natalidade vem caindo constantemente, com casais adiando ou optando por não ter filhos. Essa tendência persiste apesar do término da política do filho único em 2015 e da introdução de incentivos governamentais em 2021 para fomentar o crescimento populacional, como deduções fiscais, subsídios habitacionais e licenças maternidade prolongadas.
Além disso, os altos custos de educação têm contribuído para uma das taxas de fertilidade mais baixas do mundo, juntamente com uma crescente urbanização em um país que era predominantemente rural. Essa mudança demográfica levanta questões sobre se a China conseguirá alcançar a prosperidade antes de enfrentar os desafios de uma população envelhecida.
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· 04:19 — Algumas considerações finais sobre o cenário de “Goldilocks”
Na conclusão das reflexões desta semana sobre o cenário de “Goldilocks” – uma situação econômica ideal – é crucial considerar o estado atual das condições financeiras.
Mesmo com o aumento das taxas de juros pelos bancos centrais globais, as condições financeiras permanecem surpreendentemente flexíveis. Isso parece ser resultado da crescente liquidez, isto é, a disponibilidade de dinheiro de investimentos, que tem se mantido robusta apesar do aumento das taxas.
Nos últimos dois anos, enfrentamos momentos de tensão financeira, como a crise dos títulos do governo britânico durante o breve mandato de Liz Truss em 2022, e a crise dos bancos regionais nos EUA. Entretanto, os mercados sempre mostraram uma recuperação rápida após tais perturbações.
Alguns analistas sugerem que o ponto mais crítico de liquidez nos mercados desenvolvidos ocorreu durante a crise dos títulos britânicos, que pode ter servido de alerta para outros bancos centrais. Desde então, parece haver um esforço contínuo para fornecer liquidez suficiente, evitando o risco de um colapso financeiro em grande escala.
Para a economia global, isso indica que as coisas devem correr bem este ano, salvo surpresas geopolíticas inesperadas.
No entanto, olhando para o próximo ano, especialmente após as eleições nos EUA, a situação pode mudar, dado que a abundante liquidez carrega o risco de um ressurgimento da inflação. Por ora, a possibilidade de um cenário de “Goldilocks” ainda parece viável.
· 05:04 — Vale a pena olhar a TSMC?
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