Mercado em 5 minutos

Um pequeno errinho de R$ 20 bilhões

Investidores globais estão otimistas sobre o relatório de inflação nos EUA. No Brasil, Lojas Americanas faz história em rombo contábil de R$ 20 bi

Por Matheus Spiess

12 jan 2023, 08:58 - atualizado em 12 jan 2023, 11:57

Mercado - homem faz contas contábeis
Imagem: Freepik

Bom dia, pessoal. Lá fora, os mercados asiáticos fecharam em alta nesta quinta-feira, seguindo as indicações amplamente positivas dos mercados globais durante o pregão de ontem, já que os investidores estão otimistas sobre o relatório de inflação dos preços ao consumidor dos EUA, que será divulgado ainda hoje. Adicionalmente, a inflação chinesa veio dentro do que se projetava, o que ajuda a balizar as expectativas para o crescimento do gigante asiático em 2023. 

Os mercados europeus e os futuros americanos também desfrutam de uma alta nesta manhã, no aguardo do dado de inflação. Espera-se que o relatório mostre uma desaceleração na taxa anual de crescimento dos preços ao consumidor e possa ter um impacto significativo nas perspectivas para as taxas de juros. No Brasil, acompanhamos o noticiário econômico de Brasília, enquanto digerimos o rombo na Americanas, que deve reverberar por entre o setor do varejo, impactando o Ibovespa. 

A ver… 

· 00:44 — Um ajuste fiscal e o novo arcabouço 

Por aqui, a agenda econômica é o grande destaque, como muita expectativa para o anúncio de Haddad sobre as primeiras medidas de seu Ministério. Entende-se que o pacote de hoje já procura o ajuste fiscal prometido de 2% do PIB (precisamos, afinal, reduzir o déficit esperado de R$ 220 bilhões indicado no Orçamento). O principal fiel da balança será a recomposição de receitas, com medidas como a revogação da redução de PIS/Cofins cobrado sobre receita de grandes empresas e outras envolvendo os combustíveis. Devemos ter quatro medidas provisórias, além decretos e portarias. 

O ajuste é importante, mas secundário diante da expectativa para um novo arcabouço fiscal. Ao que tudo indica, uma das propostas fortes dentro da pasta vem da equipe econômica da transição, que contou com a participação de Pérsio Arida, André Lara Resende, Guilherme Mello e Nelson Barbosa. Apesar de não ter sido divulgada, especula-se que a nova regra que substituirá o teto de gastos será pautada por uma meta de despesas, visando separar obrigações correntes de curto prazo do gasto com investimento de longo prazo. Fará preço nos próximos meses sobre a curva.  

· 01:38 — Equívoco sutil. Quem nunca? 

Um problema para nos preocuparmos será o desempenho do setor de varejo no dia de hoje. A descoberta de “inconsistências contábeis” da ordem de R$ 20 bilhões vai gerar um belo ruído sobre a Americanas e sua própria sustentabilidade financeira — foram identificados financiamentos de compras nas quais é devedora e que não se encontram adequadamente refletidos no balanço (mais dívida). O barulho foi tão grande que o recém-empossado presidente, Sérgio Rial, que o mercado pensava que até resolveria a fome do mundo no comando da companhia, renunciou depois de 11 dias. 

Com ele, também deixou o cargo o diretor de Relações com Investidores, André Covre. Ninguém quer ter a imagem associada ao rombo. E quem não pode fazer o mesmo movimento? Os acionistas de referência: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. O lendário grupo de empresários precisa pensar bem em uma solução para todo o problema; afinal, um rombo contábil de R$ 20 bilhões é paradigmático. Viveremos hoje aqueles tradicionais momentos no mercado financeiro brasileiro que ficam na história, como o que aconteceu com Sadia e Aracruz há mais de 10 anos. 

· 02:32 — Inflação ao consumidor americano 

Teremos hoje a divulgação do índice de preços ao consumidor de dezembro, com o mercado prevendo nenhuma mudança durante o mês. Espera-se que o indicador tenha subido 6,5% na comparação anual, o que seria uma desaceleração dos 7,1% registrados em novembro. Enquanto isso, o dado núcleo, que exclui os preços voláteis de alimentos e energia, deve subir 5,7% na comparação anual. 

A desaceleração não significa que a luta do Federal Reserve contra a inflação acabou, principalmente se o dado núcleo subir 0,3% em dezembro (aproximadamente o dobro do ritmo consistente com a meta de inflação anual de 2% do Fed). Não podemos negar, entretanto, que já passamos do pico do pico da inflação, verificada em junho de 2022 em 9,1% ao ano (6,6% no núcleo). 

De qualquer forma, as autoridades do Fed enfatizaram que precisam ver muitos meses de dados encorajadores antes mesmo de considerar o fim de sua campanha de aumento das taxas de juros. Outra desaceleração da inflação em dezembro marcaria a terceira queda mensal consecutiva, o suficiente para representar uma tendência, mas os juros continuariam subindo, mesmo que com ritmo reduzido. 

· 03:28 — Relatório europeu e inflação chinesa 

Hoje, o mercado lida também com a publicação do boletim econômico do BCE, da Zona do Euro, que pode contar com expectativas importantes para a economia em 2023 dos países da região. Não é segredo que o sentimento na Europa não é dos melhores, com a continuidade da guerra na Ucrânia e a crise energética. Será importante entendermos quanto de juro será necessário para equilibrar tantos pratos. 

Enquanto isso, na China, tivemos a publicação da inflação de preços ao consumidor e ao produtor, dominada por preocupações locais (como a inflação de preços de alimentos) e de pouco interesse global. Os preços ao consumidor subiram 1,8% em dezembro, uma aceleração frente ao 1,6% verificado em novembro, mas em linha com o esperado. Enquanto isso, os produtores viram uma desaceleração para 0,7%. 

· 04:07 — Quando veremos uma mudança na dinâmica dos juros 

Embora a inflação tenha diminuído recentemente, ela ainda está muito acima da meta de 2% desejada pelo banco central americano. Como sabemos que eles vão manter o curso até que o trabalho esteja concluído, devemos esperar mais juros nos próximos meses. No mês passado, o Fed chegou a elevar sua taxa básica de juros ao nível mais alto em 15 anos, e alguns temem que riscos geopolíticos elevados ou eventos incontroláveis possam acontecer novamente, fazendo com que a inflação volte a subir. 

O Fed elevou as taxas sete vezes em 2022, empurrando seu benchmark de uma faixa de 0% a 0,25%, para os atuais 4,25% a 4,50%. No entanto, aumentos menores foram implementados em dezembro e as autoridades sinalizaram que planejam apenas continuar elevando as taxas entre 5% e 5,5% em 2023. Melhores perspectivas já estão se materializando, com muitos vendo o Fed continuando a aumentar as taxas no primeiro trimestre, parando no segundo e possivelmente reduzindo as taxas no quarto. 

A desaceleração da demanda, os descontos de preços devido a estoques elevados e os preços de imóveis em queda, entre outros fatores, ajudarão a moderar a inflação, o que, por sua vez, deve levar os principais bancos centrais a fazer uma pausa e avaliar sua recente série histórica de aumentos de juros. À medida que as cadeias de suprimentos se recuperam e os mercados de trabalho sofrem menos atrito, podemos ver uma queda mais acentuada e ampla da inflação, o que implicaria um caminho um pouco mais fácil para políticas e maior crescimento global. 

Um abraço, 

Matheus Spiess 

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Sobre o autor

Matheus Spiess

Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia. Pós-graduado em finanças pelo Insper. Trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimento do Brasil, além de ter feito parte da equipe de modelagem financeira de uma boutique voltada para fusões e aquisições. Trabalha hoje no time de analistas da Empiricus, sendo responsável, entre outras coisas, por análises macroeconômicas e políticas, além de cobrir estratégias de alocação. É analista com certificação CNPI.

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